Que documentos são estes? Quem os revelou? O que é a Mossack Fonseca? E o que são empresas offshore? O essencial para entender o caso dos "Documentos do Panamá".
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O que são os "Documentos do Panamá"?
São mais de 11 milhões de ficheiros (2,6 terabytes de dados) da base de dados da empresa Mossack Fonseca, uma firma de advogados com sede no Panamá que cria empresas offshore. Estes documentos revelam os esquemas usados por líderes mundiais e milionários para fugir ao fisco. São relevados dados de mais de 200 mil empresas e 140 políticos, entre os quais 12 atuais ou antigos chefes de Estado ou de Governo em mais de 200 países de todo o mundo. Entre os ficheiros que cobrem um período de quase 40 anos (1977 - 2015), estão emails, relatórios financeiros, comprovativos de transferências bancárias, passaportes e registos empresariais. O Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação fala de "uma das maiores fugas de informação de sempre".
O que é a Mossack Fonseca?
É uma firma de advogados com sede no Panamá. Um dos serviços que presta é incorporar empresas em paraísos fiscais, incluindo Suíça, Chipre ou as Ilhas Virgens britânicas. A Mossack Fonseca é a quarta maior firma mundial a gerir empresas offshore. Apesar de estar sediada no Panamá, a empresa tem operações em todo o mundo. De acordo com o site, trabalha em 42 países, onde tem 600 funcionários. A administração de riqueza é outro dos serviços prestados pela Mossack Fonseca.
O que são offshore?
Offshore ou paraíso fiscal. É um regime fiscal privilegiado, que não tributa os rendimentos (ou tem tributação insignificante). Por regra, não há transparência relativamente a disposições legais; há legislação ou práticas administrativas que não permitem uma eficaz troca de informações com outros governos; não há atividades económicas substanciais. As vantagens financeiras conseguidas em offshore não estão habitualmente disponíveis para todos os contribuintes.
Todas as empresas offshore são ilegais?
Tudo depende do objetivo. Este regime pode ser usado para fins ilegais (como lavagem de dinheiro, fraudes financeiras, instituições fantasma, evasão fiscal ou corrupção) ou legais (como proteção de património, trading e operações comerciais). Muitas vezes recorre-se a esta opção como forma de proteção em países com falhas de segurança nas contas bancárias. É também usado para grandes heranças.
Há portugueses envolvidos?
Para já, só é conhecido um nome: Idalécio de Castro Rodrigues de Oliveira. O empresário de Vouzela terá tido 14 empresas com sede nas Ilhas Virgens britânicas em áreas como minério, gás natural e exploração de petróleo. A venda dos direitos de exploração de um campo de petróleo no Benim à Petrobas acabou por envolver o empresário no caso Lava Jato. Em nome da empresa Lusitania Petroleum, Idalécio detinha várias licenças de exploração petrolífera em África.
Quem são os políticos envolvidos?
Para já, o mais mediático é Vladimir Putin. Um amigo do presidente russo, o violoncelista Sergei Roldugin, terá desviado mais de dois mil milhões de dólares (mais de 1.750 milhões de euros) com a ajuda de bancos e sociedades fictícias. A pista leva o dinheiro até uma estação de esqui onde em 2013 a filha de Putin casou.
Na lista de atuais e antigos líderes políticos está o primeiro-ministro paquistanês Nawaz Sharif, o ex-vice-presidente iraquiano Ayad Allawi, o presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, o filho do antigo presidente egípcio, Alaa Mubarak, ou o primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur Davíð Gunnlaugsson. Nesta lista aparece também o pai do primeiro-ministro David Cameron.
E que outras personalidades aparecem relacionadas?
A lista é grande e só será revelada na totalidade no final do mês de maio. Até agora, para além dos políticos, foi revelado o envolvimento do presidente da UEFA, Michel Platini, o futebolista Lionel Messi, o ator Jackie Chan ou o realizador espanhol Pedro Almodóvar. A estas figuras públicas juntam-se também criminosos identificados.
O que é que pode estar em causa?
Esta fuga de informação põe a descoberto líderes políticos, gestores e empresários influentes e bancos importantes que podem estar envolvidos em esquemas de corrupção, lavagem de dinheiro e fuga ao fisco. Há muita informação que ainda não é conhecida e, neste momento, não é ainda possível entender as implicações que terá. Certo é que o impacto será grande e já estão a surgir reações.
Que consequências está a ter?
O Ministério Público do Panamá decidiu abrir uma investigação ao conteúdo dos documentos. Também na Austrália, depois da divulgação, as autoridades estão a investigar 800 cidadãos por possíveis evasões tributárias.
Na Islândia, por causa da relação com o primeiro-ministro, a oposição já pediu a demissão imediata do governante. Questionado pelos jornalistas, Sigmundur Gunnlaugsson garantiu que nunca escondeu nada. "Estão a querer transformar uma coisa suspeita quando não há suspeitas". De acordo com primeiro-ministro, a empresa aparece depois de a mulher ter vendido parte de uma empresa. O dinheiro foi entregue ao banco, que o geriu desta forma. Na entrevista, acabou mesmo por abandonar a sala.
O presidente francês François Hollande elogiou a investigação, que diz ser "uma boa notícia", e garantiu que vão ser abertos inquéritos e pode haver processos judiciais. O porta-voz de Putin desmente a ligação do presidente. Fala num plano contra a Rússia que visa descredibilizar Vladimir Putin antes das eleições desta semana; "Putinofobia", diz.
Como é que os documentos foram tornados públicos?
Os vários ficheiros foram enviados por fonte anónima para o jornal alemão Süddeutsche Zeitung, que os partilhou com o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (International Consortium of Investigative Journalists). Mais de 370 jornalistas de 107 meios de comunicação em 78 países trabalharam durante um ano sobre estes "Documentos do Panamá". Os resultados desta investigação começaram a ser tornados públicos este domingo pelo Consórcio e pelos órgãos de informação parceiros. Em Portugal, o Expresso e a TVI24 são os meios que fazem parte dessa lista.
O que é o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação?
É uma rede global que junta mais de 190 jornalistas de investigação em cerca de 65 países. Estes profissionais colaboram em investigações de fundo. O projeto integrado no Centro para a Integridade Pública foi fundado em 1997 pelo jornalista norte-americano Chuck Lewis. Dedica-se essencialmente a casos com impacto internacional, guiando-se pelo princípio de que uma das principais funções do jornalista é a de fiscalização dos poderes; o jornalista watchdog, "cão de guarda" das liberdades e direitos dos cidadãos.