"Já não é o rei das mesas de Natal." Bolo-rei pode ficar sem espaço nas consoadas portuguesas

Foto: Leonel de Castro
Em declarações à TSF, o investigador João Pedro Gomes sublinha que muitas pessoas "já não gostam e já não consomem" bolo-rei. Este doce poderá ser ocupado por "descendentes próprios e válidos" durante as próximas décadas
O bolo-rei sempre esteve presente nas mesas portuguesas, no Natal, mas a tradição pode mudar e o doce pode perder o espaço que conquistou ao longo dos anos. Em declarações à TSF, João Pedro Gomes, historiador e investigador de património alimentar, garante que a sociedade e o "gosto dos consumidores estão a mudar".
"O bolo-rei já não é o rei uníssono das mesas de natal", afirma João Pedro Gomes, sublinhando que as gerações mais novas, que "hoje têm 20 ou 30 anos", consideram que se trata de um símbolo natalício importante, mas "já não gostam e já não consomem".
O investigador recorda ainda um elemento diferenciador: "A famosa fava e o brinde." Esta "versão didática, de brincadeira", trazia "alguma atratividade" ao bolo, diz o historiador, mas acabou por se perder com o passar do tempo.
"A quem é que vai calhar a fava [e pagar o bolo-rei no ano seguinte]? A quem é que vai calhar o brinde?", recorda.
Além disso, muitos tentam fugir das frutas cristalizadas e dos frutos secos, até porque estão "cada vez mais caros", adianta João Pedro Gomes. Também as receitas centenárias e originais, argumenta, são muito caras para os fabricantes e, por isso, os componentes do bolo-rei acabam por "ser mais industrializados".
Todos estes fatores culminaram na criação de outras opções que agradam a todos os gostos na ceia de Natal, como os "bolos rainha, bolos princesa, escangalhados, variações que envolvem chocolate" ou até mesmo um "primo do bolo-rei, o panetone italiano". No entender do investigador, estas alternativas começam "a ocupar um espaço muito importante", chegando mesmo a "ameaçar a centralidade que o bolo-rei sempre teve" em Portugal.
Há mais de 150 anos que o bolo-rei faz parte da cultura gastronómica portuguesa e João Pedro Gomes acredita que assim vai continuar, embora de forma diferente, com o objetivo de acompanhar "as vontades da própria sociedade". Defende que os "descendentes" deste doce são muito "válidos para os próximos cem anos".
No entanto, João Pedro Gomes assegura que os apreciadores de bolo-rei podem ficar descansados porque, destaca, "ainda é muito cedo" para esta mudança ser definitiva. O investigador admite que "o bolo-rei ainda vai ter um par de décadas com alguma saúde", embora, muitas vezes, enquanto "figura decorativa".
Quer isto dizer que nos próximos tempos não devem faltar compradores. Espera-se que a corrida às pastelarias continue e as longas filas à porta também, especialmente nesta época natalícia. Dentro de 20 ou 30 anos, já poderá ser diferente.