Centeno insiste: governador cometeu "falha grave de transmissão de informação"
O ministro das Finanças carrega na ideia que o governador do Banco de Portugal cometeu uma "falha grave de transmissão de informação". Carlos Costa defende-se usando como escudo as regras do BCE.
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"É de facto surpreendente que não tenha sido transmitida na altura devida, no meu entendimento, do Ministério das Finanças e do Governo, aquela informação", afirmou Mário Centeno em entrevista à RTP, em Washington, transmitida no Telejornal.
O ministro das Finanças reiterou a acusação do Governo de que o BdP cometeu uma "falha de informação grave" na resolução do problema do Banco Internacional do Funchal (Banif), ao ter omitido que pediu ao BCE para limitar o financiamento àquela instituição financeira.
"Nesse sentido, é uma falha grave que nós reputamos de falha grave de transmissão de informação", disse o ministro.
Reacção do Banco de Portugal
Já esta tarde, mas ainda antes de ter sido emitida a entrevista ao ministro das Finanças, o Banco de Portugal emitiu um novo comunicado com "esclarecimentos adicionais".
A instituição liderada por Carlos Costa argumenta que as regras impedem que os bancos centrais divulguem aos executivos nacionais as decisões tomadas no Conselho de Governadores do Banco Central Europeu (BCE).
"Os membros do Conselho do BCE não podem, por imposição das normas do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do seu Código de Conduta, divulgar ou discutir previamente com as autoridades nacionais as questões a decidir pelo Conselho, nomeadamente as questões que digam respeito ao exercício do mandato do BCE em matérias de política monetária", lê-se no texto do supervisor bancário português.
Face a estas declarações, a entidade liderada por Carlos Costa sublinhou que "a confidencialidade dos documentos preparatórios e das propostas a discutir no Conselho é uma condição inseparável do princípio da independência estabelecido no artigo 130.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia".
E realçou: "A divulgação dos elementos preparatórios das reuniões abriria, por definição, o caminho a eventuais pressões externas e criaria um risco manifesto para o processo decisório do Conselho e para a independência dos seus membros".
Segundo o BdP, tal também "criaria um risco de divulgação de informação para o mercado, dada a sensibilidade das decisões tomadas pelo BCE na esfera da política monetária".
Demissão do governador?
Ainda na entrevista à RTP, o ministro das Finanças foi questionado sobre uma eventual demissão do governador do Banco de Portugal. Mário Centeno salientou que há uma "comissão de inquérito a avaliar a situação".
"Esperarei que a comissão de inquérito identifique todas as situações", afirmou, insistindo que nunca teve nenhuma atuação no sentido de privilegiar qualquer solução.
O primeiro-ministro, António Costa, também rejeitou hoje alinhar com a exigência de demissão de Carlos Costa, feita pelo Bloco de Esquerda durante o debate quinzenal no parlamento, alegando que recusa antecipar as conclusão da comissão parlamentar de inquérito sobre o Banif e que deve haver normalidade no relacionamento institucional.
A Comissão Parlamentar de Inquérito ao processo que conduziu à venda e resolução do Banif decidiu voltar a ouvir o ministro das Finanças e o governador do Banco de Portugal na terça-feira.
Solução para o crédito malparado da banca
Sobre o "veículo", defendido pelo primeiro-ministro, para resolver o problema do crédito malparado, Mário Centeno afirmou que "ainda está a ser delineado". "É uma matéria muito sensível", disse.
Nas declarações à RTP, Mário Centeno disse também que não podia garantir que não houvesse mais encargos para os contribuintes com a banca.
"Nunca ninguém consegue garantir isso. Queria ser muito claro nessa matéria porque não vale a pena estarmos a fingir que estamos a viver num mundo em que não estamos", afirmou.
Segundo o ministro, o Governo tem é de atuar com a "maior antecipação possível para que os problemas não ganhem a dimensão que outros em outros momentos ganharam".
Esta tarde, e sobre este tema, a TSF avançou a notícia de que Carlos Costa enviou, há duas semanas, uma carta aos outros governadores de bancos centrais em que pedia que se discutisse a criação de um veículo financeiro para limpar a banca portuguesa de crédito malparado.