Morosidade e contradições na lei limitam certificação energética dos edifícios

Catarina Roseta-Palma, professora associada do ISCTE, considera urgente investir na eficiência energética dos edifícios e critica obrigatoriedade da existência de pré-instalação de gás, quando o objetivo é a transição para energias limpas. Morosidade de processos no caso dos edifícios públicos faz derrapar orçamentos.

Portugal até pode ser considerado um exemplo a seguir na área da produção de eletricidade - "é dos países europeus com maior penetração de energias renováveis" -, mas, apesar de o sublinhar, Catarina Roseta-Palma, economista e professora associada do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, diagnostica atrasos do país nos campos da mobilidade elétrica e, sobretudo, da eficiência energética dos edifícios.

No que diz ser "mais um passo" rumo à neutralidade carbónica, a também diretora da sustentabilidade do ISCTE, analisa os investimentos previstos no Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) na área da Transição Climática, cujo valor ultrapassa os três mil milhões de euros, e aponta várias dificuldades na execução, desde logo nos projetos destinados aos edifícios públicos.

"A implementação (dos projetos de intervenção nos edifícios públicos) não tem sido muito fácil", afirma a economista, identificando "alguns problemas" pela "demora dos processos que faz com que, quando são autorizados, o custo da construção tenha aumentado" e as obras já não se possam realizar.

Além da morosidade dos processos, Catarina Roseta-Palma salienta a existência de contradições na lei face aos objetivos a que o país se propõe. "Se o edifício tiver ar condicionado, ganha pontos em relação ao edifício que não tem ar condicionado. O que, do ponto de vista energético, é exatamente o contrário daquilo que deveria ser", refere. Mas há casos que a investigadora considera mesmo incompreensíveis.

"Em Portugal é obrigatório qualquer novo edifício, para ter licença municipal, ter pré-instalação de gás. Isto é uma coisa inaceitável", sublinha a economista. "Quando nós temos cenários da International Energy Agency a dizer que, em 2025, não pode haver instalação de novas caldeiras de gás, se queremos cumprir a neutralidade carbónica em 2050, eu não percebo como é que em 2018 há uma legislação portuguesa que é alterada dizendo que todo e qualquer projeto residencial tem de ter obrigatoriamente pré-instalação de gás. Quer queira ter gás, quer não queira", explica Catarina Roseta-Palma, acrescentando que "é preciso garantir que os cidadãos percebam o que se pretende" quando falamos de transição climática. Esse objetivo é urgente, mas, nas palavras da investigadora, chegar à neutralidade carbónica implica dar "passos consistentes".

"Não há plano nenhum a trinta anos que resista ao choque com a realidade. Precisamos de nos mover rápido, sem fazer asneiras. Não é um trabalho fácil e, com prazos curtos, muito menos", reconhece.

Os mais de três mil milhões de euros previstos para a transição climática no PRR são uma gota no oceano de investimentos previstos até 2050. Portugal até pode ser considerado um exemplo a seguir, ainda que não em todas as áreas.

"Na produção de eletricidade, Portugal já avançou muito com mais energias renováveis. Na parte dos transportes, fomos pioneiros, mas não conseguimos prosseguir com a rapidez desejada e estamos agora a retomar esse ímpeto na eletrificação. E, no caso da indústria, ela está a fazer o seu trabalho no contexto europeu, mas também creio que ainda há muito caminho a percorrer", remata Catarina Roseta Palma, considerando que nesse percurso "as verbas do PP dão alguma ajuda", ainda que os prazos sejam "curtos" e a aposta na transição climática seja cada vez mais essencial.

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