A presidente da Agência Nacional de Inovação (ANI), Joana Mendonça, confessa à TSF e ao Dinheiro Vivo que gostava de ter a primeira Zona Livre Tecnológica nos próximos 4 meses. A ANI conta vir a ter um financiamento europeu de 2 mil milhões de euros para as empresas portugueses até 2027, no quadro do Horizonte Europa.
As Zonas Livres Tecnológicas (ZLT) são áreas geográficas onde podem ser experimentados novos equipamentos, como drones e carros sem condutor. Joana Mendonça na entrevista a Vida do Dinheiro, adianta que não pode especificar os concelhos interessados, mas há várias candidaturas para ZLTs.
"Já há manifestações de interesse, estamos neste momento precisamente em fase de avaliação dessas manifestações de interesse para podermos desenhar propostas concretas, de acordo com o que está previsto", revela.
As ZLT vão servir para a aceleração da adoção de novas tecnologias em Portugal. "E depois tem um outro lado, um outro aspeto, que é muito crítico, que é o da regulação, permitir a adaptação de instrumentos regulatórios adequados a estas tecnologias. Por exemplo, quando olhamos para a condução autónoma, a regulação ainda não existe, e estas tecnologias, estes espaços de experimentação permitem-nos também, e porque nós o estamos a fazer juntamente com os reguladores, permitem-nos ir fazendo uma reflexão daquilo que é crítico ir fazendo em termos de regulação, e aquilo que temos de desenvolver em termos de regulação para quando estas tecnologias chegarem ao mercado", sublinha Joana Mendonça.
A presidente da ANI espera também uma melhoria para 2 mil milhões de euros do financiamento europeu nas empresas portugueses até 2027, no quadro do Horizonte Europa, um programa sem quotas nacionais o que torna o financiamento mais difícil, "porque é muito mais competitivo. Porque se ele concorre com um projeto ou uma call europeia estou a competir com a Europa inteira", destaca.
Ao nível da descriminação positiva da fiscalidade para a inovação, Portugal tem há 25 anos o Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação & Desenvolvimento (SIFIDE), Joana Mendonça revela que este aniversário vai ser aproveitado para refletir sobre a modernização deste mecanismo.
"O SIFIDE é um instrumento maduro, tem sido sucessivamente alvo de estudos e inspeções mostrando precisamente isso. A nível internacional está muito bem equiparado, e portanto não tenho dúvidas que o SIFIDE e um bom instrumento de apoio à I&D nas empresas, sobretudo nas grandes empresas", defende Joana Mendonça.
Joana Mendonça é a primeira mulher como presidente da Agência Nacional de Inovação. Ela é Professora Associada de Gestão e Inovação do Instituo Superior Técnico.
Ela é co-coordenadora do programa de Mestrado em Engenharia e gestão de Inovação e Empreendedorismo e do programa de Doutoramento em Engenharia e Políticas Publicas.
Desenvolve investigação no Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento, onde dirigiu o Laboratório de Gestão Tecnológica e Políticas Públicas. Uma investigação centrada nos processos de comercialização e adoção de novas tecnologias e o papel das competências e do capital humano nesses processos.
No meio de uma crise de natureza sanitária há espaço para a inovação que não seja em saúde?
Acho que há ainda mais espaço para a inovação, não só no âmbito da Saúde. Isso aliás foi visível no que aconteceu em Portugal, mas noutros países também.
Como é que esse mais espaço de inovação se protagoniza?
No concreto, para além da Saúde como referiu há muitas soluções de inovação no con texto da nossa adaptação ao teletrabalho, por exemplo, nos modos como organizámos o nosso trabalho, a utilização do nosso espaço público, também sofreu alterações no contexto da pandemia, tudo isto foram inovações que surgiram e que levantam caminhos para o futuro, nomeadamente a chamada para a transição verde, quando, de facto, nos apercebemos que no meio da pandemia, as cidades sem carros os níveis de poluição baixaram significativamente e leva-nos a uma reflexão e também à criação de espaços de oportunidade para a inovação nessas áreas.
E como é que Portugal tem evoluído nos rankings internacionais de inovação? Como é que tem sido essa evolução?
