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O Partido Socialista pagou 4 milhões de euros, em quatro eleições, à empresa de um militante e antigo funcionário que organiza, há décadas, os eventos do partido. Inspeções sublinham que é dinheiro público.
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Há pelo menos quatro eleições que a entidade que fiscaliza as contas dos partidos aponta o dedo à impossibilidade de avaliar se são ou não razoáveis as despesas pagas à Aedis, uma empresa de um militante e antigo funcionário do PS que é, há vários anos, a maior fornecedora de serviços ao partido.
Os quatro últimos relatórios sobre as campanhas dos socialistas revelam que esta empresa recebeu, ao todo, em 2009 e 2011, perto de 4 milhões de euros em quatro campanhas eleitorais. Em todas, os técnicos levantaram o mesmo problema (contratos sem consulta prévia ao mercado), mas só em março o comportamento foi censurado pelos juízes no acórdão do Tribunal Constitucional (TC) sobre as legislativas de 2011.
Nessas contas, o partido explicou que adjudicou a realização de comícios e jantares a duas empresas sem qualquer consulta prévia ao mercado. Em causa, de novo, a Aedis que recebeu 887 mil euros, mas também a Grandevento que recebeu 170 mil. Os juízes acabaram por concluir que não podiam avaliar se estes pagamentos foram ou não razoáveis, o que viola a lei do financiamento das campanhas eleitorais.
Os relatórios e pareceres da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP, que apoia tecnicamente o TC na avaliação dos dinheiros dos partidos), entretanto consultados pela TSF, explicam melhor o problema e dizem que «o pagamento de elevadas verbas a um único fornecedor ou mesmo dois poderá indiciar que há pagamentos de bens e serviços por valores superiores aos praticados no mercado, eventualmente sobrefaturados». Pode estar em causa um alegado favorecimento desse fornecedor, quando se sabe, como sublinha a entidade, «que as despesas de campanha são numa grande medida subvencionadas pelo Estado».
Este facto não surge nos documentos consultados no TC, mas as duas empresas têm o mesmo dono: Domingos Ferreira, um militante e antigo funcionário do PS, que explicou à TSF que é responsável, há décadas, pela organização dos eventos socialistas.
Domingos Ferreira conta que depois de se reformar criou empresas que conseguem fazer preços mais baratos do que a concorrência e que têm, devido à sua experiência, um conhecimento profundo do PS e uma relação de confiança com o partido.
O mandatário financeiro dos socialistas nas legislativas de 2011, António Ramos Preto, não comenta este caso e diz que tudo o que tinha a dizer foi apresentado na resposta enviada à ECFP.
Nessa resposta, o PS argumentou que não procurou saber os preços de outras empresas pois já trabalha há muito com a Aedis e com a Grandevento e apenas estas garantem, devido à longa experiência, a melhor relação qualidade-preço na realização dos comícios e jantares. O PS argumenta que não há muitas empresas com a capacidade de entregar comícios do tipo "chave na mão" (com tudo previamente organizado).
No parecer final, a ECFP classificou a resposta do PS como «retórica», dizendo que «não esclarece» as dúvidas levantadas e que «nada impediria» o partido de fazer uma consulta a poucos fornecedores: «são valores muito elevados para que possam ser adjudicados sem qualquer espécie de consulta prévia ao mercado».
A ECFP acrescenta que há uma fatura da Aedis no valor de 824 mil que não aponta as quantidades fornecidas ou os preços unitários praticados e «não compreende que não tenha sido trocada correspondência com estes fornecedores» ou que esta nunca tenha sido fornecida a quem fiscalizou as contas.
A ECFP acrescenta que há duas faturas da Grandevento com enormes disparidades de preços e que, feitas as contas, há um jantar no Porto que custou ao partido 47 euros por pessoa, enquanto outros, em Leiria e em Portimão custaram, respetivamente, 35 euros e menos de 9 euros.