Bombas de fragmentação "vão ser utilizadas contra as trincheiras militares russas"
Em declarações à TSF, Victor Ângelo diz que compreende a decisão tomada pelos Estados Unidos da América.
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O antigo secretário-geral adjunto da ONU, Victor Ângelo, compreende a decisão dos Estados Unidos da América de enviar bombas de fragmentação para a Ucrânia e acredita que essas serão utilizadas para atacar as forças militares russas e não contra a população civil.
"Estas bombas vão ser sobretudo utilizadas contra as trincheiras militares russas. E é isso que eu espero que venha a acontecer, que não sejam utilizadas em zonas civis. Aquilo que os russos tinham feito no início da agressão foi utilizar estas bombas indiscriminadamente, ou seja, em zonas habitacionais, em cidades, em localidades, etc. E isso, evidentemente, tinha um impacto muito grande sobre a mortalidade, nomeadamente dos civis", disse Victor Ângelo à TSF.
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Para o antigo secretário-geral adjunto da ONU, "se estas bombas foram utilizadas para tentar tratar as linhas defensivas russas, em certa medida, compreende-se a decisão dos Estados Unidos e o pedido feito pela Ucrânia", já que o país invadido "precisa de penetrar essas linhas de defesa que são extremamente sólidas e foram muito bem organizadas pelos russos e esta é uma das maneiras de fazer".
Victor Ângelo explica que estas munições fazem muitos danos colaterais numa vasta área: "As bombas de fragmentação, na verdade, dividem-se em várias pequenas bombas que depois vão explodir num raio relativamente vasto. Algumas vezes não explodem imediatamente, ficam por explodir e só acabam por explodir mais tarde, quando são tocadas ou manuseadas por alguém. Em 2008, houve uma série de países - pouco mais de uma centena - que considerou que este tipo de bombas deveria ser considerado ilegal e na realidade, neste momento há cerca de 110 países que consideram estas bombas como bombas não permissíveis. Mas também é verdade que países como a Rússia, os Estados Unidos e a própria Ucrânia não assinaram esta Convenção e, por isso, as podem utilizar tendo em conta que não são signatários desse acordo contra esta este tipo de bombas."
Os Estados Unidos, Rússia e Ucrânia não fazem parte do grupo dos 111 países signatários
da Convenção sobre Munições de Dispersão, que consideram ilegais as bombas de fragmentação. A França e a Alemanha assinaram o acordo e já se manifestaram contra o recurso a estas armas no conflito da Ucrânia. Portugal também ratificou a convenção, mas Victor Ângelo considera que será difícil o governo português assumir uma posição contra Joe Biden, a poucos dias da cimeira da NATO em Vilnius.
"Eu não sei qual vai ser a posição do Governo português. Não sei se o Governo português vai criticar o Presidente dos Estados Unidos, sobretudo nas vésperas da Cimeira da NATO. Consideração muito delicada. É preciso ter em conta que nós estamos a tratar de um de uma situação muito complexa, em que um país muito grande, com armamentos sofisticados, invadiu um país vizinho que não tem esse tipo de meios e, de repente, é preciso dar a esse vizinho que tem poucos meios a possibilidade de expulsar, digamos assim, os invasores, porque, na realidade, uma invasão de um território vizinho de um país vizinho é ilegal do ponto de vista da lei internacional. Por isso eu penso que Portugal irá, sobretudo, pôr o acento tónico na questão da lei internacional e na necessidade de fazer sair rapidamente os agressores do território ucraniano", considera.
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O secretário-geral da NATO já afirmou que a Aliança Atlântica não tem uma posição sobre o envio de bombas de fragmentação para a Ucrânia. Da ONU também não é esperada uma condenação. Victor Ângelo considera que as Nações Unidas não têm uma base firme para condenar a utilização destas bombas.
"Não há nenhuma decisão das Nações Unidas, nenhuma resolução, nenhum pronunciamento das Nações Unidas contra este tipo de bombas. O que há é, evidentemente, todo tipo de e declarações das Nações Unidas contra ataques que possam visar populações civis e isso é a questão fundamental. É, em que medida, nós estamos a utilizar bombas que vão ser utilizadas apenas em zonas em que se tem a certeza absoluta de que há apenas forças armadas do inimigo ou se vão utilizar essas bombas em zonas em que pode haver uma mistura, digamos assim, entre a população civil e a forças armadas. Neste caso seria muito mais complicado, mas eu não penso que as Nações Unidas tenham uma posição clara sobre a questão. Neste momento, não há condições para que as Nações Unidas façam uma declaração a condenar este tipo de decisão tomada pelos americanos", argumenta.
O presidente da Ucrânia já agradeceu aos Estados Unidos o fornecimento de munições de fragmentação. Numa publicação nas redes sociais, Volodymyr Zelensky diz que esta oferta é oportuna, ampla e muito necessária. Acrescenta ainda que a expansão das capacidades de defesa da Ucrânia vai permitir desocupar o território ucraniano e chegar à paz.