Dissolução do Parlamento? "Muitos comentadores queriam, eu tinha a noção de que o povo não queria"
Marcelo defendeu que não é altura de "deixar o jogo abaixo", até porque isso podia "ter mais custos para o país do que vantagens".
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O Presidente da República admitiu esta sexta-feira que teve noção de que, ao contrário de "muitos comentadores", o povo "não queria" a dissolução do Parlamento, considerando que, em democracia, é sempre possível o Governo e as oposições perceberem a necessidade de mudanças.
"Eu quero ser muito sincero: acho que havia muitos comentadores que queriam que eu dissolvesse e eu tinha a noção de que o povo não queria que eu dissolvesse, queria que eu, realmente, chamasse a atenção do Governo para dizer aquilo que disse no dia 4 [de maio]: 'olhe que, às vezes, é preciso mudar o que não está bem antes que seja, depois, muito tarde'. Foi isso que eu quis dizer, foi uma prevenção", justificou Marcelo.
O chefe de Estado falava aos jornalistas no Peso da Régua, distrito de Vila Real, onde irão terminar, no sábado, as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, e referia-se à declaração que fez no dia 4 de maio, depois de o primeiro-ministro ter rejeitado a demissão do ministro das Infraestruturas, João Galamba.
Marcelo disse que, nessa ocasião, o povo considerou que não ser altura para "deitar o jogo abaixo", porque "poderia ter mais custos do que vantagens".
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"Eu tinha a noção do que muitos comentadores achavam: 'É agora, é aproveitar agora, se não é agora, é daqui a 15 dias, ou daqui a três semanas e tal... Deite o jogo abaixo e começa-se de novo'. E, do outro lado, diziam o seguinte: 'Não, não é só deitar o jogo abaixo, também não pode estar a chamar a atenção para aquilo que é a governação e tal'", salientou.
O Presidente da República recuou ao discurso que fez na tomada de posse do atual Governo, em março de 2022, para salientar que, na ocasião, tinha alertado que "uma maioria absoluta tem uma responsabilidade absoluta".
"Por isso é mais difícil ter maioria absoluta do que não ter porque, quando não se tem maioria absoluta, há sempre várias justificações: porque o partido A não apoiou, porque o B não apoiou, porque o C não apoiou e tal... Se se tem maioria absoluta, não há essas justificações", sublinhou.
Para o chefe de Estado, quando se tem maioria absoluta, "só há uma justificação para as coisas não acontecerem: é haver problemas naqueles que exercem o poder".
"Parece um presente [ter maioria absoluta], mas é um presente com muita responsabilidade. O povo, quando dá esse presente, diz 'Bom, eu agora dou-te o poder todo para fazeres o que deves fazer. Mas faz! Porque, se não fizeres, eu vou ser mais exigente do que no tempo em que tu podias dizer, 'olha, eu não pude fazer porque não me deixaram fazer'", destacou.
Questionado se o Governo ainda está a tempo de emendar a mão, Marcelo respondeu que, "em política é sempre possível, quem está nas oposições, como no Governo, ir percebendo que há novos desafios, que há mudanças que é preciso fazer, umas vezes é de pessoas, outras vezes é de ideias, outras vezes é de projetos".
"Eu sei que é difícil: eu tenho a idade que tenho, e sei que é mais difícil aos 74 anos mudar do que aos 64, 54, 44, 34. Agora, é esse desafio que se põe a todos os que servem os outros - servem o povo - é, em cada momento, ver: 'O que é que eu posso fazer todos os dias melhor do que tenho feito até agora?'", afirmou.
Nas mesmas declarações, Marcelo Rebelo de Sousa deixou também o alerta de que viu "o Salazarismo cair, o Marcelismo cair, vários Governos caírem, Presidentes que passaram e primeiros-ministros que passaram" e que assistiu a tudo isto "dos dois lados: tendo responsabilidades políticas e na rádio, na televisão e nos jornais a comentar".
Por isto, diz, sabe o que é "estar do lado dos comentadores e estar do lado dos comentados", pelo que garante não irritar-se "se, do lado dos comentadores", for dito o que o próprio "disse muitas vezes daqueles que comentava".
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Marcelo mantém pressão sobre Galamba
Momentos depois, em declarações à RTP3, Marcelo Rebelo de Sousa referiu que "há situações em que a responsabilidade política objetiva tem que ser assumida", o que não aconteceu no caso de João Galamba, considera.
"No caso concreto, não foi assumida. Se fosse assumida, um membro do Governo já não o era", reiterou.
Questionando se ainda está "magoado" com António Costa por não ter demitido o ministro da Administração Interna, o Presidente da República garantiu: "Nunca me magoo por questões institucionais."