"Temos de ir à luta." Trabalhadoras da Coindu penduram farda à porta da fábrica no último dia de trabalho

Artur Machado
O grupo Coindu vai encerrar a produção na fábrica de Arcos de Valdevez, na próxima quinta-feira, dia 19, e pagar as indemnizações aos trabalhadores no dia 31 de dezembro
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As quase 350 pessoas abrangidas pelo despedimento coletivo, na sua maioria mulheres, vão assinalar o último dia de trabalho com um momento simbólico, pendurando as fardas de trabalho à porta. A poucos dias do Natal, mostram-se resilientes e com alguma esperança no futuro.
“Somos a banda do Titanic. A água a subir e nós com os violinos”, brinca Catarina Almeida, de 43 anos, uma das trabalhadoras que, a partir de quinta-feira, ficará desempregada e deixará a sua bata pendurada no gradeamento da fábrica, quando sair pela porta pela última vez.
“Na quinta-feira, o último dia, vamos pendurar as batas no final do turno. Vamos escrever a data de entrada e de saída, o nosso número de colaborador e vamos pendurar a bata aqui”, contou à TSF Catarina, à porta da Coindu, onde trabalha há quase 23 anos, rodeada de colegas, dispostas a resistir ao embate do encerramento. O tempo é de incerteza, esperança e já de reviver memórias.
“Às vezes, quando falamos, conto que entrei no dia em que caíram as Torres Gémeas. No primeiro dia de trabalho, cheguei a casa e a primeira notícia que tive foi que caíram as Torres Gémeas. Ficou-me isso sempre marcado. Foi há 23 anos”, recorda Fernanda Abreu, de 48 anos.
O Titanic afundou, as Torres Gémeas caíram, mas às portas do Natal, as trabalhadoras da Coindu permanecem de pé.
“Sinto o que sentem todos os colegas, temos de ir todos à luta. Vou tentar passar o Natal da melhor maneira. Não vai ser isto que nos vai abalar. Também não nos podemos deixar ir abaixo”, comentou Mónica Barbosa, de 45 anos, 14 de Coindu.
Já Ana Cunha, de 35 e com 17 anos de casa, confessa que se sente aliviada. “Por um lado, vai custar muito, mas por outro até sinto um certo alivio, porque nós vivíamos aqui um clima de muita pressão”, disse, referindo que espera viver um natal “como nos outros anos, com alegria, porque a família e as crianças não têm culpa do que se está a passar”. E acrescentou: “Depois para o ano é que vai cair a ficha e vou ver que estou desempregada.”
O mesmo referiu Ana Patrícia, de 42 anos, 20 dedicados à Coindu.
“A ficha só vai cair em janeiro quando começarmos a ver as crianças a ir para escola, os maridos a irem trabalhar e nós ficarmos em casa. Aí é que vai ser. Vamos tentar dar a volta à situação, mas não vai ser fácil, porque estão muitas empresas a fechar, vai haver muito desemprego e nunca vai haver grande oferta de trabalho, mas vamos pensar positivo…”, comentou.
De entre os trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo do grupo Coindu, há já quem tenha trabalho à espera. É o caso de Anabela Barreiro, de 55 anos. “Fecha-se uma porta, abre-se uma janela. Ao sair daqui já tenho trabalho, aqui em Arcos de Valdevez”, contou.
A porta da Coindu no parque empresarial de Lavradas encerra esta quinta-feira, dia 19. Os trabalhadores deverão receber as indemnizações, com um extra de 17%, negociado pelo Sindicato das In distrais Metalúrgicas e Afins (SIMA) com o grupo, no dia 31 de dezembro.
Recorde-se que o grupo Coindu, com sede em Joane, Famalicão, justificou publicamente o encerramento da fábrica de Arcos de Valdevez, com “a deterioração gradual das suas condições financeiras, fruto das condições do mercado”.
“Infelizmente não foi possível garantir novas oportunidades de negócio para manter esta fábrica ativa”, indicou num comunicado, explicando que a decisão “surge na sequência de uma avaliação aprofundada das condições de mercado e das oportunidades de negócio, o que tornou insustentável a continuação da atividade desta unidade.”
O grupo justificou ainda que “nos últimos anos, o sector automóvel vem a sofrer uma crescente e profunda transformação, marcada pelo declínio significativo da procura pós-pandemia e pelo aumento da pressão competitiva dos mercados com custos de mão de obra mais baixos, nossos concorrentes directos”. E que a situação “conduziu a uma redução gradual dos projetos atribuídos” à unidade nos Arcos de Valdevez, que “apesar dos intensos e prolongados esforços”, não sobreviveu.
Aludiu ainda, no mesmo comunicado, à recente “entrada do Gruppo Mastrotto” no capital da empresa, que esta “visa estrategicamente estabilizar a situação, aumentar a competitividade da Coindu e abrir novas oportunidades internacionais”. Mantendo “as suas operações, com foco nos segmentos premium do mercado automóvel,” na fábrica de Joane.
