Pandemia pode estar a comprometer avanços de Portugal no combate à obesidade infantil
Especialistas estão preocupados com novos hábitos alimentares em confinamento, sem aulas, e falta de atividade física.
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Os confinamentos e as duas suspensões das aulas presenciais desde o início da pandemia podem estar a comprometer os avanços conseguidos no combate à obesidade infantil em Portugal.
Na última década, vários estudos revelaram que estavam a diminuir as crianças com excesso de peso, mas os especialistas estão preocupados com o tempo que os miúdos têm passado fechados em casa, mais sedentários, e com as mudanças alimentares.
Apesar dos estudos sobre os efeitos do confinamento sobre a obesidade das crianças serem poucos, não apenas em Portugal como em quase todos os países, a diretora do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável da Direção-Geral da Saúde (DGS) admite que está preocupada.
"Temos algum receio que a pandemia possa ter vindo a comprometer os progressos que conseguimos alcançar nos últimos anos ao nível da redução da obesidade infantil, mas, neste momento, ainda não temos dados suficientes para fazer um diagnóstico", refere Maria João Gregório à TSF.
Pais notam aumento de peso nos filhos
A pandemia obrigou o Governo a suspender as aulas presenciais por duas vezes num ano e há mais de um mês que os alunos voltaram para casa onde devem ficar quase sempre confinados. Um dos raros estudos que se conhece sobre a obesidade infantil durante a pandemia foi concluído recentemente por investigadores do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) no concelho de Cascais e revela que, no primeiro confinamento, entre março e abril de 2020, 35,4% dos pais notou um aumento de peso nos filhos, com 61% a não se preocuparem com essa tendência.
Os autores terminam o artigo manifestando preocupação com os resultados e recordando que uma em cada três crianças em Portugal, já antes da pandemia, tinha excesso de peso.
Sedentarismo
Além da questão da alimentação durante o confinamento, a responsável do programa para a alimentação saudável também alerta para o sedentarismo.
"Temos algum receio, na medida em que as medidas adotadas para conter a pandemia implicam que as crianças estejam em casa, provavelmente mais sedentárias e com redução da atividade física", afirma Maria João Gregório, que acrescenta, contudo, que, mesmo a este nível, as certezas são poucas.
Mais desigualdades alimentares?
O diretor da Faculdade de Ciências da Nutrição e da Alimentação da Universidade do Porto partilha das mesmas preocupações sobre os efeitos da pandemia na obesidade infantil e recorda os resultados do único estudo de nível nacional concluído em Portugal sobre hábitos alimentares durante a pandemia e, mais precisamente, sobre o primeiro confinamento.
Pedro Graça detalha que esse trabalho revelou mudanças alimentares, umas positivas e outras negativas, sendo que as primeiras estão, por norma, associadas a famílias em melhor situação económica e as segundas ligadas a famílias mais pobres e com menos escolaridade.
No caso das tendências negativas, foi detetado o aumento do consumo de snacks salgados, refeições pré-preparadas, refrigerantes, take away e um menor consumo de frutas e vegetais, bem como menor atividade física.
O especialista afirma que são conclusões que terão de ser confirmadas por estudos mais robustos, mas podem dar-nos pistas sobre como este confinamento e a crise económica podem extremar dois grupos em que uns, com uma situação económica melhorada, comem bem, e outros, fruto do confinamento e da situação económica que vivem, têm piores condições para se alimentarem de forma equilibrada.
"Podemos estar a agravar as desigualdades sociais naquilo que se refere ao acesso a uma alimentação saudável, resultado desta crise pandémica que nos afeta", conclui Pedro Graça.
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