"Hidrogénio, para já, é uma quimera." Especialista pede mais "planeamento" e menos espetáculo

Clemente Pedro Nunes considera que a aposta no hidrogénio é "prematura, irrealista" e com custos elevados.

O Governo olha para o hidrogénio verde como o "maior projeto industrial desde o 25 de abril", mas ainda há quem se mostre cético quanto à nova fonte de energia. Clemente Pedro Nunes, professor no Instituto Superior Técnico, defende que o hidrogénio "é uma quimera" e critica o Governo por ainda não ter apresentado um projeto com "cabeça, tronco e membros".

O hidrogénio verde é uma das grandes apostas do Governo na área da energia, com um investimento de 62 milhões de euros no Plano de Recuperação e Resiliência, além do grande projeto em Sines de mais de mil milhões de euros, que será apresentado esta sexta-feira.

Clemente Pedro Nunes, que integra ainda o observatório de energia e indústria da associação SEDES, considera, no entanto, que a aposta no hidrogénio é "prematura e irrealista", já que "não é competitiva" comparando com as restantes fontes de energia.

"Existem ideias e existem apresentações, várias propostas, mas para além da hipérbole, ou seja, um projeto concreto, não conheço nenhum. Conheço a resolução de Conselho de Ministros, mas um projeto tem de ter uma rentabilidade, uma proposta", diz o engenheiro de profissão, em entrevista à TSF.

Clemente Pedro Nunes lembra que o primeiro projeto em Sines "previa a exportação de hidrogénio para a Holanda", mas nota que foi, entretanto, "abandonado" pelo Governo holandês "porque o transporte é caríssimo e extremamente difícil".

"O hidrogénio, para já, é uma quimera. Não vejo outro nome a dar. As quimeras não se compadecem com falta de rigor tecnológico: a falta de rigor cai sempre nos desgraçados dos consumidores", caracteriza.

Clemente Pedro Nunes nota que "a política energética de Portugal está cheia de declarações políticas e mediáticas", o que levou a uma dívida tarifária de dois mil milhões de euros. O investigador aconselha o Governo a fazer um plano "com dados concretos", comparando o hidrogénio com outras fontes de energia.

O Governo prevê que, em dez anos, cinco por cento do consumo total da energia nacional seja oriunda do hidrogénio verde, no entanto, o investigador explica que essas são metas apenas indicativas.

"A resolução de Conselho de Ministros traçava metas obrigatórias, que é uma forma de planeamento um pouco à soviética. Depois foi dito que eram meramente indicativas. Estamos no capítulo das declarações políticas, mas é preciso haver execuções concretas", atira.

O investigador defende que a opção pelo hidrogénio só deve avançar "se for mais barato do que já existe" e, neste momento, "não é um produto competitivo". Além disso, a molécula de hidrogénio tem de ser produzida em laboratório.

A aposta no hidrogénio é, nesta altura, "irrealista e prematura" com o investigador a recordar que não existe uma "proposta estudada e analisada, com um projeto de detalhe, com todos os riscos envolvidos nos investimentos".

"A primeira coisa que o Governo deve fazer para ter uma proposta séria no campo da eletricidade é um planeamento dos preços, com uma estimativa exata dos megawatts que já estão atribuídos. Os famosos parques fotovoltaicos do Governo de Sócrates vão estar em vigor até 2028. A própria ERSE devia fazer um planeamento, mas o Governo é o responsável político", nota.

Clemente Pedro Nunes admite que o hidrogénio pode ser uma forma de evitar a intermitência da energia solar e eólica, com o armazenamento de eletricidade, "mas tem custos elevadíssimos, que têm de ser comparados com os outros".

O investigador reforça que "o planeamento não existe" e nota que "o último planeamento feito com cabeça, troco e membros" foi durante o mandato do ministro Ricardo Bayão Horta, quando se decidiu "não ir para o nuclear, e em alternativa apostar no carvão e no gás natural".

"Depois disso, o que fizeram foram arremedos. Decisões casuísticas. E o hidrogénio está em cima dessas decisões casuísticas", diz.

Esta sexta-feira é lançado um novo projeto em Sines, liderado por um consórcio internacional, que pretende investir mil milhões de euros na produção de hidrogénio e amónia verdes.

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