O ranking mais conhecido é o European Inovation Scoreboard, onde Portugal teve uma grande descida na última edição. Na verdade, essa descida deveu-se sobretudo a fatores metodológicos, mas quando olhamos para os números naturalmente não estamos a pensar na metodologia, mas essa é a realidade. O trabalho que fizemos, de análise, mostra que isso foi resultado sobretudo de fatores metodológicos e não de uma diminuição de atividade de inovação em Portugal, mas naturalmente que isso depois se reflete na nossa análise dos rankings. Agora, naquilo que são os nossos rankings de atividade de Investigação & Desenvolvimento temos vindo a subir a nossa participação e a nossa despesa pública em Investigação & Desenvolvimento que não é sinónimo de inovação, mas é um fator crítico para depois se transformar esse conhecimento em valor económico no mercado através de processos de inovação.
Precisamente, a despesa tem-se refletido em novos desenvolvimentos, em nova inovação em Portugal
Não conseguimos fazer essa ligação assim direta. Até porque esse processo de transformação de conhecimento em valor económico não é um processo linear. Não conseguimos dizer "agora pomos aqui dinheiro na investigação e depois a seguir temos uma inovação". Seria bastante mais fácil se assim fosse, mas na verdade o que a teoria da inovação nos mostra é que este processo, precisamente, não é linear. Até chegar ao mercado, muitas vezes, enfim, dá outras voltas, entra por outros caminhos, e, portanto, não conseguimos medir esse impacto direto doa despesa de I&D. Conseguimos depois aferir qual é que é a nossa performance de inovação. E essa transformação e valor económico ainda temos muito espaço para crescer, portanto, ainda há muito trabalho para fazer para de facto valorizar esse conhecimento. Mas também temos de ver que esse processo também não é um processo muito rápido, estes processos de transformação demoram algum tempo e, portanto, nós não podemos espera que ao investir em I&D hoje, a amanhã temos um produto no mercado resultante deste I&D. Isto não acontece assim.
E neste caso a pandemia foi m processo determinante para que o ranking tivesse descido, ou a pandemia não teve implicação nessa descida dos rankings?
Não teve, aquilo que fez descer muito durante a pandemia são os resultados do inquérito comunitário à inovação, e que foi feito antes, portanto não reflexo da pandemia.
E as empresas estão mais conscientes da importância da inovação para ganharem competitividade? Tem havido uma evolução na própria forma como as empresas encaram a Investigação & Desenvolvimento e a inovação nos seus processos produtos e serviços?
Tem sido um crescendo. As empresas estão cada vez mais conscientes da importância da inovação e da importância de desenvolverem processos de Investigação & Desenvolvimento e isso, sim, pode ser visto pelos números. Quando olhamos tanto para as estatísticas de Investigação & Desenvolvimento publicadas pela DGEG, como quando olhamos para a participação nos nossos próprios instrumentos, o que vemos é que há cada vez mais novas empresas. Ou seja, há cada vez mais empresas a inovar e a fazer I&D que não faziam o passado. Nós, por exemplo, observamos que neste programa quadro, no chamado PT2020, temos cerca de 65% de PME que não tinham participado em medidas de inovação no programa quadro anterior. É um número muito significativo. Portanto, há cada vez mais empresas a participar no sistema. E isso é reflexo que há cada vez mais empresas a perceberem que de facto que a inovação é o caminho para competitividade.
Muito se fala da Indústria 4.0. Na prática, o que é que está a mudar nas fábricas portuguesas. A indústria 4.0 está apenas no papel, ou está efetivamente no terreno?
Há muitos processos de transformação para o digital nas nossas indústrias portuguesas, em diferentes níveis. Há níveis em que isso penetra cada vez mais na gestão da produção, e há outros mais específicos em determinados processos produtivos, mas tidas as empresas que eu já visitei e que tenho visitado nos últimos anos refletem essa adaptação ao digital. Portanto, não tenho dúvidas de que isso entrou também na ordem dos dias das empresas. Essa capacidade é que é diferente dependendo das tipologias das empresas e dos próprios setores.
E o 5G é importante para esse desenvolvimento?
Vais ser, sem dúvida, sim.
E veio tarde, ou acha que o atraso que houve no leilão não terá um grande impacto?
Não me parece que tenha um grande impacto nos processos de transformação industriais, ou na Indústria 4.0. Poderá ter outros impactos, mas neste não me parece que se tenha sentido esse efeito.
E o que está a mudar efetivamente? Há uma crescente adoção das novas tecnologias, inteligência artificial, internet das coisas, robótica? Na prática, o que está a mudar indústria nacional?
