Legalização de imigrantes ilegais no país está parada. Novas regras arrancaram em setembro, mas associação garante que ainda ninguém foi chamado para se legalizar. Muitos descontam há anos. SEF apenas diz que "análise é por ordem cronológica".
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Descontam há meses ou anos para a Segurança Social e fisco, mas não conseguem resposta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) a algo a que por lei já têm direito: a legalização em Portugal.
A associação Solidariedade Imigrante acusa o SEF de ainda não ter chamado um único dos milhares de imigrantes irregulares que desde setembro começaram a usar o novo sistema de agendamento para manifestarem o interesse de se legalizarem no país porque trabalham e têm os descontos em dia.
Contactado pela TSF, o SEF não desmente e apenas diz que está a verificar as manifestações de interesse dando prioridade às entregues antes da nova lei que arrancou em setembro: "a análise é feita por ordem cronológica".
Enquanto a resposta do SEF não chega aos imigrantes irregulares, a Solidariedade Imigrante garante que há milhares de imigrantes sujeitos a todos os tipos de abusos dos patrões porque não têm papéis e dá o exemplo daquilo que se passa no Alentejo nos trabalhos sazonais da agricultura, nomeadamente neste Inverno.
O dirigente da associação em Beja, Alberto Matos, estima que nos últimos meses trabalharam só neste distrito perto de 10 mil imigrantes, sobretudo na apanha da azeitona, com cerca de metade a estarem em situação ilegal.
Uma realidade vista no terreno pela TSF numa visita a um verdadeiro "bairro" de meia centena de contentores, no meio de um olival, a poucos quilómetros de Beja.
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Alberto Matos diz que as condições em que vivem estes trabalhadores andam perto da escravatura, algo potenciado pela falta de resposta do SEF e, em consequência, do Estado português.
No 'bairro' de contentores as queixas contra o SEF são muitas, mas também contra os patrões.
Nenhum dá a cara com medo de perder o emprego que apesar de mau é o único que conseguem em Portugal, sobretudo por falta da legalização, mas queixam-se de abusos dos patrões, falta de condições de trabalho e falta de condições de alojamento quando estão dois ou três meses no Alentejo.
Cada contentor que serve de casa a estes imigrantes acolhe três a quatro pessoas e os esgotos acabam no riacho ao lado.
Todos os contentores têm ar condicionado mas o normal, dizem, é não funcionar, pelo que se veem no chão aqueles pequenos aquecedores que se compram no supermercado.
Além das condições de trabalho, todos os entrevistados garantem que quando foram para ali nunca esperavam pagar, cada um, 75 euros por mês para dormir nos contentores. Na prática, cada contentor pode render 300 euros aos donos.
Outro problema: o ordenado escrito no contrato é o salário mínimo nacional, que todos sabem de cor, mas só recebem, à hora, quando há trabalho. Quando não há trabalho para fazer é-lhes descontado no ordenado.
Sem forma de protestar, os imigrantes de várias nacionalidades sujeitam-se a todos os abusos e todas as faltas de condições, entre elas os químicos usados nas oliveiras.
Vários dizem que só têm uma t-shirt para tapar a cara e todos os contentores têm lá dentro vários pacotes de leite que muitos usam porque pensam que ajuda a evitar as consequências dos pesticidas.
A água potável vem de uma torneira perto do esgoto, pelo que quase todos optam por garrafões comprados nos supermercados.
"Sou humano, mas sinto-me um animal", desabafa um dos indianos ouvidos no meio de um olival a poucos quilómetros de Beja.