Cerca de 1,5 milhões de eleitores da península da Crimeia decidem hoje em referendo o regresso à Rússia, numa consulta já definida por Moscovo como «legítima».
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Seis décadas após a decisão unilateral do então dirigente soviético Nikita Khrushchev de anexar esta região tradicionalmente russa à Ucrânia, as respostas às duas questões colocadas aos eleitores da Crimeia no referendo de hoje podem definir por muito tempo as relações entre Rússia e ocidente.
«Aprova a reunificação da Crimeia com a Rússia como membro da federação da Rússia?»; «Aprova a restauração da Constituição da Crimeia de 1992 e o estatuto da Crimeia como fazendo parte da Ucrânia?», são as questões do referendo, onde se resume o dilema desta península com dois milhões de habitantes, na maioria de origem russa, superfície semelhante à do Alentejo e na origem da mais grave crise diplomática leste-oeste desde o final da Guerra Fria.
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No campo independentista e pró-russo, a ameaça «nazi» ou «fascista» foi invocada com frequência para atacar as novas autoridades de Kiev, que receberam um apoio inequívoco dos Estados Unidos e da União Europeia (UE) e já declararam o referendo «ilegal», apenas destinado a legitimar a «anexação» da Crimeia por Moscovo.
De novo, recorre-se à memória histórica e apela-se aos «sentimentos profundos», numa região com um turbulento século XX, que fazem regressar episódios ocorridos durante a guerra civil na Rússia soviética (1918-1921) ou recordar a colaboração de nacionalistas ucranianos antissoviéticos com a Alemanha de Hitler durante a Segunda Guerra Mundial.
«Em 16 de março, vamos escolher», foi a palavra de ordem dos apoiantes da secessão, que vai consumar-se três semanas após homens armados terem assumido o controlo do parlamento da região e instalado um governo pró-russo, na sequência do afastamento do Presidente ucraniano Viktor Ianukovitch em Kiev pelas forças da oposição "pró-europeia".
Num território habitado maioritariamente por 58,32% de russos, 24,32% de ucranianos (ambos de religião ortodoxa) e 12,1% de tártaros da Crimeia (muçulmanos), o desfecho da consulta não deverá surpreender, quando uma sondagem recente previa um "sim" esmagador à união com a Rússia.
O poder em Simferopol, apoiado pelos cerca de 30.000 soldados russos que terão entrado na Crimeia desde finais de fevereiro para manter sob controlo as unidades militares que se mantêm fiéis a Kiev, garantiram a «legitimidade e transparência» da consulta, apesar de no curto período de "campanha" não ter sido praticamente organizada nenhuma iniciativa em defesa do voto "não".
Cerca de 1.200 assembleias de voto vão estar abertas em toda a Crimeia entre as 08:00 (06:00 em Lisboa) e as 20:00 (18:00 em Lisboa). O resultado será validado se a taxa de participação ultrapassar os 50%.