"Pode piorar." Administradores preocupados com crise nos hospitais e "riscos para os doentes"
O presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares acredita que a situação vai piorar.
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O presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto, confessou esta quarta-feira, no Fórum TSF, que a crise nos hospitais por causa da recusa dos médicos em ir além das 150 horas extra por ano o está a deixar muito preocupado e alertou que há "riscos para os doentes".
"Nas grandes cidades, apesar de tudo, existe alguma capacidade de redundância, existe alguma capacidade de encaminhamento de doentes para hospitais que ainda têm o serviço de urgência a funcionar. Noutras regiões do país, nomeadamente no interior, esse reencaminhamento é francamente mais difícil e a fazer-se faz-se sempre com riscos para o doente. Se, porventura, temos uma interrupção do serviço de urgência em Bragança, por hipótese, o reencaminhamento para Vila Real, em alguns casos, poderá demorar uma hora de viagem. Isso tem consequências para um doente que tem um enfarte, que tem um AVC em Bragança. As consequências não são iguais. Naturalmente que as regiões do interior são aqui as mais prejudicadas ou aquelas em que estão em maior risco", explicou à TSF Xavier Barreto.
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O responsável acredita que a situação vai piorar.
"Nós temos hoje vários serviços de urgência que não estão a prestar cuidados em algumas áreas, em algumas especialidades, mas isto está a evoluir todos os dias. Segunda e terça-feira entraram declarações de vários profissionais em vários hospitais que provavelmente só vão ter impacto dentro de uma semana e, portanto, o cenário não é que esta situação melhore, pelo contrário. É preciso termos todos esta noção. Não tenho nenhuma expectativa, se nada acontecer, se as partes não conseguirem chegar a um acordo, que esta situação melhore. Tudo indica que pode piorar e temos de evitar essa situação a todo custo", avisa o presidente da APAH.
Apesar de representar os administradores hospitalares, Xavier Barreto dá razão aos médicos que recusam fazer mais do que 150 horas extra por ano.
"Os profissionais são mal pagos, há evidências sobre isso. O poder de compra que perderam nos últimos anos, não só os médicos, mas todos profissionais de saúde. Os administradores hospitalares têm a sua carreira por rever há 23 anos. Há 23 anos que estamos exatamente na mesma posição salarial, sem avaliação de desempenho e sem progressão salarial. Portanto, se há alguém que entende a insatisfação e até a revolta que os médicos estão a sentir obviamente somos nós, como todos os profissionais de saúde. Os enfermeiros são muito mal pagos da mesma forma. Percebo perfeitamente a insatisfação, até o desespero que os levou a tomar esta medida. Estou totalmente solidário com essa insatisfação. A consequência é que é muito grave, é demasiado grave para que nós não tenhamos uma solução", sublinhou.
Num momento como este no Serviço Nacional de Saúde, Xavier Barreto faz um apelo ao ministro, Manuel Pizarro.
"A solução tem claramente que passar por um regresso à negociação entre a tutela e este primeiro passo tem que ser dado pela tutela, tem que ser dado pelo Ministério da Saúde, tentando que as partes se reaproximem, que no fundo ganhem uma nova confiança nesta relação para que se possa regressar a uma prestação de serviços que seja correta e adequada para os nossos doentes", afirmou Xavier Barreto.
Já o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Jorge Roque da Cunha, espera que o Ministério da Saúde tome medidas que permitam reforçar o Serviço Nacional de Saúde.
"Todos estamos totalmente disponíveis, como sempre estivemos, para apresentar soluções e, por isso, esperamos que o ministro das Finanças e o primeiro-ministro não desvalorizem o problema, não tentem empurrar o problema para o futuro", acrescentou Roque da Cunha.
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A porta-voz do movimento Médicos em Luta, Susana Costa, disse na terça-feira que o Serviço Nacional de Saúde "está a ruir" e que os médicos já não conseguem travar essa "demolição", registando-se constrangimentos em 27 hospitais do país, que, defendeu, "já deveriam ser suficientes para sensibilizar o governo a tomar alguma medida".