Na verdade, tudo isso que disse. Por outro lado, o desenvolvimento de processos baseados em Inteligência Artificial, mais uma vez o espetro é muito variável, temos empresas que estão na vanguarda desse processo, outras que estão a começar, a robotização sem dúvida, já entrou em praticamente todas as nossas indústrias e empresas, mais uma vez com maior ou menor penetração e dependendo um bocadinho também dos processos. Portanto, neste momento, como disse, a indústria 4.0 está presente em todas as empresas. A questão é o que é que é feito e o que ainda poder vir a ser feito. Os processos de adoção de tecnologia são difíceis porque, por um lado, requerem investimento e têm um grande nível de incerteza, por outro lado muitas vezes tecnologias que as próprias empresas não conhecem, e por isso tenho dito, e escrito, aliás muita da minha publicação científica também mostra que, por causa disso, dessa dificuldade, os processos colaborativos são a solução para acelerar ou para garantir a efetiva adoção e novas tecnologias. Mas, na verdade, tem-se visto isto, comecei a estudar a indústria 4.0, a impressão 3D há uns anos, na altura em que eu comecei a penetração da tecnologia em Portugal era, muito, muito pequena, e hoje em dia veem-se imensas indústrias e imensas empresas, estudos e aplicações com impressão 3D. Portanto, penso que todos os setores neste momento, a grande maioria das empresas em Portugal está já a fazer alguma adoção de tecnologias da chamada indústria 4.0.
Não há setores que se destacam?
Há setores onde é mais fácil pensar que isso está a ser feito. Quando pensamos no setor têxtil, que ainda temos uma imagem muito tradicional, no entanto, o processo que eles estão a fazer de adoção de tecnologia nessas áreas é muito grande. E vao continuar a crescer e cada vez vai haver mais soluções adaptadas a esses setores. Naturalmente que não são os primeiros de que nos lembramos. Os nossos setores tradicionais, por exemplo, os moldes, o exemplo que eu dei da impressão 3D, uma das aplicações era precisamente nos moldes. E quando comecei a estudar os moldes não estavam muito sensibilizados para a importância da tecnologia e hoje em dia todos a conhecem e todos a utilizam de uma maneira ou de outra. os setores a destacar são os característicos da nossa estrutura industrial, naturalmente adaptados à sua própria realidade. Agora, tanto os setores tradicionais como os mais inovadores, mas que não são necessariamente, mas os de mais alta tecnologia, estão todos a fazer essa transição. Para uns é mais óbvio, como o da energia, é mais fácil pensar em inteligência artificial aplicada ao setor da energia, e muito rapidamente as empresas fizeram esse salto, no setor têxtil as adaptações são menos óbvias, mas também estão a acontecer.
Além das fileiras empresariais, existem quatro dissensões da indústria 4.0, são quatro dimensões de inteligência - SMARTS - por um lado a manufatura, por outro lado os produtos e serviços, as cadeias de abastecimento e, por fim, o trabalho inteligente. Qual é o pilar SMART da inteligência em que Portugal tem mais investido?
Não tenho grande ideia. Aquele que me preocupa mais é o do trabalho. Quando pensamos na adoção de tecnologia e fazemos essa transição e conseguimos ganhos de produtividade, etc., muitas vezes por razões de natureza até prática, não pensamos na parte do trabalho inteligente e o que são os impactos a médio, longo prazo no trabalho e eu acho que esse pensamento tem de ser feito.
Ou seja, ainda não está incorporado o trabalho inteligente dentro das empresas portuguesas?
Eu diria que muito pouco.
E o que é que pode ser feito a esse nível?
Primeiro é preciso pô-lo... Referiu esses quatro SMARTS, mas na verdade eu acho que esse nós deixámos um bocado para último, que é a parte das pessoas. Para além da formação que está a ter agora um salto muito grande com o programa Impulso que se espera poder formar pessoas que estão no mercado de trabalho, a parte da formação é crítica precisamente para fazer esse quarto SMART do trabalho inteligente, a adaptação a estas novas tecnologias precisa da adaptação dos recursos humanos, para isso muitas vezes é preciso formação nova e diferenciada, ela tipicamente não está disponível assim off- the-shelf, ou seja, no imediato, estes programas que permitem a capacitação de recursos já no mercado de trabalho vão permitir, no meu entender, acelerar esse processo de adaptação ao SMART, ao trabalho inteligente.
