Dois dos três projetos vencedores do último orçamento participativo nacional são sobre touradas. Na semana em que o Campo Pequeno reabre para nova temporada, o "Olhe que não" coloca frente a frente as propostas "Portugal sem Touradas" e "Tauromaquia para Todos".
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"Quando desmistificamos [as touradas] - e é o que tem acontecido nas últimas décadas -, o pensamento crítico insurge-se, nos campos académico e mediático, transversalmente à sociedade." É nisto que acredita Nuno Alvim, representante do movimento "Portugal sem Touradas". Mas, para Hélder Milheiro, defensor de "Tauromaquia para Todos", os últimos dados de crescimento da procura de praças de touros [aumentou 1% no último ano] são animadores, e revelam que o público apenas se alheou "em anos de crise". "Depreende-se que se trata de uma questão económica e não ideológica", remata o representante da defesa das práticas tauromáquicas.
Nuno Alvim, no entanto, traz outros dados à tona: "A atividade tauromáquica tem enfrentado um declínio bastante acentuado em termos de número de espetadores, desde 2010 até 2017", que se prende com uma "perda de 53% da audiência, de acordo com dados da Inspeção Geral de Atividades Culturais e do Instituto Nacional de Estatística".
De um e do outro lado da luta, são invocados "mitos" que contribuem para o prolongamento de crenças indesejáveis. "O projeto ["Portugal sem Touradas"] vem na linha de uma página de Facebook - que nós já conhecemos há muitos anos -, que contempla vários conteúdos de distorção, de mentira e manipulação. Eu já fui vítima de difamação nessa página. Lamentamos imenso que seja essa a abordagem", atira Hélder Milheiro.
Para o rosto do "Portugal sem Touradas", no entanto, o enfoque deveria ser outro. "Parece-me inconcebível que seja garantido o bem-estar animal nas Lezírias, quando sabemos que estes touros são alvo de um condicionamento extensivo. Eles não passam dias inteiros nos campos a desfrutar da liberdade", salienta Nuno Alvim. "Selecionam os touros com maior índice de agressividade e de maior bravura. Isto envolve atividades violentas, com ensaio e simulação do uso de bandarilhas e de outros instrumentos", continua.
No entanto, Hélder Milheiro faz referência à capacidade da tourada de "gerar, no público e nos intervenientes, a criação e recriação de valores éticos fundamentais, como é o caso da coragem, da superação, da forma de afrontar as dificuldades, os medos e os perigos, com inteireza e elevação, respeitando o exponente de excelência humana e o expoente de excelência animal". Também os valores económicos são postos em cima da mesa: "As touradas geram emprego e riqueza. O Estado é um dos grandes beneficiados pela atividade tauromáquica."
Da defesa dos direitos animais à preservação da cultura própria do país, da necessidade de legislar sem contradições à liberdade em democracia, o "Olhe que não" aborda todas as questões.