Mundo

Amnistia denuncia «limpeza étnica» de muçulmanos na República Centro Africana

Bangui, República Centro Africana Reuters/Emmanuel Braun

Um relatório divulgado hoje pela Amnistia Internacional revela que, desde o início de janeiro, está a acontecer uma «limpeza étnica» de muçulmanos na zona ocidental da República Centro Africana.

Uma delegação da organização de defesa dos direitos humanos passou duas semanas no país a investigar assassínios, deslocamentos forçados, destruição de casas e propriedades, saques e outros abusos, alguns dos quais considerados crimes de guerra e contra a humanidade, ocorridos durante o mês de janeiro e no início de fevereiro.

A República Centro Africana (RCA) mergulhou no caos desde que em março de 2013 a coligação Séléka, de maioria muçulmana, derrubou o governo do país maioritariamente cristão, desencadeando uma espiral de violência sectária, que já causou milhares de mortos e centenas de milhares de deslocados.

A delegação da Amnistia Internacional (AI) falou com «centenas de vítimas de violência» e «documentou ataques repetidos e em larga escala das milícias 'anti-balaka' contra civis muçulmanos em Bouali, Boyali, Bossembélé, Bossemptélé, Baoro, Bawi e na capital Bangui».

Alguns dos ataques foram realizados como represália a ataques anteriores a civis cristãos por parte dos rebeldes Séléka e de muçulmanos armados, indica o relatório intitulado "Limpeza étnica e assassinatos sectários na República Centro Africana", que refere ataques a cristãos em Bata e Baoro.

«Pelo menos 200 muçulmanos foram mortos e centenas de outros ficaram feridos nos ataques de 'anti-balaka' documentados pela AI e um grande número de cristãos foi morto em ataques de represália», adianta o relatório.

Segundo a organização com sede em Londres, «além de causar morte e destruição, os ataques contra os muçulmanos foram realizados com a intenção declarada de deslocar à força essas comunidades».

A AI considera que a missão da União Africana na RCA (Misca) e as forças francesas da operação 'Sangaris' «têm sido lentas a preencher o vácuo de poder criado em meados de janeiro, quando o presidente interino Michel Djotodia se demitiu e a Séléka começou a retirar».

«A urgência da situação exige uma resposta forte e imediata», defende a organização, que recomenda que as forças internacionais tomem «medidas rápidas», impedindo que as milícias "anti-balaka" controlem a rede rodoviária da RCA e destacando tropas suficientes para as cidades onde os muçulmanos são ameaçados.

A Amnistia alerta ainda para um «possível surto de violência sectária» em cidades a norte e a leste de Bangui, onde as forças Séléka se estão a reagrupar. «Para responder a estes desafios, as forças internacionais de manutenção da paz deverão ter os recursos necessários», recomenda a organização.

Aconselha ainda a nova presidente interina, Catherine Samba Panza, a ter como prioridade a desmobilização e desarmamento das milícias "anti-balaka" e dos combatentes Séléka, bem como a garantir que as forças armadas ou a polícia da RCA não integrarão qualquer suspeito de envolvimento em abusos dos direitos humanos e que estes serão investigados e julgados de modo independente e justo.

A AI recomenda igualmente à comunidade internacional, em particular à União Africana, às Nações Unidas e à União Europeia, que comecem imediatamente a preparar uma eventual transformação da Misca numa operação de manutenção da paz da ONU.

Lusa