E quais são os programas ou instrumentos que a Agência Nacional de Inovação está a potenciar?
Nós focamos na promoção da inovação e isso implica um grande esforço e um grande apoio aos processos colaborativos. A grande maioria dos nossos instrumentos são de natureza colaborativa, o que implica a junção de diferentes parceiros, desde empresas de diferentes setores, a instituições de ensino superior e aos chamados centros de interface, que são umas instituições que nós apoiamos no âmbito do nosso programa interface. Portanto, estes chamados atores do ecossistema de inovação que se juntam para precisamente desenvolver novos produtos, serviços, novos processos e assim acelerar e pôr no mercado novas inovações. Portanto, esse é o nosso foco. Referi o programa Impulso porque é um fator crítico na adaptação da Indústria 4.0 da nossa força de trabalho.
Falou nos Centros de Interface, vão aumentar o número, penso que atualmente rondam os 31, vão ser mais?
Sim, vamos lançar um processo de reconhecimento de centros de tecnologia e inovação, no âmbito de um decreto-lei publicado em dezembro, e no âmbito daquilo que é a missão Interface do PRR, neste momento estão 31 centros reconhecidos, não consigo dizer se vamos aumentar, vamos passar pelo processo de reconhecimento e ver o que é que acontece.
E o que é que passa por esse processo de reconhecimento?
Na verdade existem estas instituições que já existem, portanto, já têm a sua estrutura e um plano estratégico, precisamente para fortalecer estas entidades este processo de reconhecimento vai passar também por uma avaliação do seu plano estratégico, do seu plano para o futuro, naturalmente que algumas destas entidades já têm um nível de maturidade que lhes permite fazer isso, mas também abri espaço a novas entidades noutras áreas de atuação e noutros setores que ainda não têm centros de interface e que podem ver reconhecido com base num plano estratégico e na sua visão dos eu pael, tem de ter efetivamente um papel de interface entre o sistema de investigação e aquilo que depois é as empresas, o mercado e a indústria. Naturalmente que a missão interface tem duas tipologias de instituições, os centros de tecnologia e inovação, e atualmente são 31, e os laboratórios colaborativos, que são 35.
Esses números vão aumentar?
Poderão aumentar, os centros e tecnologia e inovação, porque estamos a lançar um processo de reconhecimento, é natural que surjam outros novos centros que ainda não existam e que venham a ser reconhecidos...
Mas há candidaturas?
Nos contactos que temos tido algumas candidaturas novas irão surgir certamente.
E em que setores?
Tipicamente têm de vir a ocupar espaços que não estão neste momento ocupados, por aquilo são os centros de tecnologia e inovação. Não consigo dizer agora a totalidade dos setores, porque o processo abriu agora e eu não sei de facto o que é que vai acontecer, por isso neste momento é um bocado difícil prever são os setores em que vão surgir novas propostas. Os laboratórios colaborativos é que neste momento são 35, está aberto um processo de reconhecimento que é feito, não pela Agência Nacional de Inovação, mas pela FCT e, portanto, esse está a decorrer e nãos ei se daí irão surgir mais laboratórios reconhecidos.
Falando agora de financiamento e de fundos europeus. Qual o montante de que Portugal vai poder beneficiar para a inovação empresarial nos próximos anos? O Plano de Recuperação e Resiliência prevê verbas para financiar inovação nas empresas?
Há as agendas mobilizadoras para a inovação, já muito se falou desse instrumento, que está aliás agora no terreno com a sua segunda fase, depois de termos passado por uma primeira seleção de 64 propostas, são 930 milhões divididas entre agendas verdes e as restantes, como referia, a própria missão Interface tem uma dotação de 186 milhões precisamente para apoiar estas instituições de interface, como instrumento de reforma destas entidades, providenciando aqui um financiamento base que lhes permita depois também atrair outros financiamentos, mas agora no PT2030 irão haver medidas para a inovação, mas nesta fase ainda não é possível dizer que mediadas são essas e quais vão ser as dotações. E depois há também, e cada vez mais utilizado, os financiamentos dados pelos programas do Horizonte Europa e que permitem a muitas entidades e empresas portuguesas irem captar financiamento europeu para os seus processos de inovação.
E tem havido dinâmica empresarial, projetos de qualidade, para conseguirem absorver esses fundos que estão disponíveis?
