Avaria de uma embarcação, fragilidade do sistema de salvamento e horários de trabalho que impedem socorro eficaz são denúncias feitas por profissionais do sector após o naufrágio de ontem à noite. Autoridade Marítima rejeita as acusações mas promete analisar procedimentos.
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Em declarações à TSF, Serafim Gomes, da direção do Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Administrações e Juntas Portuárias, sublinha que o Instituto de Socorros a Náufragos (ISN) não tinha meios disponíveis aquando do alerta, cerca das 19:15 de terça-feira, porque a estação salva-vidas da Figueira da Foz "fecha às 18:00", dado que os seus funcionários "têm o regime normal da função pública como qualquer funcionário de secretaria".
Serafim Gomes diz que "a embarcação salva-vidas está avariada há duas ou três semanas, devido a um problema na bomba injetora". Um outro problema, segundo o sindicalista que se arrasta há anos é que "este pessoal, estupidamente, tem atribuído um regime de horário da função pública e o horário laboral é das 9:00 às 18:00. Um problema que não é resolvido por falta de vontade".
O sindicalista responsabiliza o Estado e lamenta que os capitães dos portos recorram muitas vezes a pessoal sem preparação, como a polícia marítima.
"O diretor do ISN propôs um estatuto que resolvesse este problema, o que foi aprovado pelo Ministério da Defesa, mas as Finanças chumbaram este estatuto. A quem deve ser imputada a responsabilidade deste e doutros casos é ao Estado. Depois o capitão do porto manda avançar pessoal como a polícia marítima, que não tem preparação. Depois acontece como no ano passado que um polícia morreu durante uma operação de socorro".
O Sindicato pretende sensibilizar novamente o Ministério da Administração Interna para o problema do horário de funcionamento do Instituto de Socorros a Náufragos, que funciona das 9:00 às 18:00.
"Fragilidades do sistema"
Também a Associação Sócio-Profissional da Polícia Marítima (ASPPM) denuncia "fragilidades do atual sistema de salvamento marítimo", que está "sustentado no altruísmo dos profissionais da Polícia Marítima".
Em comunicado, a ASPPM considera que "este infeliz episódio deverá servir de alerta" porque os profissionais da Polícia Marítima "não dispõem de competências para a busca e salvamento no mar, nem estão habilitados, treinados ou em prontidão para responder" a este tipo de ocorrências.
A ASPPM diz que os polícias que acorrem aos pedidos de socorro "fazem-no perante o desespero dos náufragos, com base na sua experiência e sensatez" e esclarece que os polícias "não podem abandonar as suas funções policiais cada vez que há um naufrágio, para suprir as falhas do sistema".
Recordando que o agente que prestou o primeiro socorro estava de folga e "conseguiu salvar duas vidas", a ASPPM sublinha que "as incontáveis vidas salvas" por profissionais daquela força "não devem servir para ocultar a inoperância do atual sistema".
"É tempo de encarar a inoperância do sistema na busca e salvamento no mar com a frontalidade que a situação merece, e responsabilizar as entidades competentes no salvamento marítimo".
Autoridade Marítica rejeita críticas
O porta voz da Autoridade Marítima diz que as acusações do Sindicato dos Trabalhadores portuários "não fazem qualquer sentido" e garante que foram usados todos os meios para socorrer este naufrágio.
Em declarações à TSF, o comandante Nuno Leitão diz que as duas vidas salvas são prova disso e sublinha que o desfecho poderia ter sido melhor se os pescadores usassem os coletes.
"São declarações que não fazem qualquer sentido. Em primeiro lugar os meios que foram acionados, que foi a mota de água de salvamento marítimo, era o único meio adequado para este tipo de missão, tendo em conta a quantidade de redes no mar, as condições de risco devido à ondulação e à proximidade da costa. Pela empregabilidade destes meios, conseguimos salvar duas vidas. Infelizmente não se conseguiram salvar outras vidas, porque os pescadores não estavam com o colete salva vidas", afirma.
O porta voz da Autoridade Marítima garante que há sempre uma equipa de prevenção, após o horário de encerramento do Instituto de Socorros a Naufragos. Quanto ao salva-vidas avariado, no porto da Figueira da Foz, o comandante Nuno Leitão diz que esta "é uma não questão" porque há dois barcos ao serviço.
"Há sempre um piquete de salvamento, esse meio de salvamento foi o que foi acionado, foi uma mota de salvamento marítimo. O ISN tem um horário de trabalho normal da administração pública, em que fora desse horário há um piquete."
Relativamente ao salva-vidas avariado "é um falso problema, porque existem dois salva-vidas. O salva-vidas que hoje foi usado nas buscas era o adequado para a missão de hoje, o que está avariado aguarda peças de substituição e não compromete a capacidade operacional da estação porque há dois salva-vidas".
O porta-voz da Autoridade Marítima diz que agora vão analisar os procedimentos desta ocorrência na Figueira da Foz, garantindo que não se trata de qualquer inquérito interno, antes um "processo normal".
Um naufrágio na Figueira da Foz, na terça-feira, provocou um morto, havendo ainda quatro pescadores desaparecidos. Duas pessoas foram resgatadas com vida.