Itália vira à extrema-direita? "Meloni é muito carismática e é, de facto, uma líder"
Elisabetta de Giorgi é professora de ciência política na Universidade de Trieste e faz na TSF uma análise do atual quadro político italiano com um partido da "direita radical" à frente das sondagens para as eleições de setembro.
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Estará em condições de vencer as eleições de 25 de setembro o Fratelli d'Italia, de Giorgia Meloni, um partido que ainda está mais à direita do que a Lega de Matteo Salvini?
Não sei se está mais a direita, se calhar sim pela natureza e origem do partido. Porque o Fratelli de Itália, da Geórgia Meloni é um partido que vem da extrema-direita ou 'direita social', o Movimento Social Italiano (partido político fundado em 1946 por veteranos da República Social Italiana e ex-membros do regime fascista) como chamámos até aos anos 90, depois a Aliança Nacional e agora Fratelli d'Italia. Depois, falando de posições ideológicas e de políticas, acho que é um partido que pode ser colocado mais ou menos na mesma posição da Liga, digamos, no espaço da direita. Mas a Geórgia Meloni tem um perfil diferente do de Salvini , mas também dos líderes dos maiores partidos. Neste momento é uma líder, digamos, política profissional. Esteve na juventude da direita nos anos 90 e após isso teve uma carreira política local, em Roma e na província. Depois, entra no Parlamento muito jovem e obtém o cargo de ministra da Juventude com 31 anos. Portanto, é uma política de profissão e, com certeza, muito carismática e é, de facto, uma líder, uma mulher líder de um partido de direita radical.
Ser mulher ajuda-a?
Sim, é uma líder muito carismática também pelo facto de ser uma mulher num partido assim. Nas sondagens, está mais ou menos a liderar em igualdade, digamos, com o Partido Democrático. Portanto, com certeza, neste momento, no campo da direita e do centro direita é, claramente, o partido maior segundo as sondagens. Não é com certeza o partido maior em geral porque o Partido Democrático está mais ou menos ao mesmo nível.
E em relação ao Partido Democrático, com Enrico Letta... depois daquela decisão que houve com a saída de Matteo Renzi e daqueles que o apoiavam, como está o partido? Por outro lado, que hipótese tem de regressar outra vez à ribalta da política italiana a Força Itália de Sílvio Berlusconi? E obviamente, pergunto-lhe também pelo La Lega de Matteo Salvini e pelo Movimento Cinco Estrelas que, ao que tudo indica, pode ser penalizado nestas eleições por aquilo que também contribuiu para a queda do governo de Mario Draghi...
Digamos, relativamente ao Partido Democrático, a ideia que parece neste momento ter o Enrico Letta é de tentar formar uma coligação com os partidos do centro. Esta semana, numa entrevista na televisão, declarou que - aparentemente - a coligação potencial com o Cinco Estrelas, portanto no campo, digamos, progressista do centro esquerda não será possível depois do comportamento do Cinco Estrelas do Giuseppe Conti nos últimos meses. Portanto, parece quase impossível - mas eu sublinho o quase - uma coligação com o Cinco Estrelas. O trabalho vai ser feito daqui até ao fim de setembro, que é quando vamos novamente votar, dia 25. Acho que será um trabalho para tentar voltar a ligar o Partido Democrático com este centro que pode ser constituído por algum político saído do Cinco Estrelas, como por exemplo o Luiggi di Maio, que é o MNE neste momento em Itália e que anunciou a sua saída do Movimento Cinco Estrelas no fim de junho, mais ou menos como cerca de 50 deputados e senadores formando um novo grupo que se chama, neste momento, Juntos para o Futuro. É um grupo do Cinco Estrelas que tentou manter o apoio ao governo e com uma posição favorável à posição do governo em relação à guerra na Ucrânia e que poderia ser um grupo a constituir uma coligação ao centro com o centro esquerda do Partido Democrático, juntamente com outro ex-ministro Carlo Calenda, que já é líder de um partido que se chama Acciona Central que, na cena política italiana, é realmente central entre esquerda e direita.
E o que é que vai fazer a esquerda?
Digamos que em Itália, a esquerda praticamente já não existe em termos eleitorais, mas no Parlamento sim; há um grupo liberal que podia ser outro possível aliado do Partido Democrático nas próximas eleições.
E Matteo Salvini?