Diria que cada vez mais. O número de entidades a participar é cada vez maior, e isso é um bom sinal. Tipicamente, no que diz respeito ao Horizonte Europa, que veio substituir Horizonte 2020, o número de empresas tem vindo a crescer porque penso que até há relativamente pouco tempo havia pouca familiaridade com este instrumento, e com esses projetos, esses projetos exigem colaboração, mas desta vez não só a nível nacional, a nível internacional, isso implica criar redes com outros parceiros noutros países, o que mutas vezes é uma dificuldade, e também o nosso trabalho na agência é de ajudar as empresas a encontrar os parceiros certos para se juntarem a estes financiamentos, e porque muitas vezes porque os processos são diferentes, as empresas têm por vezes dificuldade em compreender como é que podem concorrer ao Horizonte Europa. Nós temos feito muito trabalho de colaboração com entidades, sobretudo associações empresariais, entidades regionais para apoiar a participação das empresas a aumentar cada vez mais no Horizonte Europa, é uma das nossas preocupações, um dos nossos objetivos, e, portanto, temos feito esse trabalho de apoio que penso que irá crescer nos próximos anos.
Há verbas por executar ainda no âmbito do Portugal 2020?
Ainda não terminámos os projetos todos, portanto, há verbas por executar, porque os projetos ainda estão a decorrer, ainda não terminaram. Mas as nossas taxas de atuação são bastante levadas e bem-sucedidas, mas é muito raro um projeto ocorrer exatamente como ele é previsto, por razões óbvias. Se quero testar determinada tecnologia não sei à partida o resultado do teste que vou ter, se não precisava de um projeto, há sempre uma dose de incerteza na execução destes projetos e há sempre uma taxa que não é executada. mas tendencialmente os projetos inovadores têm espaço para serem apoiados nos mais variados instrumentos em Portugal.
Portanto, não será por falta de financiamento que esses projetos não avançarão...
Exatamente. Às vezes é o instrumento certo que é difícil de encontrar, e aqui está também a ser feito um esforço, aliás conjunto de todo sistema, de ter formas de ajudar as empresas e os intervenientes, os promotores a identificarem a forma de melhor adaptarem o aviso, ou a oportunidade de financiamento ao seu projeto, portanto, às vezes há questões de adaptação, nós notamos muito isso com o Horizonte Europa, porque como conhecemos menos bem por vezes as empresas ou as entidades submetem um projeto a um aviso ou a uma call ,mas na verdade não era muito adequdo, portanto, essa adequação às vezes é preciso ser afinada, mas nós, e as outras entidades do sistema fazem esse trabalho de ajuda e estamos agora a fazer um Projeto para podermos fazer isto de forma mais transversal, e não fazermos cada um fechados na suas entidades e podermos dar essa informação de forma mais alargada.
E o que é que prevê esse projeto concretamente?
Prevê isso dar informação mais de forma mais alargada para que um promotor não tenha que ir à entidade A, à entidade B, à entidade C, mas haver uma centralização da informação e da assistência a quem quer encontrar formas de financiar um determinado projeto.
E essa centralização será feita por que entidade?
É um processo colaborativo, estamos a desenhá-lo, na verdade é um processo de transição que acho que é normal ser feiro e colaborativo. Falo muito em colaboração das entidades no nosso sistema de inovação, as empresas etc., mas as próprias entidades que atuam sobre o sistema também têm de encontrar formas de colaborar. O que é um desafio, porque, nós temos as nossas instituições para tomar conta, as nossas obrigações, e temos que encontrar o espaço e a forma de trabalharmos em rede, e vamos trabalhando pontualmente, determinados projetos podem servir de facto de aglutinador desta colaboração.
O Horizonte Europa, não sendo um financiamento com quotas nacionais, é mais difícil o acesso e qual é o montante que pode estar disponível para Portugal no próximo ciclo de investimento até 2027?
É muito mais difícil porque é muito mais competitivo. Porque se ele concorre com um projeto ou uma call europeia estou a competir com a Europa inteira. Portanto, se eu estou, por exemplo, com um projeto de inteligência artificial, estou a competir com os países da Suécia, Holanda, Alemanha, todos os países europeus que tenham projetos nessa área. isso quer dizer que o meu projeto tem de ter um nível igual ou superior aos outros para poder ser financiado. O financiamento disponível, o nosso objetivo era duplicar e atingir os dois mil milhões de financiamento para Portugal no próximo programa europeu e sobretudo aumentar a participação das empresas nesse financiamento, que no anterior programa quadro foi de 30%, e que nós queremos atingir os 50%.
