PSD em conversações com PS desde junho, mas rejeita falar em "negociação". PS alinha pela mesma bitola e até diz que conversações se estendem aos outros partidos. BE, PCP e CDS asseguram à TSF que não houve quaisquer conversas e avançam com propostas no processo legislativo normal.
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Uma conversação não é necessariamente uma negociação e PS e PSD esforçam-se para passar essa imagem. No entanto, o que está em causa é, de facto, uma negociação - o resto é uma questão de português no caminho para a aprovação do futuro código de contratação pública.
Vamos por partes: o Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei para alterar o Código dos Contratos Públicos que foi discutida em plenário e baixou à comissão sem votação na generalidade. E, desde logo, estabeleceu-se um contacto entre os dois maiores partidos com vista a que este diploma conseguisse a aprovação.
Isto soube-se na reunião da bancada social-democrata, esta quinta-feira, com a comunicação aos deputados de que, nos últimos quatro meses, tem havido conversas de bastidores. Do lado do PSD, integram um grupo de trabalho alargado os deputados Luís Marques Guedes, Carlos Peixoto, Jorge Mendes e ainda o vice-presidente do partido Nuno Morais Sarmento.
No entanto, no plenário dos deputados social-democratas não foram abordados os avanços que o partido conseguiu fazer junto do governo, apenas Carlos Peixoto frisou que ainda não existe uma posição oficial do partido e que, para já, o que existe é um "anteprojeto".
À saída da reunião, o líder parlamentar do PSD antecipou-se às perguntas dos jornalistas e abordou diretamente o tema, confessando que o partido "foi desafiado" pelo governo depois de o diploma ter descido à comissão sem votação.
Mas aquilo que Adão Silva faz mesmo questão de frisar é que "não há mesmo negociação". "Há alguns artigos em que dizemos que nesta matéria não transigiremos mesmo", nota.
"Dizem-me que cerca de 95% das objeções foram acolhidas, manifestar as nossas críticas e o nosso sentido construtivo", adianta o líder parlamentar do PSD sem querer detalhar o que é que foi ou não acolhido pelo PS, até porque há ainda espaço para que qualquer deputado do PSD possa fazer contribuições.
No entanto, apesar de reiterar que não se trata de negociação, Adão Silva afirma que há "linhas vermelhas" que não são possíveis de ultrapassar. Não diz quais são, mas a conclusão é lógica: se forem ultrapassadas, o PSD não votará favoravelmente o diploma.
De resto, o partido assume-se mesmo como "um travão" à proposta de lei entregue pelo governo, ainda que tenha sido o PSD a ser desafiado pelo executivo para se sentar à mesa para conversar.
O que diz o PS?
A tónica é a mesma: nem PS nem PSD querem passar a ideia de negociações de bloco central. João Paulo Correia prefere falar em "conversações", alinhando na bitola dos social-democratas.
"O PSD foi um dos partidos que apresentou propostas e PS já manifestou concordância relativamente a essas propostas. Não houve uma negociação, há sim uma conversação, conversas que o PS vai mantendo com todos os partidos, não só com o PSD, mas também com todos os partidos e essa é a nossa disponibilidade nessa matéria", nota o parlamentar socialista.
Adianta ainda o vice-presidente da bancada do PS que o objetivo é chegar a um compromisso que "cumpra os objetivos da máxima transparência e da minimização da burocracia".
Certo é que sem PSD, o diploma do governo não tem aprovação garantida, pelo contrário, e tanto à esquerda (PCP e Bloco de Esquerda) como à direita (CDS), é assegurado que o PS não convocou ninguém para a mesa das negociações (ou "das conversações").
CDS "alarmado" coloca-se em campo
Com o debate já em público, o CDS decidiu a meio da tarde colocar-se em campo desde logo com a garantia que a proposta do governo, tal como está, merece a "veemente" reprovação dos deputados centristas.
Por isso, João Gonçalves Pereira sublinha que o partido tem 11 propostas de alteração e escuda-se nos pareceres de várias entidades, entre elas o Tribunal de Contas, para concluir que a proposta do governo tem como consequências a "distorção da concorrência", a "limitação de mercado" e a promoção do "conluio e da corrupção".
Da bancada centrista, destaca-se a proposta de baixar o teto máximo de 5,3 milhões de euros para um milhão nos contratos com consulta prévia e ainda a "manutenção das restrições à contratação, evitando adjudicações sucessivas aos mesmos operadores económicos". Na conferência de imprensa, João Gonçalves Pereira garantiu que do PS não houve qualquer tentativa de contacto para conversar sobre o assunto, já fora da esfera parlamentar também não foram feitos quaisquer contactos como garantiu fonte oficial do partido à TSF.
Mais acima na hierarquia dos democratas-cristãos, também o líder Francisco Rodrigues dos Santos já veio a terreiro criticar aquele que considera ser um "arranjinho" do bloco central. "Parece que querem sentar à mesa do orçamento os amigos de sempre e as empresas que estão constantemente no radar de influências e de contorço por parte do Estado", diz Rodrigues dos Santos.
O telefone da esquerda também não tocou
Contradizendo as declarações do vice da bancada socialista, PCP e Bloco também negam à TSF terem tido conversações com o PS sobre a revisão do código de contratação pública.
O deputado comunista Bruno Dias garante à TSF que o partido "ainda está a trabalhar em propostas de alteração" para apresentar através dos métodos legislativos normais, recusando quaisquer conversas em antecipação com o PS ou com o governo sobre eventuais alterações à proposta entregue na Assembleia da República.
No mesmo sentido, o Bloco de Esquerda também diz à TSF que não foram encetadas quaisquer negociações com os socialistas sobre este assunto e que as suas propostas serão entregues pela via tradicional, sem negociações prévias ou garantias de aprovação ou reprovação.
Sobram, portanto, as declarações públicas de PS e PSD sobre a aceitação das propostas da bancada mais à direita para revisão do código de contratação pública e que, se forem de facto incorporadas, deverão garantir a aprovação do diploma com os votos favoráveis das duas bancadas.
Língua portuguesa e semântica à parte, ainda que neguem tratar-se de negociações, as "conversas" entre PS e PSD devem mesmo selar a aprovação da parte do Bloco Central a este diploma.