Miranda Sarmento avisa que receita do negócio das barragens da EDP é temporária

O ministro de Estado e das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento
António Cotrim/Lusa
"Se eventualmente houver essa receita, eu espero que ninguém se lembre de financiar despesas estruturais - que se mantém durante muitos anos - com uma receita que, a acontecer, acontece uma vez", explicou Joaquim Miranda Sarmento
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O ministro das Finanças avisou esta sexta-feira que os 335,2 milhões de euros a arrecadar pelo Estado com a venda de seis barragens da EDP à Engie são receita temporária, que não deve servir para financiar despesa estrutural.
Durante uma audição no parlamento no âmbito da apreciação na especialidade do Orçamento do Estado para 2026 (OE2026), Joaquim Miranda Sarmento foi confrontado pela bancada do Chega sobre declarações que fez esta semana sobre a cobrança da receita pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), por ter dito ser extemporâneo contar com impostos "nos próximos anos".
Para clarificar o que disse na quarta-feira, Miranda Sarmento explicou ter sido questionado sobre a cobrança da receita em 2026 - uma vez que a AT tem um ano para liquidar os impostos em falta -, esclarecendo que "mesmo que a autoridade tributária liquide, qualquer contribuinte tem o direito a litigar e prestar garantia", pelo que "não é líquido" que a receita entre nos cofres públicos em 2026.
"Pode entrar entre 2026 ou pode entrar em 2027 ou em 2028 ou em 2029, dependendo daquilo que o contribuinte decidir [fazer]", disse.
Em todo o caso, o ministro diz que esta receita deve ser sempre encarada como temporária, porque depende de uma operação económica que não se repete.
"Se eventualmente houver essa receita, eu espero que ninguém se lembre de financiar despesas estruturais - que se mantém durante muitos anos - com uma receita que, a acontecer, acontece uma vez", explicou.
"Aquela transação ocorreu uma vez, poderá dar efeito a pagar impostos. Poderá haver uma receita em 2026 naquele montante, mas é uma receita temporária. Espero que ninguém no parlamento se lembre de financiar despesa estrutural com uma receita que ocorreu apenas uma vez", insistiu.
A equipa do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que investigou a operação em conjunto com inspetores da AT concluiu que o negócio não teve contornos criminais (tendo em consideração que as autoridades tinham dele conhecimento).
O Ministério Público acabou por arquivar as suspeitas da prática de crime de fraude fiscal, mas entendeu que a forma como a operação de venda ocorreu, através de uma cisão seguida de uma fusão, não isenta a EDP do pagamento de 335,2 milhões de euros, entre Imposto do Selo, IMT e IRC, acrescido de juros.
Em resposta à bancada do PSD, o ministro das Finanças reafirmou que o Governo não foi notificado da decisão - e que não tinha de o ser - e sublinhou que, se as noticias vindas a público se confirmarem, a Autoridade Tributária tem um ano para cumprir a ordem do Ministério Público e liquidar os impostos em falta.
Na quinta-feira, o presidente executivo da EDP disse que o grupo ainda não tinha sido notificado da decisão do Ministério Público e garantiu que "pagará os impostos que forem exigidos", embora "reserve o direito de decidir em função daquilo que vier a ser determinado".
A investigação foi dirigida pelo Ministério Público, tendo contado com a participação de inspetores tributários enquanto órgãos de polícia criminal.
Nesse âmbito, embora afastando as suspeitas de crime fiscal, as procuradoras do DCIAP consideraram que os contornos da transação implicam ao pagamento de impostos e, por isso, determinaram que a AT deve "proceder à cobrança dos impostos em falta e que não foram pagos", lê-se na parte final do despacho a que a Lusa teve acesso.
Ao todo, o MP calcula que o Estado tem a receber 120,9 milhões em Imposto do Selo, 99,6 milhões de euros em IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) e 114,7 milhões de euros em IRC.
O negócio investigado diz respeito à venda das barragens de Miranda, Bemposta, Picote, Foz Tua, Baixo Sabor e Feiticeiro, que a elétrica portuguesa alienou no final de 2020 e início de 2021 por 2.200 milhões de euros a um consórcio francês da Movhera, formado pelas empresas Engie (40%), Crédit Agricole Assurances (35%) e Mirova - Grupo Natixis (25%).