Esse processo depende muito da transferência do conhecimento das universidades para as fábricas. Esse processo do laboratório para a oficina, esse processo está a correr bem?
Está de decorrer melhor. Acho que nóscrescemos imenso nos últimos dez, 15 anos, em Portugal. Mas ainda há muito espaço para crescer, no meu entender. Há muitas razões para isso, desde os setores, até dimensão das empresas que também é um fator que determina a nossa capacidade de colaboração, e também por isso é que os centros de interface são tão importantes. Porque quando olhamos para o número de PME e microempresas que temos, podemos pensar que uam grande empresa facilmente faz esta ligação, contrata pessoas de determinadas universidades, nós sabemos que os recursos humanos são excelentes veículos para a promoção da colaboração, e mantêm as suas ligações às suas universidades de origem e que isso é promotor de transmissão de conhecimento. Como as PME são mais pequenas, esse processo por razões óbvias de dimensão, é mais difícil. Além isso, é mais difícil pensar que uma empresa muito pequena consegue contactar com tantas instituições de ensino superior. E aí o interface tem um papel crítico, porque permite-lhe aceder a conhecimento proveniente de diferentes instituições de ensino superior e de investigação, através da ligação a uma entidade pública que é o interface. Portanto, existe essa transferência de conhecimento, tem crescido significativamente em Portugal, infelizmente não temos um número, temos alguns dados de patentes e de publicações em colaboração que têm crescido, e que têm mostrado isso, agora, que ainda podemos fazer mais, podemos.
E tem acontecido a integração de doutorados nas pequenas e médias empresas. Isso potência a inovação? Está a acontecer?
Sim, isso é na verdade crítico, mais uma vez aumenta a complexidade do conhecimento que é possível absorver numa empresa, e numa PME isso é ainda mais importante, mais uma vez por razões de dimensão. Isso está a acontecer. Também aqui os centros de interface são um móbil crítico para essa transição, porque muitas vezes estes centros contratam doutorados para desenvolver projetos e acontece muitas vezes a empresa ficar com o doutorado porque percebe que esse recurso é crítico para o desenvolvimento daquele processo. Portanto, estes interfaces queixam-se, é verdade, "epá, as empresas ficam-nos com os doutorados", mas para nós essa é de facto uma visão de sucesso, é difícil, porque depois o interface tem de procurar outro recurso, mas do ponto de vista do sistema, isso é de facto desejável, que eles façam essa transição.
E depois há também a questão regional, a proximidade às universidades está a condicionar a instalação destas empresas, de startups, ou seja, as empresas, quando nascem, precisam ainda do cordão umbilical da academia?
Essa questão é muito importante, um dos meus artigos da minha tese de doutoramento, há dez anos, mostra precisamente o impacto que as instituições de ensino superior têm na criação de empresas de base tecnológica e nós verificámos que isso. O que é que acontece: nós temos institutos politécnicos com uma penetração regional muito densificada e que são atores críticos para fazer essa ligação. E os centros de interface, nomeadamente os laboratórios colaborativos, também têm uma penetração regional de proximidade dos setores que representam, no casos dos centros de interface mais de natureza setorial, e também de ligação às instituições de ensino superior. Portanto, o fator regional é crítico, agora, o que temos observado, é que também estes centros, por exemplo, os laboratórios colaborativos que são mais novos, permitem-nos observar o seu crescimento de forma mais de perto, no momento, têm captado recursos humanos altamente qualificados para regiões onde não havia esse número de forma significativa. Portanto, do ponto de vista também da coesão territorial, estas interfaces, este trabalho, é muito importante.
E as zonas livres tecnológicas que foram lançadas no final do ano passado. Já há manifestações de interesse para a sua criação?
Já há manifestações de interesse, estamos neste momento precisamente em fase de avaliação dessas manifestações de interesse para podermos desenhar propostas concretas, de acordo com o que está previsto. E penso que vai haver mais manifestações de interesse noutras áreas, estou à espera que isso aconteça e que possamos contextualizar estas Zonas Livres Tecnológicas, estes projetos naquilo que é realidade europeia dos test beds e da experimentação tecnológica para a aceleração da adoção de novas tecnologias em Portugal.
