Tolentino será próximo Papa? Colegas de seminário recordam jovem “maduro” e “humilde”, mas “Espírito Santo não será tão favorável"
Da avó materna, que era uma contadora de histórias analfabeta e cultivou num dos possíveis Papas a paixão pelos livros, até ao jovem de “15 ou 16 anos que já fazia a barba”: a TSF viajou até à adolescência de Tolentino de Mendonça para saber se quem cresceu com o (agora) cardeal o imagina como chefe da Igreja Católica
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No dia em que arranca o conclave, a TSF falou com dois antigos colegas de seminário de Tolentino de Mendonça, o português mais próximo de ser Papa nesta eleição. O agora jornalista Ricardo Oliveira fala em alguém “muito humilde” com “dom de tocar consciências” e, por isso, “tem tantas hipóteses quanto todos os outros” para suceder a Francisco. Já o padre António Paulo Sousa lembra o jovem que “administrava a papelaria nos intervalos”, mas só com 59 anos será difícil que o cardeal madeirense faça sair fumo branco da chaminé da Capela Sistina.
Dos 9 anos à Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, Ricardo Oliveira, diretor do Diário de Notícias da Madeira, acompanhou Tolentino de Mendonça ao longo de várias etapas da vida. Em declarações à TSF, descreve um homem “muito humilde”, “dedicado” e que anda de mãos dadas com a “excelência”.
“Desde bem cedo, revelou ter a apetência pelos estudos, pela contemplação, pela fé, pelos livros, pela escrita”, complementa o jornalista. É nesta “amizade pelos livros” que se encontra a “influência” da avó materna, porque “lhe contava, a ele e aos irmãos, muitas histórias”.
Essas histórias foram a sua primeira biblioteca e, a partir de então, nunca mais deixou os livros. Essa forma de receber a cultura, através de uma voz especial — a avó era contadora, mas era analfabeta —, deu-lhe margem para olhar a sabedoria de uma forma constante. Vem do berço esse amor pelos livros. É um momento fundador.
Com estas memórias presentes e tendo em conta o “dom de tocar consciências e falar à alma” do cardeal madeirense, Ricardo Oliveira acredita que Tolentino de Mendonça “entra em pé de igualdade para o conclave”. “O mais difícil está conseguido: é um cardeal com poder de eleição e, portanto, tem tantas hipóteses quanto todos os outros”, sendo que a escolha “depende muito das tendências que a igreja quer percorrer”.
Para o diretor daquele órgão de comunicação, o seu conterrâneo “tem tudo aquilo que é essencial para que o Papa continue a estar próximo daqueles que mais precisam, daqueles que vivem nas margens” por ser “alguém empenhado a combater a injustiça”. Além disso, enfatiza igualmente, este ministro do Vaticano, que possui “um discurso muito sensível às pessoas, às suas dores e às suas alegrias”, sabe que “a igreja e o mundo, a sociedade e a política precisam de novos modelos e de sustentabilidade”.
Com ele mantenho uma relação de amizade, que passa por desejar nesta altura um abraço fraterno — aliás, ele trata-me como irmão —, e encorajá-lo para aquilo que for a decisão com certeza sábia dos cardeais.
Por sua vez, quando António Paulo Sousa, agora padre de algumas das paróquias do Porto Moniz, chegou ao seminário diocesano do Funchal nos anos de 1970, “já lá andava” Tolentino de Mendonça. Em entrevista à TSF, assinala que jogavam futebol juntos, numa altura em que a vida do cardeal poeta era igual à de tantos outros: “Normal.”
“Nos intervalos, ele é que administrava a papelaria”, conta ainda, acrescentando que, naquela tenra idade, a “maturidade” do possível sucessor de Francisco já sobressaía: “Aos 15 ou 16 anos já fazia a barba”, brinca.
Elogios feitos, a fé de António Paulo Sousa não o leva a crer que Tolentino de Mendonça poderá ser o próximo chefe da Igreja Católica. “Falta-lhe a experiência de estar à frente de uma diocese”, sublinha, sem deixar de salvaguardar que no conclave “joga-se muita coisa, existe pressão dos países, não é fácil”.
O “ser ainda muito jovem”, considera, também não é uma vantagem. “O Espírito Santo não vai ser assim tão favorável” aos seus 59 anos. A razão? “Hoje em dia, um bispo, ao fim de dez anos, está desgastado. Imagine um Papa…”, justifica.
Nascido na ilha da Madeira, Tolentino de Mendonça mudou-se ainda bebé para Angola até aos 9 anos. Entrou no seminário aos 11 anos e, a partir daí, começou o seu percurso na religião. Em 2019, foi elevado a cardeal pelo Papa Francisco. É atualmente prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação.
Em fevereiro, substituiu Francisco numa missa no Vaticano, por ocasião do Jubileu dos Artistas e do Mundo da Cultura, quando o sumo pontífice foi internado por problemas respiratórios no hospital Gemelli, em Roma.
