"Ficar tudo na Segurança Social é garantir que estratégia de combate à pobreza está perdida." Governo desvaloriza

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Sandra Araújo, que coordena há três anos a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, anunciou que vai sair do cargo e que a responsabilidade passa para o Instituto da Segurança Social. Na TSF, o especialista Fernando Diogo nota que isto "é algo que nos deve deixar apreensivos". Já o Governo desvaloriza e refere que deixar estratégia num "satélite" é tirar importância ao problema
Deixar a gestão da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza no Instituto da Segurança Social e "desresponsabilizar os outros ministérios, é garantir que a estratégia está perdida", defendeu esta quarta-feira Fernando Diogo, professor da Universidade dos Açores e investigador do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa, em declarações à TSF.
"Essa é exatamente a expressão que eu costumo utilizar para alertar os políticos sobre os perigos de uma solução política deste género. Temos que esperar para ver o que é vai acontecer em termos práticos, mas o acantonamento da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza à Segurança Social do ponto de vista orgânico é algo que nos deve deixar apreensivos", considerou.
A reação de Fernando Diogo surge após Sandra Araújo, que coordena há três anos a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, ter anunciado que vai sair do cargo e adiantado ao jornal Público que agora vai ser o Instituto da Segurança Social a gerir esta estratégia, tal como o Governo decidiu em conselho de ministros no final de novembro.
Para o também especialista em questões de pobreza e exclusão social, tudo vai depender de como as coisas serão conduzidas, mas, sublinhou, "o problema da pobreza não é um problema que a Segurança Social possa ter qualquer impacto na sua resolução".
"Ficar tudo na Segurança Social e desresponsabilizar os outros ministérios é garantir que a estratégia está perdida à partida", alertou.
O investigador também partilha da convicção de Sandra Araújo de que a estratégia devia ser assumida pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, ou pelo ministro da presidência, António Leitão Amaro, para ganhar força política. "O combate à pobreza é uma coisa que precisa de ter um enquadramento com peso político. As duas pessoas referenciadas têm naturalmente peso político, portanto faz sentido."
Articulação será decisiva. Ministério do Trabalho vai tutelar plano
A TSF contactou a secretária de Estado da Ação Social da Inclusão, Clara Marques Mendes, que garantiu que todos os ministérios vão ter um papel decisivo no combate à pobreza, embora seja o Instituto da Segurança Social a coordenar a estratégia.
"A grande preocupação que o Governo tem é que a estratégia funcione de forma verdadeiramente articulada e que haja uma entidade que coordene essa estratégia em articulação com todas as áreas governativas", afirmou.
Apesar da "estreita articulação", Clara Marques Mendes ressalva que esta é uma estratégia integrada no Ministério de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que já está a preparar o novo plano para entrar em vigor a partir de 2026.
Sobre o facto da ministra do Trabalho nunca se ter reunido com a coordenadora da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, Clara Marques Mendes disse que ficou desde sempre estabelecido que seriam o gabinete da Secretaria de Estado de Ação Social e Inclusão e a Secretaria de Estado do Trabalho os responsáveis por coordenar a estratégia. "Portanto, não vejo qualquer razão, nem necessidade de fazer qualquer comentário a isso", atirou.
Também o Ministro da Presidência desvaloriza as palavras de Sandra Araújo. António Leitão Amaro sublinhou que o Governo está a "fortalecer a centralidade deste programa".
"Onde é que está o instrumento de política pública distributiva mais potente para o combate à pobreza? Na Segurança Social. Se estiver num satélite, provavelmente vai ser menos importante", argumentou.