E essas manifestações de interesse são para que setores e para que regiões do país. Pode adiantar alguma coisa?
Na verdade, como estamos em processo de avaliação preferia não anunciar, não falar daquilo que está a decorrer, acho que era melhor.
E termos de timings, quando é que se pode esperar a criação da primeira ZLT em Portugal?
Gostava muito de ter a primeira Zona Livre Tecnológica no primeiro semestre de 2022.
Qual pode ser a importância destas ZLT para o país?
É importante por razões diferentes. Uma é porque naturalmente permite a experimentação tecnológica. Isto permite-nos acelerar a entrada destas tecnologias no mercado por facilitar o teste. E depois tem um outro lado, um outro aspeto, que é muito crítico, que o da regulação, permitir a adaptação de instrumentos regulatórios adequados a estas tecnologias. Por exemplo, quando olhamos para a condução autónoma, a regulação ainda não existe, e estas tecnologias, estes espaços de experimentação permitem-nos também, e porque nós o estamos a fazer juntamente com os reguladores, permitem-nos ir fazendo uma reflexão daquilo que é crítico ir fazendo em termos de regulação, e aquilo que temos de desenvolver em termos de regulação para quando estas tecnologias chegarem ao mercado.
Esta questão também pode ter muito a ver com a questão da fiscalidade, que é também uma questão crítica, tal como a questão do capital humanos, e este tema da fiscalidade devia ter alguma discriminação positiva no que diz respeito aos impostos? Ou seja, discriminar positivamente em função da empregabilidade deste setor, ou em função do território onde as empresas se vão inserir. Devia ser feita essa discriminação positiva de uma forma mais acentuada?
Devo confessar que fiscalidade é algo sobre o qual que seu sei praticamente nada, portanto, tenho alguma relutância em dizer o que é que devia ser feito.
No entanto, há um sistema de incentivos fiscais à Investigação & Desenvolvimento, que é o SIFIDE...
É a única coisa no âmbito da fiscalidade sobre o qual eu sei alguma coisa.
Mas é suficiente, o SIFIDE?
Suficiente para quê?
Para criar oportunidades às empresas, ou incentivar as empresas a criar investigação e desenvolvimento?
Não tenho dúvidas que é. O SIFIDE é o instrumento de apoio à I&D mais maduro que nós temos. Faz este ano 25 anos. na altura em que surgiu, era aliás caso exemplo na Europa. Não havia noutros países um instrumento com este nível. Precisamente para celebrar os 25 anos estamos até a fazer uma reflexão sobre a sua história e o seu impacto e é muito interessante porque muitos dos empresários com quem nós nos vamos encontrando, nos dizem bem do SIFIDE. O SIFIDE é um instrumento maduro, tem sido sucessivamente alvo de estudos e inspeções mostrando precisamente isso. A nível internacional está muito bem equiparado, e portanto não tenho dúvidas que o SIFIDE e um bom instrumento de apoio à I&D nas empresas, sobretudo nas grandes empresas.
E pode ser melhorado, ou está bem assim?
Claro que pode sempre ser melhorado, é precisamente por isso que estamos a fazer também uma reflexão sobre o que é que corre bem e o que corre menos bem, e também porque o nosso próprio sistema de I&D amadureceu muito. E claro que pode ser melhorado e até todos os anos nós propomos algumas alterações, nomeadamente questões ligadas às regiões, todos os anos propomos pequenas melhorias e acho que precisamos de facto de aproveitar este aniversário, este simbolismo para o estudar um bocadinho e perceber o seu impacto, o impacto que tem tido esse apio à I&D nas empresas. Nós sabemos porque muitos dos empresários nos dizem por favor não mexam no SIFIED, é um apoio muito importante e de facto muito maduro, um sistema muito maduro e que funciona muito bem, mas claro que há sempre espaço para melhorias e vamos aproveitar este aniversário para fazer essa reflexão.
E pode o financiamento público, porque na prática indiretamente trata-se de financiamento do Estado por via fiscalidade às empresas. Pode o financiamento público entrar em empresas de inovação quando os riscos não podem ser vistos ou medidos? Como se regula a incerteza nas tecnologias emergentes?
Acho que esse é precisamente o papel do financiamento público. Em atividades de grande nível de risco e incerteza, serve para diminuir esse risco, uma espécie de rede, de trampolim, que possa permitir às empresas estar sempre a inovar.