A comunidade Avieira de Vila Franca de Xira, de pescadores e descendentes da Praia da Vieira de Leiria, queixa-se da falta de peixe e responsabiliza a poluição do rio por esta escassez.
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Por esta altura do ano, já deveria estar a pescar-se sável em maior quantidade e as lampreias são praticamente inexistentes.
Já a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira alega que fez tudo o que estava ao seu alcance para despoluir o rio Tejo, com a construção de Estações de Tratamento de Águas Residuais, e que a poluição começa a montante.
Já lá vai o tempo em que viviam em casas de madeira. Hoje, batem a porta das modestas casas de alvenaria, bem cedo para pescar no Tejo.
Houve tempo em que dois dias de pesca, nesta altura do ano, traziam peixe para dois meses de sustento. Agora, há dias em que nem vale a pena sair. "Por exemplo, chegava a altura da enguia, quando chegávamos à noite tínhamos muito esforço de trabalho, mas sabíamos que tínhamos o dia ganho. Agora, há dias em que ganhamos para o pão, mas há outros em que nem para a gasolina dá", garante.
Ana Miranda e José Vicente Guerra são um casal de pescadores avieiros, as suas famílias vieram de Vieira de Leiria, procurar no Tejo o sustento. Queixam-se da falta de peixe e culpam a poluição do rio: "Peixe pouco, derivado à poluição que o rio tem. Têm aparecido linguados, mas não em grande quantidade. A lampreia está mesmo escassa e era com ela que ganhávamos algum dinheiro para a subsistência".
Albertino Lobo, também pescador, concorda. "Sável pouco, enguia muito pouca, lampreia pouca. Acho que tem a ver com a poluição e com o ambiente".
A pesca avieira no rio Tejo, dizem os pescadores, tem sido esquecida. Faltam os apoios e o acompanhamento a quem ainda tenta colocar peixe fresco do rio, diariamente nos mercados. "Nós fomos esquecidos, nunca vivemos com condições, fomos criados sem apoios".
Faltaram-lhe as palavras, mas o que Albertino Lobo queria dizer era a expressão "sem rei nem rock". Na comunidade avieira partilham-se os centros de convívio, qualquer rua tem mesas e cadeiras para confraternizar, e é aqui que se partilha também a amargura do dia-a-dia e da perspetiva futura.
"Os mais novos seguiram por outros caminhos. Como isto está tão escasso de peixe que não sabemos se daqui a dez ou quinze anos vai haver continuidade, porque não haverá peixe para as pessoas sobreviverem", sentencia.
Confrontado com este cenário, Alberto Mesquita, presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, garante que as águas do Tejo estão melhor em termos ambientais, mas reconhece que há ainda trabalho a fazer. "Tem a ver com as ETAR que construímos. O saneamento é tratado antes de ir para o Tejo, o que não acontecia no passado. Mas, há trabalho a fazer a montante".
O autarca acrescenta que tem havido uma atitude de defesa do rio Tejo, mas reconhece que existe um problema e sinaliza-o: "Insisto que aqui é menor que em outros locais do rio Tejo, nomeadamente na zona de Vila Velha de Rodão. A indústria é essencial, mas têm de ser amigas do ambiente e da população".
Uma situação a resolver: enquanto a poluição descer a favor da corrente, pelo menos os pescadores da comunidade avieira de Vila Franca de Xira têm uma certeza, os peixes que vão rio acima contracorrente para desovar serão cada vez menos.
Navegabilidade do Tejo comprometida
O presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira considera ainda que é preciso olhar para o Tejo tendo em conta as suas potencialidades de navegabilidade. Que, segundo Alberto Mesquita, estão subaproveitadas. "Temos que voltar a ter condições para que as mercadorias passem pelo rio Tejo, as que vão para a nossa indústria, e depois de transformadas as que vão para todo o mundo, melhorando o ambiente através da diminuição do transporte rodoviário de mercadorias", salienta.
Mas, para que isso aconteça, Alberto Mesquita aponta que "é necessário que o Estado olhe para o rio Tejo da forma que já não olha há décadas, proporcionado o desassoreamento do rio".
O autarca de Vila Franca de Xira considera que existem sérios problemas por resolver no rio Tejo e dá o exemplo do Mouchão da Póvoa de Santa Iria: "Se não cuidarmos do mouchão rapidamente, resolvendo as questões da entrada de água, ficará perdido. O próprio mouchão pode desaparecer trazendo desequilíbrios tremendos nos outros mouchões", explica.
Pede urgência na criação de um plano para contornar estas questões. Alerta que até a náutica de recreio está condicionada no rio Tejo devido ao perigo de encalhar.
Diz também que a Câmara tem feito trabalhos no rio que não são da sua competência, como dragagens, mas alega que a obtenção de uma licença pode demorar cerca de três anos.