Em Guayaquil, no Equador, a situação piora de dia para dia. A TSF ouviu quem ajuda a "organizar" os corpos que ficam abandonados nas ruas. Há apelos à ajuda internacional.
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O cacique "Guayas" e sua esposa "Quil" foram símbolos da resistência aborígene, que, diz o povo equatoriano, escolheram lutar até à morte, em vez de prestar vassalagem aos conquistadores espanhóis, que aqui chegaram em 1538, capitaneados por Francisco de Orellana. Independente desde 1820, centro de indústrias da pesca e de manufatura do país, Guayaquil é a segunda maior cidade do Equador, depois da capital, Quito. Fica na margem ocidental do rio Guayas, que dá nome à província e desemboca no golfo de Guaiaquil, no Oceano Pacífico.
Blanca Moncada Pesantes é jornalista do diário Expresso de Guayaquil, a cidade equatoriana que, por estes dias, é o epicentro da Covid-19 no país e que, sozinha, chega a ter mais caos do que vários países sul-americanos.
Guayaquil tem dois 2, 7 milhões de habitantes, mas, entre os que lá vivem e os que lá passam o dia a trabalhar, são mais do dobro: "Estima-se que o número seja perto de seis milhões de habitantes", diz-nos Blanca, sem deixar de teclar no computador e verificar que não está a faltar ao rigor que a profissão que abraçou exige.
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Guayaquil contava este domingo com 172 mortes pelo novo coronavírus, mas, tanto na cidade como no país, os números reais devem ser bem superiores, admitiu já o próprio chefe de estado do Equador, Lenin Moreno. A situação piora de dia para dia.
"O Equador é um país cheio de emigrantes que vivem em Espanha, Itália e Estados Unidos, em toda a parte. O Equador é um país que recebeu o vírus e recebeu o vírus em conjuntos habitacionais; em bairros ricos e pobres", refere Blanca Moncada, em entrevista por videochamada com a TSF.
Atualmente, existem cerca de 170 mortes de Covid-19, mas é importante esclarecer: são números oficiais que emergem dos testes do Governo a esse vírus. "Mas não são os números reais; de facto, como explicou o próprio Presidente da República, que já veio dizer que, obviamente, os números apresentados pelo Governo estão subnotificados e nem sequer estão próximos da realidade."
Em Guayaquil, há corpos abandonados pelas ruas. Durante vários dias. Alguns chegaram a estar uma semana, sem que ninguém os viesse levantar, ou sequer lhes tocasse. E os jornalistas da cidade "não conseguiam compreender o que estava a acontecer", dada a disparidade dos números apresentados pelo Governo.
"Os cadáveres ficavam na rua um, dois, três, cinco dias ou uma semana. E não entendíamos o que estava a acontecer. Há duas semanas, nós, os jornalistas de Guayaquil, começámos a receber relatos isolados de muitos casos. E as pessoas tentavam refutar, dizendo "é uma mentira, é um vídeo falso".
Blanca Moncada meteu mãos à obra. Agora, contacta todos os que denunciam a existência de cadáveres, confirma os casos, organiza os mortos na cidade. "Eu precisava de ter informações verdadeiras e havia essas informações em algumas das mensagens. Vi que muitas pessoas começaram a postar isso e a publicar nas redes: "Removemos um cadáver, o meu avô faleceu, o meu tio faleceu". E eu disse: "Vamos ver se isso está a acontecer", porque se vês muita informação sobre o tema, é porque algo aconteceu", conta.
O grande problema, na opinião da jornalista equatoriana, é que o sistema de saúde entrou em colapso em Guayaquil: "Mandam as famílias que têm infetados de volta para as suas casas e dizem-lhes: 'Bem, arranje alguma coisa, procure um ventilador' e as pessoas simplesmente vão embora do hospital assim. Agora, se fores ao Twitter e procurares "oxigénio em Guayaquil", perceberás quantas pessoas estão a pedir ajuda para que não deixem os seus parentes morrerem. E não são atendidas".
Blanca Moncada conseguiu visibilidade internacional para o problema e deseja que haja também resposta exterior ao apelo urgente que lança: "Penso que o Governo, neste momento, está numa encruzilhada e deve olhar para fora e suplicar por auxílio. Estamos a entrar num momento muito difícil para a cidade de Guayaquil e a única coisa que, de alguma forma, poderia aliviar isto seria a ajuda estrangeira. Não há o que é necessário para atender as pessoas, não há condições, há uma grande carência de pessoal de saúde. Eu penso que é hora de pedir ajuda."
O Presidente equatoriano já reconheceu que o país pode, muito rapidamente, chegar aos 3500 mortos.
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