Decisão do juiz Carlos Alexandre foi a de pronunciar todos os arguidos "nos exatos termos da acusação".
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Os 89 arguidos do processo Hells Angels, acusados de crimes graves, incluindo associação criminosa, vão todos a julgamento, depois de confirmada na íntegra a acusação do Ministério Público, disse esta quinta-feira à agência Lusa um dos advogados ligados ao processo.
Segundo o mesmo advogado, o juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), decidiu pronunciar todos os arguidos "nos exatos termos da acusação", sendo que agravou a medida de coação imposta a muitos dos arguidos, colocando mais de 50 deles em obrigação de permanência na habitação (OPH), vulgarmente designada por prisão domiciliária.
O despacho de pronúncia de Carlos Alexandre tem mais de mil páginas e numa das passagens do despacho, a que a Lusa teve acesso, o juiz do TCIC conclui que, face aos indícios analisados, "este conjunto de elementos assim agrupados não é um simples clube recreativo 'motard', mas um conjunto de pessoas que se organizam (...) em moldes paramilitares ou semelhantes ao modo de atuação de uma milícia".
"Qualquer pessoa pode ser 'motard' ou não (...) mas para se fazer parte desta associação tem de se obedecer aos estatutos, o que implica obedecer às decisões do 'chapter' ou `charter´, o que for, e mesmo que isso inclua, pasme-se, agressões/castigos (..) dos quais ninguém está a salvo", lê-se no despacho de pronúncia do juiz Carlos Alexandre.
O juiz considera ainda que todos os elementos que integram o grupo 'motard' estão "em absoluta consonância, hierarquizados e imbuídos de uma obediência aos estatutos (do clube motard) e às obrigações que dele decorrem", independentemente de "qualquer lado onde se encontrem".
Esta última consideração do juiz prende-se com o facto de um dos arguidos alegar que estava no Luxemburgo aquando da prática dos factos criminais (agressões) ocorridas na zona do Prior Velho, em Lisboa.
Nas alegações do debate instrutório, ocorrido em 20 de julho, o Ministério Público (MP) pediu a ida a julgamento de todos os arguidos, sustentando que todos praticaram os crimes que constam na acusação, que teve como meios de prova escutas telefónicas, documentos apreendidos ao grupo motard e o depoimento de testemunhas e arguidos.
O MP deu como provado, entre outros factos, o ataque perpetrado pelos arguidos e membros do grupo Hells Angels no restaurante "Mesa do Prior", no Prior Velho, bem como a perseguição movida por estes a Mário Machado, líder do movimento de extrema-direita Nova Ordem Social e que pertencia a um grupo motard rival.
O procurador deu ainda como provados os outros crimes constantes da acusação, incluindo extorsão e posse de arma proibida, designadamente soqueiras, mocas e bastões extensíveis.
A acusação do MP considera aqueles membros do grupo motard Hells Angels elaboraram um plano para aniquilar um grupo rival, em março de 2018, com recurso à força física e a várias armas para lhes causar graves ferimentos, "se necessário até a morte".
Após as alegações do MP, o advogado José Castro, mandatário de Mário Machado (assistente no processo), subscreveu na globalidade a tese do procurador e a ida dos arguidos a julgamento, nomeadamente por associação criminosa e outros crimes graves contra a integridade física.
Na altura, à saída do TCIC, alguns advogados de defesa contestaram a acusação do MP, sobretudo a imputação do crime de associação criminosa, e apontaram diversas nulidades do processo, que poderão vir a dar azo a recursos.
Os arguidos estão acusados de crimes como associação criminosa, tentativa de homicídio qualificado agravado pelo uso de arma, ofensa à integridade física, extorsão, roubo, tráfico de droga e posse de armas e munições, entre outros ilícitos.