Robôs, satélites e até controladores remotos vão à Feira Nacional de Agricultura este ano com menos 20 expositores
Representante da Confederação dos Agricultores de Portugal acredita que não haverá escassez de cereais na Europa.
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Cerca de 5% dos cerca de 500 expositores da Feira Nacional da Agricultura não vão estar presentes na edição deste ano, devido à falta de equipamentos agrícolas que algumas empresas estão a ter, por causa das dificuldades de importação de materiais, devido à crise internacional, admite Luís Mira, secretário geral da CAP e responsável pelo certame, que se realiza de 4 a 12 de junho no CNEMA - Centro Nacional de Exposições de Santarém.
"Existem cerca de 20 expositores que costumavam vir e que não vieram, porque não têm equipamentos, ou maquinaria para entregar. Portanto, não vem, porque não faz sentido e nós compreendemos isso. Como toda a gente sabe, existem dificuldades na fabricação de alguns dos equipamentos e são esses que não vêm. Este ano temos à volta de 500 expositores. É um bocadinho menos área, mas isso, só quando se fechar (o recinto) é que se verá (o impacto), porque alguns destes expositores eram grandes", frisa.
Apesar do atual contexto, este representante da Confederação dos Agricultores de Portugal acredita que não haverá escassez de cereais na Europa, mas questionado se o país tem condições (ao lado de outros estados-membros) de produzir alguns cereais, mesmo que temporariamente e tal como fez no passado, Luís Mira faz depender de Bruxelas qualquer decisão, para países como Portugal poderem aumentar a quota de produção de cereais de forma a compensar o corte no abastecimento externo da Rússia e da Ucrânia, os dois maiores produtores mundiais, agora envolvidos numa guerra que dura há quase 4 meses.
O secretário-geral da CAP deixa claro que "nós somos um país mediterrânico e somos fortes em fazer culturas mediterrânicas. Por isso, é que a Ucrânia é muito forte a fazer cereais e é muito fraca a fazer vinha, ou olival. Nem tem, porque não tem clima para isso."
Mas perante a incerteza da duração da guerra e da provável demora na recuperação do setor agrícola ucraniano perante o grau de destruição visível diariamente no terreno, para além da incapacidade de escoamento das colheitas recentes, a questão persiste, perante um bem escasso (cereais) e não se perspetivando no cultivo nos próximos anos, Portugal (bem como, outros estados-membros poderão regressar ao cultivo de cereais mesmo que temporariamente para fazer face à escassez?
Luís Mira sorri e diz que esta questão é muito importante - "Nós não vivemos num país fechado, como era Portugal antes de entrarmos para a União Europeia. Nós vivemos no espaço da UE e esse espaço, mesmo fruto de uma Politica Agrícola Comum que vem sempre diminuindo, diminuindo e fazendo para que haja uma diminuição da produção e cada vez com mais regras, tem uma capacidade produtiva muito grande. Não vai haver nunca esse problema no espaço da União Europeia, porque a Europa tem essa capacidade."
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Já sobre o nosso país acrescenta - "Em Portugal podemos aumentar a nossa produção de cereais. Há até uma proposta do governo para se aumentar, mas nunca chegaremos à nossa autossuficiência. Se eu acho que ela tem que ser equacionada? Sim, no espaço europeu e com certeza, no espaço nacional, porque ela trás mais equilíbrio à produção agrícola inclusivamente."
A falta de mão de obra na agricultura portuguesa tem sido um desafio na última década. Nesta altura, apenas 6% do total da população portuguesa trabalha no setor primário e a falta de trabalhadores agrícolas começa a ser compensada com recurso a robôs, mas se podem substituir o trabalho humano e ajudar a desenvolver uma pluralidade de atividade, são questões para esclarecer na multiplicidade de debates e conferências temáticas durante a próxima semana no recinto da FNA, este ano dedicada à Inovação e Tecnologia, como caminho para a agricultura de futuro, capaz de produzir uma alimentação sustentável.
A capacidade agrícola cresceu entre 2,5 e 3 vezes nos últimos 50 anos, segundo dados da FAO e permitiu ainda que a nível global, que o aumento na produção de alimentos acompanhasse o aumento populacional, mas até 2050 é preciso aumentar a produção de alimentos em 70% porque dentro de 3 décadas o planeta terá mais de 9 bilhões de pessoas para alimentar.
Questionado sobre que futuro vai ser debatido durante a feira, Luís Mira responde - "é um futuro baseado na importância da alimentação. Aliás, tivemos essa experiência agora recentemente. Nós achamos que tudo está assegurado e não é bem assim. Nem em termos de reservas estratégicas, nem em termos de disponibilidade de alimentos."
Entre os desafios prioritários da agricultura, além das alterações climáticas, está também o acesso de todos os indivíduos a alimentos de qualidade e apesar de na última década ter reduzido cerca de 100 milhões de pessoas, ao grupo de 800 milhões em estado de subnutrição no mundo, ainda há muito a fazer para que se possa atingir o estado de segurança alimentar e não basta apenas incrementar a produção de alimentos, é preciso que existam um conjunto de fatores que garantam o acesso a essa alimentação de qualidade.
Sobre as prioridades da futura PAC - Politica Agrícola Comum, ainda à espera de luz verde de Bruxelas, Luís Mira considera que "esta foi desenhada em 2018 sem pandemia e sem guerra e não pode estar adaptada às circunstâncias atuai".
Adianta ainda que "teria que haver um reajustamento, que não vai existir, porque o sistema institucional europeu é muito lento. Esta reforma demorou 4 anos a ser discutida, portanto, não vamos começar agora uma discussão, senão demora mais 4 anos e entretanto já aconteceram mais coisas. Temos que viver com aquilo que temos, mas nunca será uma PAC ajustada às circunstâncias que estamos a viver hoje, mas Portugal tem um espaço de manobra, pode e deve utiliza-lo e deve ainda ajustar ao máximo esta política agrícola e as verbas que ela contem para as necessidades que as empresas e o pais tem."
Neste momento, no quadro que está a decorrer, Luís Mira diz que "essa situação não existe, porque o quadro de apoio que encerraria em 2020, ainda não terminou, por causa da Covid-19. Ainda tem uma percentagem muito grande de dinheiro por utilizar. "
Acrescenta que o mesmo se passa no Portugal 20 30, tal como afirma ter observado recentemente - "nos dados que a ministra Mariana Viera da Silva apresentou em sede de Concertação Social, verifiquei que depois de 2020, executou-se, ou prevê-se executar apenas 47%, o que quer dizer que foi depois do prazo acabar que utilizamos o dinheiro. Não é a melhor situação. O país precisava de mais agilidade neste tipo de processos, mas isso, compete ao estado resolver estas questões."
Mira conclui que a CAP está sempre disponível para ajudar na solução e pronta para encontrar medidas facilitadoras duma execução mais eficiente e uma execução que também tem que ser adaptada às circunstâncias - "São as alterações climáticas. É a guerra. É a revolução digital. Há muita coisa que está a mudar e com uma rapidez muito grande. Pensemos o que era a agricultura há 40 anos e hoje...não tem nada a ver."
Estas declarações à TSF foram feitas na apresentação da edição deste ano da FNA- Feira Nacional da Agricultura, desta vez virada para os debates sobre inovação tecnológica e agricultura de futuro e herdeira da quase centenária Feira do Ribatejo, que durante os primeiros dez dias do mês de junho, leva todos os anos produtores e fornecedores do sector agro-industrial ao CNEMA - Centro Nacional de Exposições, em Santarém.