Há cem anos, a vitoriosa insurreição bolchevique abalou o mundo ao propor uma nova ordem social.
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Cem anos depois de os bolcheviques terem cercado a capital russa, os comunistas encheram a Praça Vermelha e deixaram flores no mausoléu de Lenine, mas a efeméride quase passa despercebida, com o Kremlin focado em evitar polémicas.
A Revolução de Outubro de 1917, assinalada esta terça-feira, derrubou a autocracia russa e levou ao poder o Partido Bolchevique, de Vladimir Ilitch Ulianov, Lenine, depois de, entre fevereiro e outubro desse ano, se terem realizado dezenas de manifestações populares que fizeram o czar Nicolau II renunciar, e viriam a dar origem à União Soviética (1922) - a primeira confederação de estados socialistas do mundo, que perdurou até 1991.
A 25 de outubro (do calendário juliano, usado pela Rússia antes de 1918), 7 de novembro no calendário gregoriano, os bolcheviques tomam o Palácio de Inverno e os principais centros de poder. Após a partida de mencheviques e socialistas-revolucionários, o II Congresso pan-russo dos sovietes legitima um governo exclusivamente bolchevique.
Elege-se o da Assembleia Constituinte, dominada pelos socialistas-revolucionários, divididos em duas tendências, com a fação de esquerda a solidarizar-se com a revolução. Os bolcheviques obtêm 175 dos 703 lugares.
O novo poder começa por anunciar uma paz separada com a Alemanha e Áustria-Hungria e decreta a abolição da grande propriedade. Segue-se a expropriação das empresas industriais, dirigidas por comités de trabalhadores, e o princípio das oito horas de trabalho diário. Os bancos são nacionalizados em dezembro.
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O ano acaba com o início da guerra civil, com a formação de um exército contrarrevolucionário "branco" no sul do país, depois apoiado por mais de dez contingentes militares estrangeiros que intervêm na Rússia para derrubar o poder bolchevique. O sangrento conflito termina em 1922 com a tomada de Vladivostok pelo Exército Vermelho.
Durante o período soviético, o 7 de novembro era assinalado com feriado nacional e uma das maiores celebrações do ano. Na Rússia atual, contudo, este é um dia de trabalho normal. O feriado foi movido para 4 de novembro, designado "Dia da Unidade Nacional".
O centenário foi assinalado com algumas dezenas de iniciativas, centradas no signo da "concórdia nacional" para evitar "ódio e ressentimentos" ligados ao passado.
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A reconstituição do assalto ao Palácio de Inverno, em Petrogrado, pelos bolcheviques, num espetáculo em 3D no atual Museu Hermitage de São Petersburgo, constituiu um dos pontos altos das celebrações oficiais.
Vladimir Putin apelou a uma "análise honesta" das causas e consequências das revoluções de fevereiro e outubro, para promover a "concórdia nacional" e evitar reacender "a discórdia, o ódio e o ressentimento ligados ao passado" ou exacerbar o debate na sociedade.
As efemérides, organizadas pela Sociedade de História da Rússia e que pretendem abranger o período entre 1917 e 1921, revelam a preocupação de "evitar polémicas", tendo sido excluídos do comité organizador representantes dos partidos políticos.
Assim, o centenário da revolução ficou quase limitado a debates e mesas-redondas entre historiadores "oficiais" - investigadores, professores, diretores de museu, cineastas, responsáveis pelos principais canais televisivos e representantes da igreja ortodoxa, que não esquecem a menção ao "terror vermelho".
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