"Vivemos um aperto financeiro." Transporte ferroviário de mercadorias cai 10% até abril e associação culpa incentivos à rodovia
À TSF, o diretor-executivo da APEF revelou as causas para a diminuição do uso de comboios no transporte de mercadorias, nomeadamente a falta de apoio aos combutíveis
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O transporte ferroviário de mercadorias caiu mais de 10% até abril, face ao mesmo período de 2023, informou esta terça-feira a Associação Portuguesa de Empresas Ferroviárias (APEF), culpando os incentivos ao transporte rodoviário, estimando que existam mais 1600 camiões por mês nas estradas.
"As políticas implementadas nos últimos anos levaram a uma quebra no transporte ferroviário de mercadorias superior a 10%" nos primeiros quatro meses deste ano, face ao mesmo período do ano passado, informou a APEF, em comunicado.
À TSF, Miguel Rebelo de Sousa, diretor-executivo da associação, revelou as causas para a diminuição do uso de comboios no transporte de mercadorias: "O aumento da taxa de uso da infraestrutura de 23% desde o início do ano faz com que nós percamos objetivamente competitividade face à rodovia. A rodovia teve redução de portagens e, ao mesmo tempo, o facto de nós não termos tido qualquer apoio para fazer face à subida dos combustíveis durante os últimos dois anos, também ao contrário do que aconteceu na rodovia. Isto fez com que, ao longo deste período de tempo, tivéssemos verificado e vivido uma situação de cada vez mais aperto financeiro e mais dificuldade em sermos competitivos com a rodovia."
No sentido oposto, a associação estima que todos os meses existam mais 1600 camiões nas estradas portuguesas, a transportar mercadorias que usavam a ferrovia, resultando em mais 20 mil camiões por ano nas estradas nacionais.
Segundo a mesma nota da associação, esta inversão de tendência é "uma consequência das políticas do setor e da má planificação e execução dos investimentos" e alertou para que as metas de descarbonização assumidas com a Comissão Europeia "estão comprometidas".
"A avaliação dos impactos das políticas públicas para o transporte de mercadorias conclui que os últimos anos foram 'marcados por incentivos públicos ao transporte de mercadorias por rodovia e com maior pegada carbónica e por medidas lesivas da competitividade do transporte ferroviário'", realçou a APEF.
Sobre o preço dos dois tipos de transporte, Miguel Rebelo de Sousa reconheceu, em declarações à TSF,que o setor ferroviário é menos competitivo do que o rodoviário, destacando que "qualquer cliente é muito orientado ao preço". Contudo, recusa que seja mais barato, "porque já desde 2022 que os operadores ferroviários não receberam qualquer apoio financeiro do Estado para fazer face à subida dos combustíveis e do preço de energia".
Em concreto, a associação apontou como causas da redução do uso de transporte ferroviário de mercadorias a descida de taxas de portagem nas estradas, suportadas pelo Orçamento do Estado, enquanto as portagens para uso do caminho-de-ferro (Taxa de Uso cobrada pelo Estado/Infraestruturas de Portugal) foram aumentadas em mais de 20% no último ano, e a redução da carga fiscal aplicada aos combustíveis fósseis sem que seja atribuído apoio ou redução para os custos da energia elétrica e dos combustíveis usados na ferrovia.
A associação destacou ainda o impacto negativo do encerramento do Terminal de Contentores da Bobadela, aumentando os custos globais de operação para os exportadores, e da derrapagem nos prazos de execução das obras ferroviárias, em alguns casos com atrasos de mais de quatro anos, e em que a principal linha de exportação (Linha da Beira Alta) está encerrada para obras desde abril de 2022, quando deveria ter reaberto em novembro de 2022.
"Sem uma alteração profunda da política de incentivos, privilegiando o transporte por ferrovia, conforme assumido nos diferentes acordos e pactos assinados por Portugal referentes à descarbonização da economia, estaremos perante um cenário em que quando as obras forem inauguradas, depois de centenas de milhões de euros investidos, teremos menos transporte ferroviário do que com a antiga infraestrutura", realçaram os operadores ferroviários de transporte de mercadorias no documento.
A APEF tem como associados a Medway (antiga CP Carga), a Takargo e a Captrain España.
