Presidente da Assembleia da República afirma ter decidido "não admitir" o projeto de lei do Chega "por infringir a Constituição".
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O presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, recusou admitir um projeto de lei do Chega para alterar no Estatuto dos Deputados as regras sobre a imunidade parlamentar, por considerar que infringe a Constituição.
De acordo com o despacho divulgado no 'site' do parlamento, Santos Silva afirma ter decidido "não admitir" o projeto de lei do Chega "por infringir a Constituição, não reunindo assim os requisitos de admissibilidade" previstos no Regimento da Assembleia da República.
O regimento estabelece que "não são admitidos projetos e propostas de lei ou propostas de alteração" que "infrinjam a Constituição ou os princípios nela consignados".
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Em 08 de junho, o Grupo Parlamentar do Chega entregou no parlamento um projeto de lei para alterar o Estatuto dos Deputados e mudar as regras sobre a imunidade parlamentar, mas não previa o fim do "sistema de imunidades dos deputados", como anunciou na altura o presidente do partido.
Atualmente, a lei indica que "os deputados não podem ser ouvidos como declarantes nem como arguidos sem autorização da Assembleia, sendo obrigatória a decisão de autorização, no segundo caso, quando houver fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a 03 anos", reproduzindo o que está versado na Constituição da República Portuguesa.
De acordo com o projeto de lei, o Chega queria retirar este ponto e substituí-lo, propondo que passasse a estabelecer que "a Assembleia da República deve autorizar que os deputados sejam ouvidos como declarantes ou como arguidos, sempre que os factos subjacentes ao pedido não digam respeito a votos ou opiniões que emitirem no exercício das suas funções".
O Chega mantinha todas as restantes alíneas do artigo relativo às imunidades, como por exemplo, que "nenhum deputado pode ser detido ou preso sem autorização da Assembleia, salvo por crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a 3 anos e em flagrante delito".
Na altura, o líder do Chega tinha antecipado aos jornalistas que esta iniciativa se repercutiria "num projeto de alteração constitucional".
No despacho em que decide não admitir o projeto de lei, o presidente da Assembleia da República cita a nota de admissibilidade elaborada pelos serviços, que refere que a alteração que o Chega quer introduzir "retira ao parlamento a possibilidade de este órgão de soberania decidir, caso a caso, sobre a intervenção ou não dos deputados em tribunal" e alerta que poderá "colocar-se em causa o fundamento da consagração constitucional das imunidades".
Augusto Santos Silva, no despacho em que cita os constitucionalistas Jorge Miranda, Gomes Canotilho e Vital Moreira, aponta que a iniciativa do Chega visa acabar com o "poder do parlamento para analisar, caso a caso, o pedido de audição como declarante ou como arguido dos deputados".
E salienta que, "ao tornar obrigatória a decisão de autorização" do levantamento da imunidade parlamentar de um deputado, "independentemente de haver fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos -- única situação em que a Lei Fundamental estipula ser obrigatória a decisão de autorização -- é manifesto que a proposto em apreço contraria frontalmente o disposto na Constituição sobre esta matéria".