Manuel tem 48 anos e tem Covid-19. "O receio já não é muito. As coisas não são garantidas"
Na segunda vaga da Covid-19, o serviço de urgência do hospital de São João, no Porto, tem recebido menos pacientes. Mas quem recorre a esta unidade, e está infetado, aparece com sintomas mais graves. No edifício principal do hospital só entram os pacientes Covid em estado mais grave. No exterior, o hospital de campanha absorve o rastreio e o atendimento dos doentes.
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De pé, junto a um computador, a médica Ana Rodrigues faz o registo clínico de mais um doente, depois de o observar. Está de serviço no hospital de campanha, na urgência do hospital São João.
"A maioria dos doentes que recebemos aqui [nos contentores] já estão positivos. Aqui é uma área onde vêm doentes já com Covid e com alguma sintomatologia de novo ou diferente que motiva uma vinda ao hospital. Acho que o aumento do número de doentes relaciona-se com o agravamento do estado de saúde e com um aumento da preocupação por parte dos pacientes."
Manuel Lourenço está isolado numa das cabines improvisadas. Pálido, com ar cansado, resignado, aguarda por ajuda. É professor, tem 48 anos, e há quatro dias soube que tem Covid-19.
"Desde o início havia uma ideia que seríamos acompanhados por alguém, mas não tive grande acompanhamento. Ao fim destes dias todos em casa, e sem ver melhoras, recorri aqui à urgência para perceber realmente em que situação estou. Os sintomas que se agravaram foram a falta de ar, dores de cabeça e diarreia."
A escola onde leciona terá sido o foco de contágio. Em casa, a mulher e as filhas aguardam o resultado do teste. O pai sente-se ansioso e tem o coração nas mãos enquanto não souber se infetou as pessoas de quem mais gosta.
"Estamos a viver todos juntos, não há grande hipótese. Tenho tentado estar isolado, mas é sempre complicado."
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Questionado sobre os receios em relação a si próprio, Manuel Lourenço responde que "o receio, nesta fase, já não é assim muito. Damos as coisas por garantidas e se calhar não são assim tão garantidas."
É no hospital de campanha, no exterior do edifício principal, que começa a triagem de doentes com sintomas de doença respiratória. O enfermeiro Hugo Marques recebe-os para "muito rapidamente triar os doentes, definir se são doentes respiratórios, ou não, e se forem Covid onde têm de ser avaliados".
Em outubro, o hospital ganhou mais movimento. Cristina Marujo, diretora do Serviço de Urgência, diz que agora são doentes como Manuel os que mais aparecem.
"Nós inicialmente começámos por ter uma procura de população muito pouco grave, com sintomas menores. Mas agora temos os doentes mais graves, os doentes que já vêm como positivos e que agravaram o seu estado. Os positivos jà vêm referenciados pelos médicos que os acompanham em ambulatório, mas também há quem venha por iniciativa própria."
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Na urgência, o serviço vive dias diferentes da primeira vaga. "Nós, neste momento, estamos a atender entre 190 a 200 doentes por dia, entre suspeitos e positivos. No início, meados, de outubro eram 220. Agora estamos um bocadinho abaixo, com com um perfil de doentes diferente."
O edifício principal do hospital só recebe doentes Covid que necessitam de cuidados intensivos, os que apresentam sintomas mais graves e os que têm de vir à urgência por outros motivos, como explica o enfermeiro-chefe.
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"O doente que tem Covid e está em casa pode ter um apendicite. Não o podemos por junto dos outros doentes 'normais'. A equipa é que vai ao doente, não é o doente que vai à equipa. Aqui há, inclusive, um aparelho de TAC que permite providenciar a este doente, exames de radiologia clássica e tomar uma decisão."
Os dois circuitos - de doentes Covid e não Covid - só se misturam na área de emergência, mas com todos os cuidados acautelados, como sublinha Paulo Emílio Mota. "Há duas áreas distintas, dois circuitos bem identificados. Uns vão para um lado, outros para o outro."
É também aqui, neste edifício que estão internados os doentes Covid-19 que precisam de cuidados intensivos, mais de meia centena.
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