Amigo revela que a imunologista de renome mundial sabia que era doente de risco e ia à rua para ir à clínica, chegando a protestar com a falta de cuidados para evitar o contágio, mas foi ignorada.
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Maria de Sousa, a cientista, médica, imunologista, escritora e professora universitária que faleceu no início da semana, frequentava regularmente uma clínica de diálise com inúmeros casos de Covid-19 que continua aberta e que tem levantado queixas dos bombeiros.
A própria Maria de Sousa não tinha grandes dúvidas de que apanhou a infeção naquela clínica e, mesmo antes de estar doente, chegou a protestar pelos poucos cuidados que esta tinha para evitar o contágio do novo coronavírus, segundo conta à TSF um amigo próximo da cientista.
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Hélder Araújo, médico e professor universitário nos Estados Unidos, explica que regularmente falava ao telefone com Maria de Sousa, uma mulher com 80 anos e com pouca família. "A sua família era a ciência", afirma.
Consciente dos riscos que corria pela idade e pela doença renal grave, Maria de Sousa só costumava sair de casa para ir à clínica e, fora disso, a única pessoa que contactava com ela era uma assistente pessoal que vivia lá em casa e que nunca teve um teste positivo à Covid-19.
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Além de Hélder Araújo, outro amigo próximo da investigadora também confirma à TSF que a clínica de diálise em causa é a NephroCare do Restelo (Lisboa), que, no dia em que Maria de Sousa morreu, foi notícia na revista Sábado por inúmeros casos de Covid-19.
Hélder Araújo conta que, antes de ficar doente, Maria de Sousa chegou a protestar junto da direção da clínica pela falta de cuidados em relação a um potencial contágio, sublinhando, a determinada altura dessa conversa, que falava enquanto médica e não como doente.
"A professora Maria apercebe-se logo que havia um grande risco de poder ser infetada com o vírus pelas más práticas da clínica e começa a protestar e manifestar-se, numa frustração crescente", conta o amigo.
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Igualmente revoltado, o amigo conta que Maria de Sousa, sobrevivente de uma insuficiência renal grave que a levou a ficar agradecida por estar viva, foi ignorada pela clínica: "Esta tinha ali uma utente que é uma imunologista de renome mundial a alertá-la que estas medidas iriam levar ao contágio e foi ignorada, o que levou a professora a sentir-se frustrada e a elevar a voz".
Os primeiros sintomas
Hélder Araújo revela ainda que não foi a clínica que contou a Maria de Sousa que já tinha registado casos de infeção com a doença, mas, sim, um bombeiro que a transportava para fazer a diálise.
A imunologista registava sintomas há algum tempo semelhantes a uma constipação, mas só depois deste alerta do bombeiro é que fez o teste e confirmou o contágio com Covid-19.
"Qualquer pessoa, se soubesse que frequentava uma clínica com casos confirmados e com sintomas de constipação - ainda por cima, cientista e médica -, teria associado antes as duas ideias, tendo em conta o panorama geral de falta de cuidado da clínica", conclui o amigo.
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Bombeiros assustados
O comandante dos bombeiros do Dafundo, uma das corporações que transporta doentes para esta clínica no Restelo, explica à TSF que têm tido inúmeros problemas associados à clínica: "Tenho dois homens contaminados, mais sete em quarentena, por causa de doentes que transportávamos e não sabíamos que estavam com Covid-19...".
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Carlos Jaime explica que todos os bombeiros que agora vão ao local se deslocam completamente equipados, com fato. "Quando tive conhecimento, já estava uma série de pessoas contaminadas - uma médica, dois enfermeiros, uma auxiliar e diversos doentes", afirma, garantindo que a clínica não informou os bombeiros atempadamente.
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O comandante dos bombeiros do Dafundo diz que a transmissão com origem na clínica de diálise do Restelo tem sido "tremenda", com doentes internados e duas senhoras que já morreram, já tendo alertado a saúde pública e a proteção civil de Lisboa para esta situação.
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