No mundo online é que está o ganho. As histórias de uma recém-zero e de um viral
Saíram do mundo real para conquistar o digital. Pelo meio, o Facebook pode destruir o mundo.
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"O Facebook pensa: que se lixe o mundo, vamos dar cabo de tudo". As palavras não são meigas para a maior rede social do mundo. Quem lhe aponta o dedo é Ashkan Karbasfrooshan, o fundador da WatchMojo.com , uma plataforma online de conteúdos, centrada em vídeo.
No palco Content Makers discutia-se o que leva algo ou alguém do zero até ao estatuto "viral". Nas plataformas de social media vemos, hoje em dia, criadores e empresas com milhões de seguidores, prontos a ouvir, ler, ver e até comprar o que os seus "opinion makers" lhes mostram.
Na avaliação do comportamento das plataformas, Karbasfrooshan aponta aquele que é, para si, o melhor modelo: o do YouTube.
"É bom, mas está preso num limbo porque, de um lado, tem os criadores que além de fazerem vídeos têm também uma vida própria que os impede de estar a full time no YouTube. Do outro, tem os patrocinadores, que estão sempre à espera de novos conteúdos, servidos de forma periódica e cíclica."
Isto obriga a que o YouTube seja obrigado a mexer nas diretivas que regem a atribuição de receitas publicitárias aos criadores, tornando-as mais restritas e obrigando as estrelas do pequeno ecrã (ou de todos eles, na verdade) a reinventarem-se constantemente.
Quanto à forma como a Google gere tudo, o líder da WatchMojo deixou apenas uma questão: "Google, porque é que precisam de dizer às pessoas que não sejam más?"
Do Instagram nasceu uma carreira
Tem 1,4 milhões de seguidores no Instagram e mudou-se para Los Angeles sozinha, à procura de uma carreira como modelo e atriz. Questionada por Belinda Goldsmith, editora-chefe da Thomson Reuters Foundation acerca de que tipo de posts lhe garantem mais engagement, (ou em português, interações), a resposta é imediata: "fotos de mim, vídeos de mim, declarações minhas."
A resposta pode parecer fútil e plástica, mas os números de gostos e comentários na conta de Instagram de Charlotte provam que é realmente esta a verdade. As publicações em que a cara ou o corpo da modelo aparecem tem dezenas de milhares de likes. As publicações em que não aparece mal tocam os 2 mil gostos.
Charlotte está prestes a lançar uma linha de lingerie. Como empreendedora com uma entrada iminente no mercado, devia estar preocupada? Devia, mas não está.
"A maior parte das vendas vai ser feita pelo Instagram. Aí tenho a certeza de que vou chegar ao público certo." É um novo paradigma para os negócios: vender diretamente a quem já seguia, a priori, alguém que usa ou patrocina esse produto, através dessa mesma pessoa.
Esta é uma oportunidade de negócios que a modelo já podia ter tido antes, o problema é que já tinha perdido trabalhos "por não ter seguidores suficientes."
Mas no mundo das redes sociais, não são só as empresas que vetam os vendedores, o contrário também acontece. "Não patrocino coisas que choquem com o meu tipo de vida sustentável. Vão contra os meus princípios." O problema é que, por acaso, também "são os que dão mais dinheiro." Valores, a quanto obrigam.
Os erros que podiam ter deitado tudo a perder
Este mundo digital está longe de ser um conto de fadas. Por isso, os dois oradores foram questionados acerca do "maior erro" que alguma vez tinham cometido.
"Engraçado, o meu terceiro livro é apenas e só sobre erros que cometi. Querem ir por capítulos ou temas?" gracejou Karbasfrooshan.
Sim, o fundador de uma das plataformas de vídeo com mais sucesso do mundo tem um livro apenas e só sobre os erros que cometeu.
Ainda assim, há um que destaca: "não se deixem enganar pelos investidores. Nas negociações, há mais psicologia envolvida do que aquilo que possam imaginar", começou por explicar. "É preciso saber recuar, não ceder. Tentem espreme-los, ver até onde podem chegar, não deixem cair aquilo em que acreditam só para poderem fechar o negócio. Um erro desses pode dar-vos hipóteses no início, vindo depois a revelar-se fatal."
Charlotte destaca, por outro lado, o período da sua mudança para Los Angeles. "Fui sozinha à procura de uma carreira. Podia ter corrido muito mal."
O erro não está, no entanto, nessa mudança. Está no que fez depois dela: "trabalhei com empresas às quais hoje não daria a mínima hipótese, seja pelo tipo de trabalho ou pela forma de atuar das empresas e pelos valores que defendem", explica a modelo.
A maior falha é, no entanto, uma que tem vindo a tentar corrigir. "Não deixem que passe demasiado tempo entre a vossa última publicação e a mais recente. Isso faz com que os seguidores se esqueçam que vocês existem. É preciso manter o contacto, nem que seja com uma pequena story no Instagram a mostrar que ainda mexem", diz.
Pagar por seguidores dá lucro no final?
Seja no Twitter, Facebook, Instagram ou Snapchat, elas existem por todo o lado. Contas pagas para seguir uma certa página, uma espécie de seguidores instantâneos.
Karbasfrooshan lança a pergunta: "eles não acabam por ir embora? Quer dizer, o dinheiro (para lhes pagar) não é infinito, certo?"
O líder da WatchMojo explica que o YouTube, onde a sua plataforma de conteúdos concentra o seu trabalho, "não sofre disso... Já o Facebook, credo."
"De vez em quando há umas limpezas no Twitter e no Instagram, notam-se bem nos números, mal se notam nas interações", completa Charlotte.
"Não são esses seguidores que nos vão divulgar ou defender. Muito menos vão comprar os nossos produtos", acrescenta Karbasfrooshan.
Qualidade ou quantidade?
É uma velha questão, que se aplica a quase tudo e agora também ao conteúdo online: quantidade ou qualidade?
"Passamos horas a criar conteúdo. Na web há lixo aos montes, é preciso encontrar um espaço que tire de lá as pessoas e as traga para o que produzimos". Resposta simples do líder da empresa de vídeo para uma questão aparentemente complexa.
Charlotte concorda, a qualidade deve estar sempre acima da quantidade. "Não sei se isso me magoa ou não, mas é nisso que acredito", explica.
Os perigos da exposição online
A carreira de Charlotte obriga-a a expor-se mais do que o habitual, algo a que já se acostumou. O problema são os stalkers (perseguidores).
"Há casos que podem chegar a ser de polícia. Felizmente nunca me aconteceu nada de tão grave, mas sei que me exponho a isso", explica a modelo, acrescentando que isso lhe dá "uma certa ansiedade".
Para combater isto, deixa um conselho prático: "sei que as pessoas gostam de saber onde vou, que locais frequento. Eu dou-lhes isso, mas tenho uma regra. Só publico a localização do sítio onde estive quando saio de lá e só publico geotags, nunca exponho a localização exata.
Com 20 segundos para o final, fica a pergunta: como se cria uma carreira online?
"Não façam isto pelo dinheiro, façam pelo caminho. Disponham de quatro a cinco anos", dizia Karbasfrooshan antes de ser interrompido por um entusiasta e sincero "sejam autênticos!" de Charlotte.
Ambos concordaram. Depois disto, saíram do palco. E, provavelmente, do mundo real.