Falta de católicos nas decisões leva PR a considerar "espinhosa" decisão sobre eutanásia
Presidente da República analisou a evolução da influência católica em Portugal nos últimos 50 anos e concluiu que menor relevância leva a que temas como o da eutanásia tornem "mais espinhosas magistraturas chamadas a arbitrar".
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A posição de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a morte medicamente assistida há muito que é conhecida, mas agora vem a constatação de que uma menor influência de católicos nos processos de decisão e indiferença de alguns tornam "mais espinhosas magistraturas chamadas a arbitrar".
A discursar na Universidade Católica, no lançamento da biografia de Mário Pinto, Marcelo começa com uma análise do último meio século sobre o catolicismo nacional, reconhecendo que "Portugal considerava-se largamente maioritário católico nos recenseamentos; comportamentalmente, era católico fora da metrópole lisboeta, já não o era necessariamente nesta em clivagens ou decisões marcantes".
"Ao mesmo tempo, dentro do catolicismo, a diferenciação de percursos e a vivência solitária da fé ganhavam e ganham expressão, bem como visões diversificadas sobre a vida, a pessoa e a família", continua o Presidente da República notando que, "sobre a sociedade e vias de participação, já desde os anos 70, o pluralismo fora a tónica dominante".
Num discurso em que as palavras foram escolhidas a dedo, Marcelo Rebelo de Sousa recorda as mudanças que foram ocorrendo no pensamento da sociedade em matérias como a interrupção voluntária da gravidez para chegar a um dos temas quentes do momento: a eutanásia.
"Nos poderes públicos, nas leis, sua criação e aplicação, tornara-se manifesta a mudança profunda na vida nacional. A chamada morte medicamente assistida constitui o mais recente exemplo deste processo de cultura cívica", destaca.
Para Marcelo, "nem sequer é a atual ausência de moderados no palco político decisório, aliás generalizada nas democracias que nos rodeiam, a grande causa do vivido. O dado determinante era outro: em todos os quadrantes, a menor presença ou relevância de católicos nas decisões coletivas passara a ser um traço comum. Acresce que a indiferença de bastantes deles perante debates mais relevantes, como os atrás apontados, parecia justificar-se: ou por recusa a abordar a substância preferindo a forma, ou por resignação cívica ou por afastamento antissistémico".
E são precisamente estas "realidades que tornam mais espinhosas magistraturas chamadas a arbitrar tópicos candentes nos quais a ausência quer dizer irrelevância cívica".
No entanto, com Aníbal Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho na plateia, Marcelo realça logo em seguida as "exceções, claro, e muitos relevantes", notando, ainda assim, que são "cada vez mais circunscritas a clássicas áreas do posicionamento católico, não necessariamente às mais representativas nas decisões coletivas ou comunitárias".
Uma semana depois de o diploma sobre a eutanásia ter sido aprovado pela maioria parlamentar, Marcelo Rebelo de Sousa - que vetou o diploma anterior - ainda não revelou o que vai fazer quando a lei lhe chegar às mãos, mas já manifestou a intenção de tomar uma decisão rápida.