Um ano depois de chegarem ao Fundão, metade dos refugiados já deixaram Portugal
Nove dos 19 refugiados que há um ano chegaram ao Fundão, no primeiro grupo de migrantes que foi colocado no concelho do distrito de Castelo Branco, abandonaram o país.
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Poucos meses depois de se terem instalado, os refugiados deixaram o antigo seminário da cidade onde estavam alojados, num centro para as migrações criado pela Câmara Municipal local.
"Os nove que foram embora todos tinham familiares na Europa. Podemos ser dos quatro cantos do mundo, mas a necessidade de estar com a família é imperiosa em toda a gente", afirma Paula Pio, a coordenadora do espaço, que rejeita falar numa fuga.
"Isto não é fugir, é procurar. O caminho continua", defende, acrescentando que quem partiu viajou para França, Itália e Alemanha.
Abandonaram o Fundão, mas nem por isso perderam os laços com quem viveram vários meses. Alguns despediram-se dos técnicos que os acompanharam e continuam a conversar através das redes sociais.
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Dois dos refugiados que partiram acabaram por regressar ao Fundão e um mostrou-se arrependido por ter deixado Portugal. "Ele chegou cá, mandou-me mensagem a dizer que já tinha chegado e quando eu o revi ele disse-me: "Paula, o Fundão é tão bom, eu consigo viver em paz aqui". Sei que andou por França, Itália, sentiu-se muito perseguido, passou por algumas dificuldades e regressou", conta Paula Pio.
Este refugiado prepara-se agora para começar a trabalhar, seguindo as pisadas de Deborah, uma jovem de 22 anos, proveniente da Nigéria, país de onde teve que fugir devido ao grupo extremista Boko Haram. Esta migrante está empregada na CIMD, uma fábrica de componentes de relojoaria. Confessa à TSF estar satisfeita com o emprego que tem e com os colegas. Tem sempre um sorriso nos lábios, mas não esquece o terror que viveu e a viagem que a trouxe até Portugal.
"Eu tive muitos problemas, em especial no deserto. Foi uma má experiência porque perdi a maioria dos meus amigos, eles morreram. Na Líbia, com a guerra, foi igual, mataram muitos colegas; e no mar Mediterrâneo andámos três dias sem comida e água", conta.
Deborah já deixou o antigo seminário do Fundão. Vive num apartamento que divide com uma amiga que conheceu na travessia. De Portugal só tem coisas boas a falar, mas há um senão: a comida (que não é igual à da sua terra, não tão condimentada). Apesar de tudo, esta nigeriana já se sente em casa. O mesmo sentem outros colegas que com ela chegaram há um ano ao Fundão.
Faisel, de 26 anos, e que é proveniente do Sudão, não quer deixar Portugal. "Quero ficar aqui. Estou muito feliz. A vida é boa", afirma, metade em inglês, metade em português. Este sudanês é reservado e tem ainda algumas dificuldades com a língua.
O mesmo sente Meskel, um refugiado natural da Eritreia, que só pensa em trazer a família para Portugal e, sobretudo, a mulher. Conta que estejam todos reunidos dentro de cinco anos.
Faisel e Deborah estão a trabalhar na CIMD. O diretor-geral da empresa, Carlos Morgadinho, garante que a experiência de acolher refugiados está a ser positiva e até mostra abertura em contratar mais migrantes para combater a falta de mão-de-obra.
Já Meskel está empregado na J3LP, que deu trabalho a outros três refugiados, que entretanto deixaram o posto de trabalho. A "fuga" surpreendeu a diretora de Recursos Humanos e Financeiros, Carla Henriques, que ainda assim salienta que a empresa continua de portas abertas para acolher mais migrantes. O próximo pega ao serviço já na próxima semana.