Uma turfeira de nove metros. Reserva Natural do Paul da Gouxa é apresentada esta 6.ª feira
Fica no concelho de Alpiarça, em Santarém e será gerido pela Câmara Municipal de Alpiarça e pela Quinta da Atela.
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A Reserva Natural do Paul da Gouxa, em Alpiarça, distrito de Santarém, vai ser apresentada esta sexta-feira, dia em que será assinado o protocolo relativo à sua gestão, comunicou a Quinta da Atela.
É uma área de 140 hectares no concelho de Alpiarça ocupada por uma turfeira. Em declarações à TSF, a bióloga Ana Mendes, investigadora da Universidade de Évora, explica o que faz daquele um território tão especial e que importa preservar a bem do ambiente.
"Normalmente as turfeiras encontram-se a latitudes mais a Norte ou também em zonas tropicais. É uma zona que fica alagada e cujo material vegetal é impedido de se degradar pela presença de água, afunda e fica acumulado em profundidade. O Paul da Gouxa tem aqui uma particularidade: há zonas onde atinge profundidades de cerca de nove metros e, portanto, há uma acumulação de cerca de há nove mil anos. Não se sabia que estava aqui acumulado este material vegetal e que este processo era de facto tão antigo", explica a bióloga.
As turfeiras do Norte da Europa têm entre três a quatro metros e a do Paul da Gouxa tem nove metros, o que é "uma acumulação extraordinária".
"É também uma responsabilidade, porque nós temos que ter em atenção que, se há evaporação de água e se este material vegetal deixa de ter esta cobertura de água, o carbono que está ali acumulado desde há nove mil anos começa a ser libertado para atmosfera. Em contexto de alterações climáticas, aquilo que nós não queremos é precisamente que isto aconteça", frisa.
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A consciência sobre a dimensão e relevância do Paul da Gouxa começou a ganhar forma nos anos 80 do século XX, quando um investigador holandês se dedicou ao seu estudo, numa pesquisa que durou uma década. Depois, esse trabalho foi continuado pela Universidade de Évora, Câmara de Alpiarça e o Instituto Português de Agronomia.
Ana Mendes sublinha que a maior parte dos terrenos foi adquirida por um privado que não pôs entraves à sua preservação.
"Cerca de 90% da reserva é uma propriedade privada e quando adquiriram a reserva mostraram-se sempre muito interessados em preservar a turfeira e isso foi possível porque, de facto, congregaram-se aqui duas vontades entre um privado e o setor público, que é algo que se deve enaltecer e que nos reporta à conduta que nós gostaríamos que a sociedade tivesse, que cada um também pudesse dar o seu contributo para preservar o ambiente e para combatermos estas alterações climáticas, que, nestes verões, sobretudo, tornam-se cada vez mais evidentes", acrescenta.
A reserva natural situa-se em terrenos da Câmara Municipal de Alpiarça e da Quinta da Atela, pelo que será gerida em conjunto pelas duas entidades, disse à agência Lusa João Peixinho, membro da Quinta da Atela.
Na cerimónia vão estar presentes o ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, a presidente da Câmara Municipal de Alpiarça, Sónia Sanfona, a administradora da Quinta da Atela, Anabela Tereso, e a investigadora da Universidade de Évora (UÉ) Ana Mendes.
A criação desta reserva natural foi aprovada pela Assembleia Municipal de Alpiarça em fevereiro e, posteriormente, em março, a Comissão Europeia deu parecer positivo ao projeto.
"O Paul da Gouxa é um espaço de extrema importância para o meio-ambiente, que aloja diversas espécies animais, sendo, também, um importante refúgio migratório e de nidificação", declarou João Peixinho.
Destas espécies, João Peixinho destacou os abetouros, as corujas das torres, os môchos-galegos, os milhafres pretos, as águias de asa redonda, as águias calçada, os bufos-reais, os abelharucos, as raposas, as lontras, os papalvos, as doninhas, os ginetes e os saca-rabos.
"É um tesouro natural único que abriga uma turfeira baixa, um habitat extremamente raro a nível europeu e que contém a maior mancha continental de salgueiro-negral", referiu.
Esta turfeira destaca-se pela sua acumulação de carbono, que remonta a cerca de 9000 anos.
"As primeiras estimativas apontam para a presença de aproximadamente 1 milhão de toneladas de carbono armazenado, o que faz desta turfeira uma importante aliada na luta contra as alterações climáticas, daí ser de extrema importância a passagem deste espaço a reserva natural tendo em vista a sua conservação", disse.
Este projeto percorreu um longo percurso e, segundo a mesma fonte, "não há uma estimativa de todo o investimento que foi realizado ao longo dos últimos 30 anos".