Após dois adiamentos, novo sistema arranca hoje. Médicos pedem centros especializados para avaliar os condutores pois garantem que os centros de saúde não têm as condições exigidas pelas novas regras.
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Entra em vigor esta segunda-feira a obrigatoriedade de emitir por meios informáticos os atestados médicos para a emissão ou renovação das cartas de condução.
Na prática, os atestados passam a ser transmitidos de forma eletrónica para o Instituto da Mobilidade e Transportes (IMT), permitindo o registo automático da avaliação médica.
Os médicos de família dizem, no entanto, que vão ter muitas dificuldades em passar estes atestados. E o governo confirma à TSF que o projeto de decreto-lei que permitirá criar os serviços clínicos, privados, para avaliar a aptidão física, mental e psicológica, alterando o Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, ainda está "em processo legislativo" para ser aprovado em Conselho de Ministros.
Até o Cristiano Ronaldo...
Carlos Arroz, presidente do Sindicato Independente dos Médicos e médico de família na Cova da Beira (em Belmonte) conta que está muito preocupado e não faz ideia como vai passar os atestados para quem quer começar ou continuar a conduzir.
O clínico diz que o "Guião Prático para a avaliação Física e Mental de condutores" divulgado pela Direção-Geral da Saúde é impossível de cumprir, pois faltam meios humanos e técnicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Carlos Arroz defende que quase nada está preparado, os médicos não têm todo o equipamento necessário para fazer os testes definidos e o maior problema será os meses ou anos de espera para ter acesso a consultas de especialidade no SNS que, a partir de agora, passam a ser muitas vezes necessárias na emissão dos atestados.
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O médico de família explica que cardiologia, oftalmologia, neurologia ou psicologia e psiquiatria não são consultas fáceis de conseguir e em muitos casos, com as novas regras, serão obrigatórias.
Outro problema é que milhares de portugueses tomam antidepressivos e a partir de agora qualquer doente com essa medicação precisará, afirma, de um parecer de um psiquiatra que é muito difícil de obter.
Carlos Arroz diz que também não há meios técnicos nos centros de saúde para atestar a visão crepuscular dos utentes que querem conduzir (e outras questões concretas que os médicos terão de avaliar), nem os consultórios têm tamanho para fazer os tradicionais exames (com letras na parede) à visão dos doentes.
Em resumo, o médico argumenta que até uma pessoa "altamente saudável como o Cristiano Ronaldo se aparecesse no centro de saúde teria muito dificuldade em obter um atestado para conduzir".
Tudo seria mais fácil, segundo Carlos Arroz, se o governo já tivesse aprovado os serviços clínicos para a avaliação da aptidão física, mental e psicológica dos condutores, que se substituiriam ao SNS e aos centros de saúde.
Faltam centros especializados para avaliar condutores
O presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar não é tão crítico como Carlos Arroz em relação a este novo regime dos atestados das cartas de condução. É preciso esperar para ver como funciona, mas admite que é provável que surjam problemas.
Rui Nogueira argumenta que a informatização pode, à partida, simplificar e acelerar alguns procedimentos, provavelmente à maioria dos utentes, apesar de faltarem meios técnicos e humanos nos centros de saúde para cumprir aquilo que é pedido pelo novo sistema.
Razões que levam o clínico a dizer que seria fundamental criar os prometidos serviços especializados para fazerem estas avaliações, sobretudo para os utentes com mais problemas de saúde.
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Rui Nogueira sublinha que, a partir de agora, em vários casos, pedir estes atestados não deverá demorar menos de algumas semanas ou mesmo meses. Se calhar, admite, os interessados devem pensar no assunto uns seis meses antes.
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A TSF contactou o Ministério da Saúde que prefere apenas falar do assunto quando aprovar o decreto de lei que preveja os serviços especializados para fazer estas avaliações aos condutores. Do lado da DGS ainda aguardamos resposta.