A Páscoa assinala-se em Alcochete todos os anos com o Círio dos Marítimos, uma celebração que é um misto de fé e tradições e convida os visitantes a participar num ritual com base numa lenda e numa terra, que, enquanto não recebe o novo aeroporto internacional, tem muito por descobrir
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O Círio dos Marítimos é a forma da pequena vila de Alcochete, com pouco mais de 19 mil habitantes, celebrar a Páscoa.
Uma festa de três a quatro dias, a partir de Sexta-feira Santa, que se traduz numa romaria desde o centro da vila até ao Santuário de Nossa Senhora da Atalaia, padroeira dos marítimos e situado numa zona ribeirinha onde se supõe que foi avistada a tal bola de fogo de que reza a lenda dos marítimos, que noutros tempos, em risco de naufragar, fizeram a promessa de uma romaria todos os anos em agradecimento à mãe de Deus, por lhes ter poupado a vida.
A expressão Círio dos Marítimos não deixa de ser curiosa. Círio era o nome dado à vela dos barcos, que há três séculos eram usados por pescadores e mercadores na faina diária de navegação obrigatória pelo Tejo.
Ana Ferreira, do posto de turismo local, sublinha à TSF que a lenda remonta algures entre os séculos XVIII e XIX, embora existam documentos com relatos anteriores a esse período.
De qualquer forma, é essa lenda que está na base da celebração anual de Páscoa em Alcochete, que além da romaria ao santuário, conta com desfiles nas ruas e leilões de bandeiras e fogaças, para ter orçamento para a realização do evento do ano seguinte.
O bolo tradicional de Alcochete não é mais do que uma broa em forma de bola de fogo, daí o nome de batismo ser Fogaça. Feito a partir de uma receita local, que passa de geração em geração e ainda hoje é produzido pelas mãos de mãe e filha, na padaria Popular, situada no centro histórico da vila, e são vendidos às centenas, por estes dias em leilões no adro do santuário, mas no resto do ano a vários clientes, incluindo a hotelaria local.
Segundo a tradição, a festa começa com a chegada do chininá, nome dado ao gaiteiro e ao percussionista que vão tocando a chamar o povo para as ruas e, antes do culto religioso de domingo, há cortejo presidido pelo festeiro, com as figuras de um juiz à frente das mulheres casadas e solteiras que desfilam em cima de burros, obrigatoriamente viradas para o rio. Só depois se oferecem refeições a habitantes e visitantes que contribuíram para a festa.
Durante os três dias de festa pascoal há mais por descobrir nesta terra que vai receber o futuro aeroporto, desde as salinas do Samouco, onde ainda hoje se produz sal para venda ao público e para indústrias como a cosmética e onde há programas de observação de aves e passeios de bicicleta, além de espaço para a realização de eventos familiares, desde festas de aniversário a casamentos ou batizados.
No centro da vila há uma panóplia de restaurantes, onde não falta uma diversidade de pratos de carne, não fosse ela terra de aficionados e sede do Aposento do Barrete Verde, mas também pitéus únicos à base de vieiras selvagens, conquilhas e amêijoas, além da especialidade da caldeirada de línguas de bacalhau, numa alusão a uma atividade que no passado contava com forte presença de secadores desta espécie de peixe.
Na praça central, a estátua do homem grande em bronze, símbolo de todos os filhos da terra que se dedicaram ao longo da vida a uma profissão dura: a raspa do sal, atividade que data do século XIII na região, que ocupou muitas gerações de famílias e que, durante o Estado Novo, viu reprimida a primeira greve de salineiros em 1957.
Aberta a visitas está ainda a igreja matriz de São João Batista que data do século XV e foi reconhecida monumento nacional vários séculos depois e também aberta a visitas está a igreja da Misericórdia, junto dos Paços, onde nasceu o rei D. Manuel, que foi dessacralizada e transformada em museu de arte sacra, que abriu recentemente e é onde também se realizam eventos municipais e onde se pode comprar lembranças, como peluches do flamingo, símbolo desta vila, que é uma autêntica varanda sobre o Tejo, onde os bandos habitam por todo o estuário do rio e podem ser observados a bordo do Bote Leão, o barco de serviço a viagens turísticas no Tejo.
Quem passa por Alcochete não deve perder a prova do Licor de Fogaça, receita bem guardada e inventada por um filho da terra, à venda no posto de turismo local e para os aficionados ainda há comércio local que vende artigos alusivos à festa brava.
Para quem quiser pernoitar em Alcochete, entre a oferta hoteleira, apresentam-se como as principais unidades o StayUpon Vila, no centro da localidade e o resort Praia do Sal, com apart-hotel, spa e piscina interior aquecida, vizinho próximo das salinas.
