Cientista português recebe três milhões para reinventar engenharia sísmica
Bolsa científica financia projeto para antecipar, com maior exatidão, o comportamento dos edifícios mais antigos quando sujeitos a sismos.
Corpo do artigo
Paulo Lourenço, professor catedrático do Departamento de Engenharia Civil da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, acaba de ser distinguido com uma bolsa de 3 milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação (ERC) para desenvolver, nos próximos cinco anos, uma abordagem inovadora para a avaliação da segurança do património construído com valor histórico, quando submetido a sismos.
Uma parte desta bolsa será aplicada na construção de uma nova infraestrutura laboratorial, em Guimarães, que replique os sismos que ocorrem na Terra.
https://www.facebook.com/uminhooficial/photos/a.112260562183542/2152979321444979/?type=3
"Temos uma infraestrutura excelente no Laboratório Nacional de Engenharia Civil [LNEC], que usamos muito e esta nova será uma infraestrutura para o norte do país, mais pequena mas com equipamento único ao nível do controlo e da observação dos danos. Vai estar a trabalhar quatro anos seguidos a replicar sismos, o que nos dará um manancial de informação experimental que não existe, é totalmente novo", revelou à TSF Paulo Lourenço, engenheiro civil e especialista em construções antigas.
O cientista da Universidade do Minho, agora premiado com uma bolsa milionária do Conselho Europeu de Investigação, propõe-se desenvolver um conjunto integrado de metodologias que permita prever, com maior exatidão, o comportamento dos edifícios mais antigos quando sujeitos a sismos.
"Vamos pegar na informação [produzida na nova infraestrutura] e combiná-la com ferramentas de simulação computacional, ferramentas analíticas, que já existem mas que vão ser validadas a outro nível, e acopladas com formulações matemáticas que tentam incluir o regime caótico deste género de estruturas", detalhou.
No final, o projeto pode vir a mudar a forma como se faz atualmente engenharia, sobretudo na abordagem a edifícios antigos, mais vulneráveis ao risco sísmico. "O entendimento dos avaliadores [do Conselho Europeu de Investigação] é que é, efetivamente, disruptivo, não tanto por uma contribuição única mas pelo conjunto que tem de integração", salientou o codiretor do Instituto para a Sustentabilidade e Inovação em Engenharia de Estruturas (ISISE) e codiretor do Instituto para a Bio-Sustentabilidade (IB-S).
Num país onde há um elevado risco de se repetir o desastre de 1755, Paulo Lourenço considera que a prevenção antissísmica em Portugal não tem recebido a devida atenção: "A verdade é que um sismo tem impacto de muito curto prazo. Ao fim de uma geração as populações já não se lembram de sismo nenhum. E em Portugal a convicção da população é de que o sismo não é um problema, sendo certo que um sismo de grande magnitude vai voltar a ocorrer no futuro", alerta. Daí que "a maior parte da construção" efetuada após o terramoto não apenas em Lisboa mas em toda a zona sul, até ao Algarve, zonas de perigosidade mais elevada, "precisa de ser melhor analisada e que parte dela é altamente favorável".
E a reabilitação urbana que tem revolucionado os centros históricos de Lisboa e Porto, nos últimos anos, tem sido uma oportunidade perdida. "A reabilitação urbana que tem sido feita tem menosprezado totalmente a reabilitação sísmica. É estranhíssimo que haja tanto ênfase na parte energética, que evidentemente é importante para a nossa economia e para um mundo mais sustentável, mas que em relação a algo que mexe com a vida das pessoas, com o seu maior bem que é a casa... está a ser uma oportunidade perdida", refere. Mais ainda se considerarmos que nunca como hoje o preço por metro quadrado foi tão elevado. "Neste momento em que o valor da obra é relativamente marginal face ao preço de venda é quase inaceitável a falta de atenção que se tem dado a este problema", alerta.
Os desastres naturais, entre inundações, ciclones e outros, afetam cerca de 250 milhões de pessoas por ano. Os sismos, não sendo dos desastres com mais perdas económicas, são os que mais matam.