Só por desconhecimento se pode garantir que não há doentes por exposição ao amianto
Quercus lança projeto SOS Amianto para informar e aconselhar quem esteve ou está exposto a esta substância cancerígena.
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Sentada no sofá da sala, com a caixa dos medicamentos no colo, Catarina mostra os comprimidos um a um: "Tenho de os tomar todos os dias senão fico logo à rasca. Tenho falta de ar, canso-me muito, canso-me muito".
Aos 83 anos não é apenas a idade que lhe pesa. O cansaço e a falta de ar são fruto de uma asbestose, uma doença respiratória provocada pela inalação prolongada de fibras de amianto.
Durante 30 anos esta antiga moldadora numa fábrica de fibrocimento em Alverca esteve exposta todos os dias a poeiras e fibras de amianto sem qualquer tipo de proteção. "Nem luvas, nem máscara, naquela altura não se falava nisso", garante.
Em 1984, além da reforma, trouxe para casa esta doença profissional partilhada pela maioria dos colegas. Desde então nunca mais largou os médicos e é seguida com frequência no Hospital Pulido Valente em Lisboa.
Pelas contas da Organização Mundial da Saúde, todos os anos há cerca de 30 mil novos casos na Europa de problemas respiratórios provocados pelo amianto. A maioria são doenças silenciosas, que se manifestam largos anos depois da exposição à substância, e que podem levar à morte.
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Para informar e aconselhar quem esteve ou está exposto a esta fibra cancerígena, a Quercus lança esta quinta-feira o projeto SOS Amianto. A coordenadora, Carmen Lima, explica que o principal desafio é traçar um retrato real do problema.
"Parece que em Portugal ninguém adoece por exposição ao amianto porque simplesmente se desconhece quem adoeceu. Muitas destas doenças não estarão identificadas como doenças profissionais e as pessoas poderão não estar a ter o acompanhamento devido e a isenção de taxas a que têm direito."
A associação ambientalista lembra ainda ao Governo que é urgente divulgar uma lista atualizada dos edifícios públicos, como escolas, com materiais que contêm amianto: "Temos vários funcionários públicos e alunos expostos. Não temos noção, em Portugal, da quantidade de materiais que incorporaram amianto e da quantidade de pessoas que estiveram ou estão expostas", nota Carmen Lima.
A Quercus promete ainda informação jurídica às vítimas que avancem com pedidos de indemnização e lembra o caso do Brasil, onde há registo de vários processos que chegaram a tribunal.
Em Portugal, apesar de estar proibido desde 2005, o amianto continua presente em muitos edifícios e materiais de construção, como o fibrocimento. O problema vai estar em debate no 1.º Encontro Internacional sobre Amianto, que decorre amanhã e sexta-feira no Instituto Superior Técnico em Lisboa.