Estudantes manifestam-se em Lisboa, Coimbra e Braga contra assédio no ensino superior
Estudantes consideram que "o assédio na academia é generalizado" e juntam-se para "dizer basta".
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Estudantes do ensino superior vão estar esta terça-feira em protesto, em várias cidades do país, contra o assédio moral e sexual nas instituições e exigir uma "academia segura e inclusiva".
As manifestações foram convocadas pelo movimento "Academia Não Assedia" e estão marcadas para as 18h00 em Lisboa, em frente à reitoria da Universidade de Lisboa, em Coimbra, na Praça de D. Dinis, e em Braga, no 'campus' de Gualtar da Universidade do Minho.
"O assédio no meio académico dura há demasiado tempo e com a complacência da comunidade académica. Juntamo-nos para dizer basta. O assédio não tem lugar nas nossas universidades", refere o manifesto do movimento.
Aliyah Bhikha faz parte do coletivo "As feministas" e explica à TSF a importância de ter uma "academia segura".
"Esta manifestação está a ser organizada pelos núcleos feministas de várias faculdades e por outros coletivos feministas como o propósito de termos uma academia livre de assédio, ou seja, nós vamos à faculdade, é um espaço seguro, é onde nos encontramos com os nossos amigos e amigas e merecemos ter um espaço seguro em todos os sentidos, ou seja, também livre do assédio moral, tal como o assédio sexual. Nos últimos anos, têm sido imensos os casos de assédio moral e sexual, que nos preocupam, e a inação de por parte das faculdades também nos preocupa bastante", afirma.
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Aliyah Bhikha estuda direito na Universidade Nova de Lisboa e considera que a ajuda psicológica na faculdade é pouco eficaz e direcionada para os problemas do dia a dia.
"Nós temos listas de espera de quase três meses para conseguirmos ter uma consulta e temos os gabinetes de psicologia extremamente sobrecarregados, que não conseguem dar resposta aos estudantes, e temos estudantes com falta de resposta para aquilo que são os problemas diários", adianta.
Na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa foi criado um gabinete de apoio à vítima, mas não regista nenhuma denúncia desde 2022. Raquel Oliveira, presidente do núcleo feminista da Faculdade de Direito, diz que é um problema de confiança no gabinete.
"Nós teríamos de mandar e-mail, o que já de si é totalmente impessoal, ou seja, estamos a falar de um caso de assédio e eu não quero mandar um e-mail a expor a minha situação. Não é anónimo. Depois se eu quiser apoio jurídico ou psicológico, como é óbvio, não vai ser, de todo, anónimo", explica, defendendo que o gabinete tem "inúmeras falhas".
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"Os alunos não vão fazer queixa, porque não há confiança nesse gabinete, que se pauta por uma falta de mecanismos que nos garantam imparcialidade e depois que sejamos tratados como devemos ser quando fazemos uma queixa, porque existem relações de poder e nós, alunos, temos medo de represálias", diz.
No entanto, Raquel Oliveira garante que os casos continuam.
"Entre alunos todos sabemos que continuam a acontecer casos de assédio, seja assédio moral ou até assédio sexual", assegura, acrescentando que "os casos continuam a acontecer e nada é feito".
Recordando casos conhecidos desde o ano passado, na Faculdade de Direito e no Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, ou no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, os estudantes referem que "o assédio na academia é generalizado".
Para responder ao problema, defendem a criação de um gabinete independente de apoio psicológico e jurídico em todas as universidades, a criação de códigos de conduta que assegurem "uma efetiva resposta a casos de assédio" e a promoção de medidas sancionatórias eficientes.
Pedem também a realização de questionários institucionais anónimos, para apurar o número atualizado de situações de assédio, a distribuição de informação sobre os mecanismos de apoio e a garantia de que as vítimas não sejam avaliadas por docentes contra quem fizeram queixa.
"Ao Ministério (da Ciência, Tecnologia e) do Ensino Superior, cabe assegurar ações de formação obrigatória a todo o corpo docente sobre pedagogia e assédio sexual e moral, bem como racismo, xenofobia ou orientação sexual, incluindo uma formação sobre assédio em contexto laboral", acrescenta o manifesto.
Em abril, o Ministério lançou um inquérito na sequência da divulgação de várias notícias sobre casos de assédio sexual e moral no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. O inquérito revelou, na altura, 38 queixas de assédio sexual nos últimos cinco anos, dos quais quatro resultaram em sanções.
Entretanto, o Governo anunciou a constituição de uma comissão responsável por definir uma estratégia de prevenção do assédio nas universidades e politécnicos, constituída por representantes das instituições, de federações e associações de estudantes, da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género e da Comissão para Igualdade no Trabalho e no Emprego.
A equipa está responsável por elaborar uma estratégia de prevenção e combate ao assédio nas instituições de ensino superior, dirigida a docentes, investigadores, trabalhadores não docentes e estudantes.
* Notícia atualizada às 11h52