João Gomes Cravinho: "UE não pode continuar a ser um conjunto de caçadores de lebres quando há muitos veados disponíveis"
O ministro dos Negócios Estrangeiros português, ao lado da chefe da diplomacia alemã, aludiu à famosa parábola de Jean-Jacques Rousseau para se exprimir sobre as grandes opções estratégicas da diplomacia europeia.
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Num tempo em que a Europa enfrenta o risco de os interesses individuais poderem sobrepor-se aos interesses coletivos no caso do apoio à Ucrânia, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, na abertura do Seminário Diplomático 2023, fez o apelo à unidade entre os 27. Ao lado da ministra alemã dos negócios estrangeiros, Analeena Baerbock, usou uma conhecida frase de um autor... Nascido em Genebra:
"Aplica-se aqui, como tantas vezes na vida internacional, a parábola de Rousseau, segundo a qual dois homens podem caçar um veado se o fizerem em conjunto, mas com menor esforço, cada um pode individualmente caçar uma lebre, hipotecando as possibilidades do outro colega e reduzindo o proveito coletivo".
Assim, o papel de Portugal neste quadro diplomático "é o de procurar atenuar as tentações de alguns parceiros, mantendo o enfoque na unidade da ação coletiva, porque dela depende o sucesso de todos nós. Nunca satisfazemos a todos. Mas a União Europeia não pode continuar a ser um conjunto de caçadores de lebres quando há muitos veados disponíveis, se soubermos unir esforços", afirma o Ministro dos Negócios Estrangeiros.
João Gomes Cravinho admite que "nunca satisfaremos a todos. Mas a União Europeia não pode continuar a ser um conjunto de caçadores de lebres quando há muitos veados disponíveis, se soubermos unir esforços".
Apesar de nove pacotes de sanções à Rússia não terem feito parar a guerra, o MNE português confirmou aos jornalistas que a UE já trabalha num novo pacote de medidas contra o regime russo: "As sanções nunca tiveram como objetivo fazer parar imediatamente a máquina de guerra russa. Tinham como objetivo elevar o seu custo de forma sistemática. E esse impacto está a ser sentido, está a ser sentido agora. E está a sentir-se cada vez mais à medida que o tempo passa. A indústria russa e a capacidade russa de fazer a guerra estão hoje num nível muito inferior, comparado com aquilo que era a realidade há um ano atrás, e isso deve se às sanções. E, portanto, a nossa expectativa é que essas sanções continuarão e já estamos a trabalhar num décimo pacote".
Cravinho realça a importância de a Europa se afirmar como uma potência geopolítica, o contributo que Portugal pode dar para isso, a necessidade de continuar a apoiar a Ucrânia o tempo que for preciso até à vitória, mas também lembrou que é importante uma visão de 360 graus: o mundo não fica parado enquanto acontece uma guerra no leste da Europa. Para Cravinho, é evidente que "a guerra lançada pela Rússia representa, tal como nos diz o novo conceito estratégico da NATO, o maior e mais imediato desafio à segurança da aliança. E Portugal continuará a desempenhar uma função militar e politicamente solidária com os aliados a esse respeito. Mas o resto do mundo não fica parado à espera que termine a invasão da Ucrânia". Pelo contrário, "o grande palco internacional dos nossos interesses coletivos irá, com toda a probabilidade, alargar-se por diversas razões e Portugal deve estar presente nesse processo", afirmou ao lado de uma ministra alemão saudosa dos tempos de férias no Cabo da Roca e conhecedora dos fados de Marisa.