"Tem missão difícil": quem é o economista que vai liderar a Direção Executiva do SNS
Joana Bordalo e Sá nota que esta "não deixa de ser uma nomeação política para um cargo técnico-científico de elevadíssima responsabilidade". Ouvidas no Fórum TSF, várias personalidades do setor da saúde apontam que Álvaro Santos Almeida tem "de se rodear de uma equipa que lhe garanta" apoio "técnico e clínico"
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As opiniões sobre o perfil do novo diretor-executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS) dividem-se: entre aqueles que defendem os seus "créditos firmados e vasta experiência", há também quem aponte que esta é uma personalidade "desconhecida do ponto de vista operacional", cujo foco está "na gestão e nos números", fazendo temer uma "redução dos cuidados de saúde prestados". Certo é que Álvaro Santos Almeida tem "uma missão difícil à sua frente".
A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, confirmou esta terça-feira a nomeação do antigo deputado do PSD Álvaro Santos Almeida como novo diretor-executivo do SNS, substituindo assim António Gandra d’Almeida.
Ana Paula Martins afirma que o programa do Governo "é muito claro relativamente àquilo que é a visão do que deve ser a Direção Executiva do SNS" e, por isso, aponta que este momento é "fundamental" para que a esperada "transformação ocorra". Apesar de estar consciente da importância da existência de uma Direção Executiva do SNS, sublinha que "as suas funções e sobretudo a sua organização tem de ser revista".
Surge por isso o nome de Álvaro Almeida, a quem o Executivo reconhece um "perfil diferente" devido à sua capacidade de gestão, articulada com a "sensibilidade e conhecimento de terreno e academia". O social-democrata, defende, reúne as caraterísticas necessárias para levar a cabo a "transformação" pretendida pelo Ministério da Saúde.
Quem não partilha da mesma visão é o bastonário da Ordem dos Médicos. Ouvido no Fórum TSF, Carlos Cortes afirma que o nome de Álvaro Santos Almeida é "desconhecido do ponto de vista operacional e do terreno do SNS" e, apesar de confessar dificuldades em pronunciar-se especificamente sobre o seu perfil, assegura que o social-democrata "não é um profissional de saúde ou alguém que se tenha destacado nos últimos tempos na área do SNS".
"Não conheço o currículo da saúde do escolhido agora para a Direção Executiva e já por si é um sinal. Em termos do SNS, não é de todo uma pessoa conhecida. É um teórico da saúde, que também é importante", assume.
Em declarações à TSF, a presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fnam) lamenta a forma como são eleitos os rostos da Direção Executiva do SNS: "Questionamos, mais uma vez, esta forma de nomeação, que não deixa de ser uma nomeação política para um cargo técnico-científico de elevadíssima responsabilidade."
Joana Bordalo e Sá defende que a nomeação de um novo diretor-executivo deveria ser levada a concurso e sujeita a regras, "com base em processos democráticos transparentes, onde todo o escrutínio deveria ser feito".
"De qualquer forma, independentemente do nome que é agora lançado e que foi nomeado, a pessoa vai ter imensa dificuldade em conseguir fazer uma Direção Executiva eficaz, no sentido em que faltam as bases, que são os recursos humanos no SNS", nota.
Para este cargo, diz, é esperado um perfil com "competência técnico-científica e, acima de tudo, um currículo exímio, sem conflitos de interesse e incompatibilidades, para conseguir garantir uma função adequada ao cargo que vai executar". A Fnam confessa, por isso, "alguma apreensão" perante o facto de Álvaro Almeida ser um economista e não um profissional de saúde.
O presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar demonstra a mesma preocupação: por ser economista e, à partida, ter um foco mais acentuado "na gestão e nos números", Rui Lázaro admite temer que a nomeação de Álvaro Santos Almeida "possa vir a significar uma redução de cuidados prestados aos portugueses".
"Estamos um pouco surpreendidos. O doutor Álvaro Almeida não fez o ramo clínico da saúde. Se, aquando da exoneração do doutor Fernando Araújo o elogiávamos por ser bom tecnicamente e um conhecedor dos trâmites e necessidades clínicas do SNS, pois, neste caso, sendo um economista, terá naturalmente de se rodear de uma equipa que lhe garanta este suporte técnico e clínico que lhe permita tomar as melhores decisões. O tempo nos dirá se será ou não uma boa escolha e se tomará ou não boas opções", atira.
Já o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), ouvido no Fórum TSF, "congratula-se da escolha", salientando os "créditos firmados" e a "vasta experiência" de Álvaro Santos Almeida no setor da saúde.
"Parece-nos uma escolha acima de qualquer suspeita de uma pessoa com créditos firmados, com uma vida pública conhecida e com um doutoramento em gestão. Tem as caraterísticas que o SIM apelou para que tivesse o novo diretor-executivo", assegura.
O secretário-geral do SIM, Nuno Rodrigues, enaltece por isso a capacidade de "gestão e organização" do recém-nomeado, afirmando ter a crença de que estas caraterísticas vão permitir "concretizar a reforma do SNS".
"Esperamos que, com a sua liderança, se consiga uma melhor articulação entre os serviços e se consiga dar uma melhor resposta aos portugueses, não só resolvendo o problema de 1,5 milhões de portugueses que estão sem médico de família, como também na resposta em rede e reorganização das urgências hospitalares e dos centros de referência", adianta.
Xavier Barreto, presidente da Associação de Administradores Hospitalares, prefere destacar o currículo de Álvaro Almeida: "Foi presidente da Entidade Reguladora da Saúde e da ARS [Administração Regional da Saúde do] Norte, portanto, está desde há muitos anos, através da academia, ligado ao ensino nestas áreas."
Defende que o novo diretor é "alguém que conhece bem o setor" e, por isso, "tem as competências necessárias para fazer um bom trabalho", que reconhece estar "dependente de uma série de incertezas", como é exemplo a equipa que ainda vai escolher.
"Há uma série de temas para os quais nós precisaremos de saber qual é o plano do professor. Mas eu diria que o professor Álvaro Almeida tem as competências e o perfil para poder fazer um bom trabalho", insiste.
O antigo diretor-geral da Saúde Francisco George junta-se ao leque de personalidades que saúdam a escolha de Álvaro Almeida, mas aponta também que a par das condições "para fazer um trabalho necessário", é preciso que esteja "em contacto com as equipas clínicas e os enfermeiros, que prestam serviços que são essenciais para fazer funcionar uma unidade", já que "não é medico, mas economista".
"O professor Álvaro Almeida tem uma missão difícil a sua frente", avisa.
Constantino Sakellarides, ouvido também no Fórum TSF, fala numa "currículo compatível com o cargo" que o economista vai exercer. Contudo, entende que o "fundamental" e mesmo saber "se a pessoa escolhida com um cargo tão difícil e importante têm o mínimo de condições curriculares para poder fazê-lo bem: e esse é claramente o caso do professor Álvaro Santos Almeida".
"Agora, é evidente que não bastam as competências técnicas e a liderança do diretor-executivo. É preciso haver condições para que ele possa exercer essas capacidades e essa liderança", reforça o também antigo diretor-geral da Saúde.
Doutorado em economia pela London School of Economics and Science, Álvaro Santos Almeida foi presidente da Entidade Reguladora da Saúde de 2005 a 2010. Nas eleições de 2017, foi também candidato à Câmara Municipal do Porto.
