"Rezei a Deus para que o atirador ficasse sem balas." O ataque que fez 49 mortos na Nova Zelândia
Quatro suspeitos foram detidos, um está a ser acusado por homicídio. Trata-se de um extremista de direita, 28 anos, que escreveu um manifesto anti-imigrantes.
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Pelo menos 49 pessoas morreram e 48 ficaram feridas no ataque às mesquitas de Linwood Masjid e de Al Noor, perto de Hagley Park, na Nova Zelândia.
Os ataques tiveram início às 13h40 (00h40 em Lisboa). Todas as mesquitas estão, por agora, encerradas.
O comissário de polícia da Nova Zelândia, Mike Bush, adiantou que a polícia desativou uma série de engenhos explosivos improvisados encontrados num veículo após o tiroteio numa das mesquitas, em Christchurch.
A polícia neozelandesa encontra-se agora na cidade de Dunedin, no sul do país, que diz ser um "local de interesse" para as investigações do atentado terrorista. As autoridades isolaram a área e estão a evacuar as habitações, encaminhando os moradores para alojamento alternativo.
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Três homens e uma mulher foram detidos, nenhum deles se encontrava referenciado pelas autoridades. Em conferência de imprensa, o comissário da polícia neozelandesa Mike Bush acrescentou que, entretanto, um dos homens foi acusado de homicídio e vai ser presente a tribunal pelos ataques.
Atacante transmitiu atentado nas redes sociais
O primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, revelou que o atirador é um cidadão australiano, descrevendo-o como "um extremista de direita e um terrorista violento". Brenton Tarrant, de 28 anos, reivindicou a responsabilidade pelos disparos e deixou um manifesto anti-imigrantes de 74 páginas, no qual procurou justificar as ações.
No documento, o atacante explica que começou a planear o atentado terrorista depois de ter visitado a Europa, há dois anos. O australiano ficara enfurecido com os ataques perpetrados por militantes do Estado Islâmico, em particular na Suécia, e com a diversidade cultural existente em França.
O manifesto defende que "os europeus" estão a morrer e a ser "substituídos" por imigrantes com uma cultura inferior e perigosa. A conspiração é o centro de um vasto grupo de fóruns na Internet.
No documento, Tarrant garante que não era a fama que o motivava a levar a cabo o ataque e mostra a intenção de sobreviver ao acontecimento, esperando espalhar o medo. A mesquita de Al Noor tinha sido escolhida como alvo há três meses.
O atentado terrorista foi transmitido em direto pelo próprio atirador, nas redes sociais.
O vídeo, cuja autenticidade ainda não foi comprovada, mostra o homem a conduzir até uma mesquita, entrando na mesma e abrindo fogo sobre as pessoas que se encontravam lá dentro. As imagens mostram ainda corpos das vítimas amontoados no chão.
O Facebook, o Instagram, o Twitter e o YouTube já anunciaram que estão a eliminar as publicações feitas pelo atirador.
"A polícia alertou-nos, pouco depois do livestream ter começado, e rapidamente removemos o vídeo das contas de Facebook e Instagram do atirador", esclareceu a empresa. "Também vamos remover [destas redes sociais] qualquer manifestação de apoio ao crime aos atiradores", acrescentou.
O Twitter indicou que tem "processos rigorosos e uma equipa dedicada a gerir situações de emergência" como esta.
Já o YouTube garantiu que está "a trabalhar vigilantemente para remover quaisquer imagens violentas".
Os relatos de quem sobreviveu ao ataque
Na imprensa internacional, surgem relatos de várias testemunhas do ataque terrorista.
Mohan Ibrahim, que escapou ao tiroteio trepando por uma janela da mesquita, relatou à CNN que foram "10 a 15 minutos seguidos de tiros".
Outro homem contou, à saída da mesquita, que estava a rezar para que o atirador ficasse em balas.
"Estava a pedir a Deus, por favor, que fizesse com que ele ficasse sem mais balas", disse o homem, que conseguiu esconder-se e escapar.
Mohan Ibrahim, um imigrante que está a estudar na Nova Zelândia, conseguiu sair da mesquita, mas diz não acreditar no que os seus olhos viram.
"Nunca imaginei ver com os meus olhos as coisas que vi hoje. Montes de pessoas que eu conheço, com quem estou regularmente na mesquita, já cá não estão", lamentou.
