Escravizados, sem apoio psicológico e mal alimentados nas prisões portuguesas
Muitos reclusos portugueses trabalham oito horas por dia para receber dois euros, alimentam-se mal e os seus objetos são vendidos por dezenas de euros em grandes superfícies.
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Não há psicólogos suficientes para dar continuidade aos processos de reinserção dos reclusos nas prisões nacionais e os presos fazem quatro refeições por dia no valor de 3,70€. Um valor que, diz a OVAR, a Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos, espelha a qualidade da comida.
A OVAR também garante que há trabalho quase escravo nas prisões, com os presos a trabalhar oito horas e a receberem dois euros no final do dia.
Esta quinta-feira, no Terra Justa, Encontro Internacional de Causas e Valores da Humanidade, em Fafe foi de homenagem à OVAR, a Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos.
Manuel Almeida Santos, presidente da Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos, recebeu ontem a homenagem no Terra Justa, em Fafe. À TSF contou um caso concreto de reclusos que passam o dia a fazer mochilas e no final recebem dois euros, e que encontrou essas mochilas à venda numa grande superfície por 60 euros. Um duplo problema, explica.
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Trabalho escravo dos reclusos e concorrência desleal. E num dia de trabalho em que recebem dois euros, alimentam-se mal, alerta o presidente da OVAR.
As empresas que fornecem as cantinas das prisões fazem quatro refeições: pequeno-almoço, almoço, jantar e reforço, por apenas 3,70€. Feitas as contas, a empresa tem de fornecer aos reclusos uma refeição de 0,92€ e ainda ter lucro com isso. O valor remete-nos para a qualidade da comida.
O reclusos podem comprar outros produtos na cantina ou no bar da prisão, mas os preços são inflacionados. Um simples pacote de bolachas é mais caro na prisão do que na rua. Um edredão, que tem de ser comprado obrigatoriamente no estabelecimento prisional pode chegar a custar o dobro.
O presidente da OVAR refere ainda o tempo e o número de vezes que um recluso pode fazer uma chamada telefónica. Duas por dia: uma para o advogado e outra para a família. Cada uma delas não pode ultrapassar os cinco minutos. Uma regra que condena o sucesso da defesa dos reclusos.
Outro reparo que está a afetar a vida dos prisioneiros portugueses é a falta de psicólogos nos quadros dos estabelecimentos prisionais. O governo impede as contratações, a rotatividade é grande, os psicólogos estão a recibo verde, e alguns são pagos a 5 euros à hora. "É uma questão já antiga e reconhecida pela Direção Geral dos Serviços Prisionais. Porque não podem admitir para o quadro, por razões orçamentais, psicólogos a tempo total recorrem a empresas de prestação de serviços, psicólogos a recibo verde. É evidente que estes psicólogos não estão motivados para estabelecerem um plano, a longo prazo, de recuperação de reclusos, porque não sabem se no mês que vem vão ser eles, se vão arranjar outro emprego, ou se a empresa vai lá colocar outros no mesmo lugar", afirma.
Sem trabalho contínuo de reinserção social, Portugal no quadro europeu aparece no grupo dos piores, sempre na segunda metade da tabela, com um maior número de presos, com o maios número de mulheres, com as mais altas taxas de sobrelotação das prisões e com as maiores taxas de suicídios entre reclusos.