Uma maré humana em Grozny condenando as caricaturas de Maomé, bandeiras francesas queimadas no Afeganistão e no Paquistão, franceses ameaçados em Gaza: as manifestações anti-Charlie Hebdo prosseguiram hoje, após um fim-de-semana marcado pela violência no Níger.
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Quase duas semanas após o massacre na redação do semanário satírico francês cometido por dois irmãos jiadistas franceses, é total a incompreensão, um pouco por todo o mundo, entre aqueles que defendem o direito de um jornal a gozar com a religião, qualquer que ela seja, e aqueles que gritam "blasfémia".
Ao todo, 12 pessoas foram mortas nas instalações do jornal no atentado ocorrido a 7 de janeiro em Paris, entre as quais alguns dos maiores 'cartoonistas' franceses.
A Chechénia, república muçulmana do Cáucaso russo, tornou-se hoje durante algumas o epicentro da contestação anti-Charlie Hebdo.
Gritando "Allah Akbar" (Deus é grande) e brandindo cartazes proclamando o seu amor pelo profeta Maomé, centenas de milhares de manifestantes concentraram-se junto à mesquita de Grozny, segundo uma jornalista da agência France-Presse no local.
Tanto as autoridades locais como o Governo federal de Moscovo indicaram haver entre 800.000 e um milhão de manifestantes, mas é difícil dizer com precisão quantas pessoas, da Chechénia e de todo o Cáucaso russo, responderam à convocatória do dirigente checheno Ramzan Kadyrov. A população total da Chechénia está oficialmente estimada em 1,2 milhões de habitantes e a de Grozny em 220.000 habitantes.
«Por detrás do incidente das caricaturas, encontram-se as autoridades e os serviços secretos dos países ocidentais», acusou o dirigente checheno perante a multidão, insistindo em que não deixará «ninguém insultar o profeta».
Entre os manifestantes, alguns consideravam que as vítimas do atentado ao Charlie Hebdo tinham «merecido» o que lhes aconteceu.
«São essas mesmas forças obscuras, que encorajaram essas caricaturas, quem assassinou essas pessoas», explicava um homem idoso, trajado à maneira tradicional chechena.
Tal como na Chechénia, os protestos contra as caricaturas de Maomé aumentaram hoje em vários países, apesar de a maioria dos muçulmanos continuar alheia a este movimento de contestação.
Em Jalalabad, no leste do Afeganistão, cerca de 500 manifestantes desfilaram e incendiaram uma bandeira francesa.
No vizinho Paquistão, cerca de 250 militantes da Jamaat-e-Islami, um dos principais partidos islâmicos nacionais, gritaram as palavras de ordem "Morte à França", "Morte ao Charlie Hebdo", em Peshawar (noroeste), após três dias marcados por muitas manifestações, por vezes violentas, por todo o país, nas quais várias bandeiras tricolores franceses e imagens do Presidente francês, François Hollande, e dos 'cartoonistas' do Charlie Hebdo foram queimadas.
«Insto o Governo afegão e outros países islâmicos a cortarem relações diplomáticas com França», disse à France-Presse Matiullah Ahmadzai, de 25 anos, exigindo que Paris «peça desculpa» aos muçulmanos.
Mais de 2000 pessoas em cólera manifestaram-se hoje junto à embaixada de França em Teerão, gritando "Morte à França", "Morte a Israel" E "Nós Amamos o Profeta".
Também em Gaza, a bandeira francesa foi queimada e foram feitas ameaças aos franceses por cerca de 200 islamitas radicais.
«Franceses, saiam de Gaza ou serão degolados», gritavam os manifestantes, em frente ao Centro Cultural Francês, brandindo a bandeira negra dos jiadistas.
O Níger, que foi palco das mais violentas manifestações contra as caricaturas de Maomé, manteve-se hoje em alerta, após confrontos que fizeram dez mortos.
Cerca de 300 cristãos continuavam hoje a beneficiar de proteção milita em Zinder, onde cinco pessoas foram mortas na sexta-feira.
No total, durante os motins que fizeram também cinco vítimas no sábado em Niamey, 45 igrejas foram incendiadas no país e lojas, hotéis, uma escola e um orfanato pertencentes a não-muçulmanos foram destruídos.
O Governo do Níger anunciou três dias de luto nacional a partir de hoje, em memória das vítimas destes distúrbios.