"Vivo cá há cinco anos e sabia que a Nova Zelândia era um dos países mais seguros do mundo, mas agora estou tão assustado", admitiu.
Carl Pomare, que estava passar de carro por uma das mesquitas, relatou ter visto várias pessoas a correr pela vida, e depois começar a ouvir tiros. "Vi as pessoas a serem atingidas pelas costas e a caírem ao chão", contou à BBC.
Entre os sobreviventes estão também os membros da seleção nacional de críquete do Bangladesh, que estava na Nova Zelândia para disputar uma partida no próximo domingo (que, entretanto, foi cancelada). A equipa estava prestes a entrar na mesquita junto Hagley Park, quando a tentado começou.
"Tivemos muita sorte. Se tivéssemos chegado três a quatro minutos antes, estaríamos dentro da mesquita durante o ataque", disse o responsável pela equipa, Khaled Mashud.
"Toda a equipa está salvo dos atiradores", revelou um dos jogadores no Twitter.
"[Os jogadores] estão a salvo, mas estão mentalmente em estado de choque. Pedimos à equipa que não saísse do hotel", afirmou o porta-voz da seleção.
O nível de ameaça à segurança nacional foi entretanto elevado para alto, mas o ataque está fazer soar campainhas fora da Nova Zelândia. Outras cidades estão já a reforçar a segurança junto aos edifícios religiosos.
O presidente da câmara de Londres, no Reino Unido, anunciou que vão estar polícias armados nas imediações das mesquitas.
Também o ministro francês do Interior, Christophe Castaner, declarou que vão ser reforçadas as patrulhas de segurança em redor dos locais religiosos de França, "por precaução".
Em Nova Iorque, foi reforçado o dispositivo policial junto às mesquitas. "A Polícia de Nova Iorque está comprometida em salvaguardar a segurança de todos e a liberdade de praticarem a sua religião livremente sem qualquer medo", referiu na sua página de Twitter.
"A nossa cidade mudou para sempre"
A Câmara dos Comuns da Nova Zelândia anunciou que será feito, ainda esta sexta-feira, um minuto de silêncio em memória das vítimas.
"Não há lugar na Nova Zelândia para atos desta violência extrema e sem precedentes", declarou a primeira-ministra neozelandesa, que considera que os ataques foram planeados durante bastante tempo.
O vice-primeiro-ministro neozelandês, Winston Peters, disse que o ataque marca o "fim da idade da inocência" na Nova Zelândia.
"Vimos o que acontecera quando terroristas atacaram outros países, mas nunca, embora nos tenhamos preparado, imaginámos que pudessem acontecer desta forma na Nova Zelândia", notou. "A verdade é que nunca soubemos o que era este nível de terror".
Winston Peters adiantou que as leis de controlo de armas terão de ser revistas, assim como o controlo de segurança e de fronteiras do país.
Também a autarca de Christchurch, Lianne Dalziel, classificou o ataque como "devastador" e afirmou que aquela cidade nunca mais será a mesma. "Agora é tempo de tolerância e compreensão", declarou Dalziel, em comunicado.
Christchurch é a maior cidade da Ilha Sul da Nova Zelândia e a terceira maior cidade do país com cerca de 376.700 habitantes, localizada na costa leste da ilha e a norte da península de Banks. É a capital da região de Canterbury.
Assembleia da República aprovou voto de pesar
O Parlamento português aprovou, esta sexta-feira, por unanimidade, um voto apresentado pelo presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, de pesar e condenação pelo atentado em duas mesquitas de Christchurch, Nova Zelândia, que causou pelo menos 49 mortos.
Eduardo Ferro Rodrigues já tinha enviado uma mensagem de "pesar e solidariedade" ao seu homólogo neozelandês, Trevor Mallard, pelos "ataques terroristas odiosos", ato que classificou de "repugnante e horrível".
"Aqueles atos tão bárbaros foram premeditados para terem lugar a uma sexta-feira, quando as comunidades islâmicas enchem as mesquitas para rezarem em paz a sua oração semanal", destaca, no texto hoje aprovado.
Na mensagem ao seu homólogo e no texto do voto, o presidente da Assembleia da República defende ainda que "a repulsa" causada por estes ataques "é também uma convocação à reflexão sobre as causas do terrorismo", "à necessidade de o combater" e de defender os valores de liberdade, paz e democracia.
(Notícia atualizada às 15h27)
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