Diretora europeia da Oceana alerta que "todos os stocks de bacalhau em águas da União Europeia" são capturados acima do limite de sustentabilidade
A diretora europeia da Oceana afirma que a UE "já deveria ter acabado com a sobrepesca em 2020", como exige a Política Comum das Pescas, mas ainda acontece. Vera Coelho reconhece que "há sinais de recuperação em várias espécies", que resultam das políticas da UE, mas a "realidade" mostra que os ministros dos 27 "decidem todos os anos pescar de forma excessiva alguns stocks".
No Atlântico Nordeste, cerca de "30% dos stocks continuam sobre-explorados", enquanto no Mediterrâneo, segundo os dados da Oceana, o número ultrapassa a metade das espécies avaliadas.
Em entrevista ao programa da TSF Fontes Europeias, quando falta uma semana da decisão anual sobre os totais admissíveis de captura para a próximo ano, Vera Coelho admite que o volume total de capturas é "maioritariamente sustentável". No entanto, sublinha que os stocks mais pequenos, sujeitos a pressão excessiva, "continuam a ser explorados e não conseguem atingir um volume maior".
Entre os exemplos mais graves, destaca o bacalhau. "Todos os stocks de bacalhau em águas da União Europeia estão sobre-explorados". Vera Coelho salienta que, ao contrário do passado, em que a pesca do bacalhau sustentava comunidades pesqueiras no Báltico, no Mar do Norte ou no Mar da Irlanda, passou a ser considerada "captura acessória", devido à escassez.
Questionada sobre eventuais limitações ao consumo do bacalhau, Vera Coelho responde que este "deve ser sempre gerido de forma responsável", lembrando que Portugal depende de importações. "Setenta por cento do pescado consumido na UE é importado", frisa, defendendo que o mercado europeu deve excluir peixe capturado ilegalmente ou em condições laborais abusivas.
"Estima-se que cerca de um em cada cinco peixes disponíveis no mercado possa provir de pesca ilegal ou não declarada", afirma a diretora-executiva da Oceana, salientando ainda que há "casos bastante bem documentados de trabalho forçado" na frota chinesa que "fornece espécies que são depois exportadas para a Europa".
Fiscalização
Vera Coelho destaca que há meios tecnológicos que "permitem de forma fácil e barata acompanhar os movimentos das embarcações de pesca", mas a instalação dos meios, que permitiriam uma fiscalização mais eficaz, não é feita com a rapidez necessária.
O Regulamento de Controlo Europeu já prevê a instalação obrigatória de sistemas de monitorização, que serão estendidos às pequenas embarcações até 2029. O custo é baixo, "menos do que um iPhone", salienta a diretora-executiva da Oceana, defendendo financiamento da UE para a instalação dos dispositivos que permitiriam "aumentar a transparência e também a segurança" dos pescadores.
Legislação
Na entrevista é ainda abordado o Pacto para os Oceanos, anunciado pela Comissão Europeia na Conferência da ONU sobre Oceanos, em Nice, em 2023. A iniciativa prevê uma nova lei do oceano. A proposta deverá basear-se na diretiva de ordenamento do espaço marítimo, passando a incluir "objetivos de gestão sustentável do oceano e de conciliação das diferentes atividades humanas". A responsável avisa que o pacto só será relevante se evitar tornar-se "mais um documento que vai parar às gavetas".
A Oceana defende que a futura lei incorpore compromissos internacionais, como a proteção de 30% das águas até 2030. A atual situação é, para Vera Coelho, "preocupante". "Temos menos de 15% da área marítima europeia designada como área marinha protegida", e a maior parte "não passa apenas de linhas traçadas num mapa", sem plano de gestão e, em alguns casos, permitindo "arrasto de fundo ou exploração de gás e petróleo", lamenta.