"Tem de ser ponderado, mas eficaz." Antigos protagonistas da Justiça defendem alteração do código de execução de penas
À TSF, o Ministério da Justiça adianta que a questão "está em análise"
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Fernando Negrão, ex-ministro da Justiça, lembra que as leis são feitas para uma determinada altura e podem sempre ser alteradas. O antigo governante considera que é preciso fazer um diagnóstico da situação atual nas prisões e admite que já ouviu falar na questão levantada pelo Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional.
“Julgo que o sistema prisional está preocupado com o que está a acontecer e, portanto, tenho a certeza que terão sido usados os canais para chegar ao Ministério da Justiça e à respetiva titular”, afirma. “É preciso, com alguma rapidez, fazer um diagnóstico do que está a acontecer e tomar as medidas para o evitar, se for de facto verdadeiro.”
O presidente do sindicato representativo dos guardas prisionais defendeu, em declarações à TSF, a revisão do código de execução de penas, a propósito de uma nova droga sintética que está a entrar nos estabelecimentos prisionais, a K4. ”O código de execução de penas não permite abrir alguns tipos de cartas, por exemplo, que venha do senhor Presidente da República, da Casa Civil, da Procuradoria, da provedora, de advogados, e eles conseguem falsificar já os envelopes e nós não podemos abrir aquelas cartas. Ou seja, nós estamos a entregar aos reclusos droga, sem podermos fazer nada, porque eles conseguem embeber uma folha naquele líquido e conseguem pôr a droga a circular entre eles, porque basta só um bocadinho de papel e eles ficam completamente alucinados e nós não podemos fazer nada", disse Frederico Morais.
Embora não se queira pronunciar sobre estas queixas em concreto, o ex-diretor-geral de reinserção e serviços prisionais considera que o código de execução de penas pode ser alterado e ser mais rigoroso em algumas matérias. Acentuando a necessidade de salvaguardar os direitos dos reclusos, Rui Abrunhosa Gonçalves afirma: "Temos de fazer uma coisa ponderada, mas temos de ser eficazes e dar indicação de que o cumprimento da pena de prisão é algo que sucede, porque as pessoas cometeram um crime e, se cometerem outros crimes durante a pena de prisão, isso deve ser claramente sancionado”, sugere.
Diretor dos serviços prisionais até à fuga dos detidos de Vale de Judeus, Rui Gonçalves dá o exemplo do que está a acontecer com os telemóveis nas prisões. “Serem apanhados telemóveis nas mãos dos reclusos e isso constituir apenas matéria disciplinar, devia ser pensado em termos de penalização”, considera. O antigo diretor das prisões defende poderia ser, por exemplo, somado seis meses de prisão à pena efetiva, para quem fosse apanhado na posse de um telemóvel. “Mas isso teria de ter uma alteração legislativa”, adverte. “O código de execução de penas pode ter alteração sempre que se justifique uma alteração das condições de vida na prisão”, defende.
Já o bastonário eleito da Ordem dos Advogados fica preocupado com a possível abertura de correspondência entre os detidos e os seus advogados representantes.
"Preocupa-me um pouco a possibilidade que existe de abrir correspondência trocada entre advogados e os seus clientes que estejam presos. Acho que deveríamos encontrar métodos alternativos de controlar a existência de drogas sintéticas, nomeadamente, meios tecnológicos que permitam verificar se existe - ou não - essa droga nos envelopes. O Estado tem de trabalhar para conseguir detetar essas situações sem necessidade de violar o sigilo profissional dos advogados", explica à TSF João Massano, sublinhando que o sistema de Justiça devia investir e apostar em sistemas mais eficazes, não descartando, no entanto, algumas alterações ao código de execução de penas.
"Além das alterações que se revelarem necessárias, mais importante era pensar nos meios tecnológicos que nos permitem impedir a existência dessas situações. Se há falta de investimento na Justiça, seguramente que essa falta de investimento tem levado a que tenha havido uma deterioração das condições das prisões", alerta.