Alterações à distribuição de processos vão provocar atrasos, alertam magistrados, juízes e funcionários judiciais
A crítica é consensual: novas regras introduzem burocracia sem ganhos reais e vão trazer novos atrasos e constrangimentos aos tribunais.
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As novas regras para a distribuição eletrónica dos processos entram esta quinta-feira em vigor, apesar das muitas críticas a que têm sido sujeitas.
Em declarações à TSF, o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), Manuel Ramos Soares, apela ao Governo que seja "humilde" e introduza já mudanças.
"Há já um conjunto de aspetos em que nos parece evidente que não vai correr bem", alerta. "Ainda será possível introduzir modificações nesta fase de arranque. O Governo tem de ser suficientemente humilde para reconhecer que não conversou suficientemente com as pessoas que devia ter conversado e introduzir as modificações que forem necessárias para evitar que cheguemos ao fim disto, daqui a um ano ou dois, e tenhamos de voltar atrás."
De acordo com a regulamentação estabelecida na portaria publicada no final de março, a distribuição eletrónica passa a exigir a presença diária de diversos agentes da justiça para assistir à sua realização, como o presidente do tribunal, que designa "um juiz para presidir e um substituto, para os casos em que aquele se encontre impedido", um magistrado do MP, um oficial de justiça (e um substituto, designados pelo administrador judiciário ou secretário do tribunal) e um advogado.
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Para Manuel Ramos Soares, não faz sentido alocar tantos recursos humanos por questões burocráticas.
"Aquilo que estamos a prever é que em pouco tempo vamos ver que há centenas de juízes e procuradores que vão passar horas a assistir a diligências meramente burocráticas, sem nenhum ganho efetivo, e vão interromper julgamentos, vão interromper diligências, vão adiar julgamentos para coisas destas", nota.
Também na opinião do presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), Adão Carvalho, o novo modelo de distribuição de processos "só vai trazer burocracia e causar ainda mais atrasos ao sistema de justiça".
"Porque aquilo que seriam a premissa deste novo modelo seria a transparência no processo de distribuição e essa transparência continua sem estar purificada", argumenta o presidente do SMMP.
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"Se pensarmos que há tribunais em que há núcleos onde não há magistrados do Ministério Público, onde há poucos magistrados e vão ter que deixar de estar a fazer diligências ou serviço urgente para estar presente nesses atos de distribuição, percebemos vai criar maiores dificuldades, maior embaraço ao desempenho das funções."
Já o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), António Marçal, conta que apenas esta quarta-feira foi dada formação sobre as novas regras para a distribuição eletrónica dos processos e o sindicato foi inundado de reclamações.
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"Hoje a maior parte [dos funcionários judiciais], quando chegarem ao momento da distribuição, não conhecem a aplicação porque a formação foi dada ontem via Web e com os problemas e constrangimentos do funcionamento da rede dos tribunais em muitos, em muitos lugares alguns não houve sequer essa formação."
O novo modelo "não se justifica e não vai funcionar", reforça o presidente do SFJ.