O Salvini, de facto, causou esta crise do governo de unidade do Draghi, juntamente com o Forza Itália do Berlusconi e o Cinco Estrelas. Nos últimos atos eleitorais que tivemos em Itália, o partido do Salvini tinha-se mostrado em crise, como exatamente o Cinco Estrelas do Conti. Matteo Salvini estava mais preocupado com os equilíbrios internos. A coligação do centro-direita como o Partido da Giorgia Meloni, Fratelli d'Italia, está a crescer há meses e mesmo a ultrapassar, ultimamente, os outros nas sondagens. Portanto, vai ser com certeza uma coligação de centro-direita com o La lega de Salvini, o Fratelli de Itália, de Giorgia Meloni e Forza Itália do Silvio Berlusconi. Forza Italia do Berlusconi decidiu sair do governo, apesar da posição contrária de muitos ministros. De facto, nos últimos dois dias, dois ministros do Forza Itália saíram do partido. Eram dois ministros e personalidades muito importantes, desde sempre, do Forza Itália e decidiram sair do partido, por estarem contra a posição oficial do partido em relação ao governo. Portanto, vamos ver. De qualquer forma, apesar desta crise interna e esta mudança nos equilíbrios internos do centro direita, neste momento a olhar para as sondagens, o centro direita deve ser a coligação vencedora das próximas eleições. Mas vamos ver.
Portanto, é de admitir que a concorrer às eleições possam aparecer dois blocos, um de centro direita e outro de centro esquerda?
Sim, com certeza vão estar dois blocos. O que ainda não conseguimos dizer é o que vai fazer o Movimento Cinco Estrelas. Não podemos excluir 100%, ou seja completamente, que o Partido Democrático não se vai aliar a eles nas próximas semanas. Mas eu acho que vai ser praticamente impossível, dados os últimos acontecimentos e, portanto, pode ser, digamos, uma eleição com dois blocos. Centro-direita muito forte em termos eleitorais, nas sondagens neste momento, como a Lega e Fratelli de Itália, Forza Itália. Por outro lado, um centro esquerda com o Partido Democrático. Algumas forças de centro e, se calhar um grupo da esquerda e o Cinco Estrelas a concorrer, provavelmente, sozinhos. Com esta lei eleitoral que temos agora em Itália, que favorece as coligações e portanto, não há favoritos nem em termos de regras eleitorais, nem neste momento, em termos de sondagens.
Os últimos acontecimentos com certeza, não ajudaram os consensos eleitorais do Movimento 5 Estrelas, principalmente depois da saída do Di Maio e dos deputados que saíram com ele. Causou esta crise de governo, mesmo pela preocupação de perder demasiados votos. Voltar a uma posição mais radical do Movimento podia ajudar em termos de consenso. Neste momento, os italianos, aparentemente numa maioria enorme, não ficaram contentes nem com o centro-direita, nem com o centro-esquerda, nem na área do Movimento Cinco Estrelas, relativamente à saída do Governo e às novas eleições que estão a chegar. Portanto, quem vai ganhar desta decisão de acabar com o governo Draghi? Ainda não é completamente claro. Há com certeza a ideologia do Frateli de Itália, que é o único partido de oposição, e que sempre foi, e portanto, Meloni é com certeza a única pessoa que pode ganhar alguma coisa desta situação, neste momento.
E está completamente fora de hipótese a possibilidade de Mario Draghi reaparecer com uma nova formação política? Provavelmente, dado o tempo que nos separa, até 25 de setembro, é um tempo muito curto, não haverá sequer espaço temporal para isso...
Não há espaço nem vontade. O Draghi, de fato, pediu para assinarem um novo pacto de confiança. Por isso, colocou todas as cartas na mesa no último discurso, no Parlamento e por isso, os partidos ficaram no canto e decidiram. Mas o Draghi fez isso mesmo nesta grande coligação, para, digamos, ultrapassar a crise, em nome do interesse nacional. E, portanto, agora diz: "já não é preciso que eu fique aqui". E eu acho que será também uma questão de personalidade do Mario Draghi, de interesse pessoal, não querer entrar mesmo em política. E eu citaria também o exemplo do Mario Monti, depois do governo Monti em 2011-12, quando o Mario Monti decidiu, convencido pelas forças políticas, a entrar na política e, de facto, não teve sucesso, pelo contrário. E acho que também pensando neste exemplo do Mario Monti, que de fato é uma figura muito, digamos, bastante parecida à do Mario Draghi, o Mário Draghi não vai pensar entrar em política, mas, claro, em Itália ficamos sempre surpreendidos pelas decisões dos partidos e de algumas personalidades. Portanto, nunca digo nunca, mas eu acho que seja muito improvável.