Sócrates diz que não ficou "pedra sobre pedra" da "mentirola" de ser próximo de Salgado
O ex-líder do Governo socialista garante que não sabia de quaisquer pagamentos ao seu então ministro Manuel Pinho e acusa o Ministério Público de fazer "revisionismo histórico" e de, em 12 anos, não ter conseguido nada contra o seu Executivo que mostre que houve favorecimento à EDP.
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O antigo primeiro-ministro socialista José Sócrates garantiu esta terça-feira que "não ficou pedra sobre pedra" do que considera ser uma "mentirola" e "revisionismo histórico" do Ministério Público (MP) quanto a uma alegada proximidade com o ex-presidente do Grupo Espírito Santo (GES) Ricardo Salgado, acusando o jornalismo português de ter permitido o "êxito" dessa narrativa.
"É, aliás, uma mentira que tem 12 anos e o MP acha que pode fazer este revisionismo histórico idiota. Toda a gente sabe que o Dr. Ricardo Salgado tinha amigos na direita, não na esquerda", disse Sócrates à saída do tribunal, em Lisboa, onde prestou depoimento como testemunha no julgamento do Caso EDP.
José Sócrates confirmou também que falou ao tribunal de Cavaco Silva, cuja campanha eleitoral diz ter sido financiada por Salgado, de Durão Barroso, que diz ter sido contratado também por Salgado, e de Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro que lhe sucedeu no cargo em 2011 e era "dirigente de uma empresa cujo um dos acionistas era o Grupo Espírito Santo".
"Esta ideia de que o dr. Ricardo Salgado era amigo dos socialistas não tem a mínima sustentação. É falso, é uma mentira e uma mentira - um revisionismo histórico - que o MP pretendeu desenvolver ao longo destes últimos 12 anos contra mim, querendo vender aos portugueses a ideia de que o Dr. Ricardo Salgado era próximo de mim. É falso, absolutamente falso", assinalou o antigo líder do Governo.
"Nunca tive o telefone do Dr. Ricardo Salgado, nunca fui ao gabinete do Dr. Ricardo Salgado, nunca conheci o Dr. Ricardo Salgado antes de ir para primeiro-ministro, a não ser ter estado com ele numa reunião no Ministério do Ambiente três anos antes de eu ser primeiro-ministro", sublinhou Sócrates, que diz ter tido "pela primeira vez oportunidade de dizer ao tribunal todas estas verdades que os senhores jornalistas se encarregaram de esconder".
Nas críticas ao trabalho dos jornalistas, José Sócrates alegou que "grande parte do que o MP diz é ajudado pelo jornalismo, porque o jornalismo em vez de ter uma leitura crítica do que diz o MP, reproduz" e que, neste caso, não são ouvidas as várias partes, mas apenas o MP.
Já questionado sobre se sabia que Manuel Pinho tinha recebido pagamentos enquanto era o seu ministro da Economia, Sócrates considerou que essa foi uma pergunta "insultuosa" e provocatória,.
"Claro que não sabia. Essa pergunta foi feita lá dentro e eu respondi que com certeza que não sabia, mas fico satisfeito por saber que esses pagamentos correspondem a pagamentos decorrentes de um contrato que foi decidido e assinado antes de o Dr. Manuel Pinho ter ido para o Governo", ressalvou o antigo primeiro-ministro, que se diz convicto de que Pinho "não recebeu" qualquer quantia que não lhe fosse devida.
Quanto ao alegado favorecimento do GES por parte do Governo, Sócrates testemunhou também que "não, isso nunca aconteceu", e insistiu que tal é uma "mentira do MP propalada há 12 anos".
"Agora estão aqui num tribunal, 12 anos depois, com tudo menos EDP. Este processo transformou-se num processo sem EDP, sendo um processo EDP. Mas nenhum de vocês diz isto", notou, referindo-se de novo aos jornalistas e criticando o trabalho do MP.
"É absolutamente escandaloso", considerou, "que o MP considere, ao fim de 12 anos, que continua a investigar. Ao fim de 12 anos o MP não tem esse direito, porque com esse tempo o MP transforma a presunção de inocência numa presunção pública de culpabilidade".
"O MP tem um prazo para acabar o inquérito, não pode demorar 12 anos. Ao fim de 12 anos, não arranjaram nada contra o Governo e não arranjaram porque é falso, o Governo nunca beneficiou a EDP, isso é mentira. Isso é fácil de perceber, basta ler a investigação aprofundada da Comissão Europeia, coisa que os jornalistas também não leem, só leem aqui que o MP vos diz para ler, acho que é pouco. Deviam ter uma leitura mais crítica", apontou.
O julgamento do Caso EDP está a decorrer no Campus da Justiça, em Lisboa, e Manuel Pinho é acusado de corrupção passiva para ato ilícito, corrupção passiva, branqueamento e fraude fiscal.
A sua mulher, Alexandra Pinho, está a ser julgada por branqueamento e fraude fiscal - em coautoria material com o marido -, enquanto o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, responde por corrupção ativa para ato ilícito, corrupção ativa e branqueamento de capitais.