"Preocupados" com o futuro. Mais do que um acordo, são precisas "profundas reformas" no SNS
Lacerda Sales, Fernando Leal da Costa e Luís Filipe Pereira acreditam que ainda é possível chegar a um acordo entre os médicos e o Governo.
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O antigo secretário de Estado adjunto e da Saúde, António Lacerda Sales, acredita que é possível um acordo entre o
Ministério da Saúde e os sindicatos dos médicos. Depois da maratona negocial de domingo, os dois lados deram conta de alguma aproximação de posições, mas foi marcada uma nova reunião para terça-feira. No Fórum TSF,
Lacerda Sales, que foi secretário de Estado quando Marta Temido era ministra da Saúde, mostra-se confiante num acordo, mas admite alguma preocupação.
"Enquanto profissional de saúde, o que me preocupa são os doentes, principalmente aqueles doentes mais vulneráveis que necessitam de assistência em proximidade, que necessitam dos serviços de urgência abertos, que necessitam das suas consultas e dos seus tratamentos também em tempo útil e, portanto, precisam de ter acesso rapidamente a toda esta prestação de serviço", afirma.
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Por outro lado, Lacerda Sales olha "com esperança" para o Serviço Nacional de Saúde, que "é demasiadamente importante para o país e também para a coesão social e para a tranquilidade da comunidade".
"Penso que essa tranquilidade da comunidade é um bem maior e, por isso, a minha esperança é de que se possam conjugar aquilo que são as legítimas aspirações dos profissionais de saúde com o interesse dos doentes e com os próprios recursos do país", refere.
Fernando Leal da Costa, antigo ministro da Saúde no governo de Pedro Passos Coelho, alerta que vai ser preciso repensar muito mais além da questão das urgências.
"O primeiro erro é que toda esta discussão está a ser feita em torno das urgências e não em torno daquilo que é o mais importante, que é a assistência regular dos doentes, que inclusivamente os retirará da necessidade de ir às urgências. Portanto, o Estado vai atrás do prejuízo, que é encontrar maneiras de ter mais médicos a fazer mais horas, mais urgências, em vez de resolver a base. Depois, há um segundo erro que é de acharem que resolvem isto valorizando mais os médicos de clínica geral e familiar do que os médicos hospitalares, quando o principal problema, neste momento, independentemente dos doentes que não têm médico de família, é que os hospitais, mesmo para efeitos de consulta regular, estão a obrigar os doentes a anos de espera e isso tem que ser resolvido. E o terceiro erro é que toda esta discussão está dentro de uma caixa da qual ninguém quer sair, nem o Governo, nem os sindicatos, nem ninguém, de uma lógica de remuneração dos médicos com um modelo igual ao dos restantes funcionários públicos que não faz sentido. Aquilo que devia de ser definido, de uma vez por todas, é qual é o valor objetivo que o Estado entende, enquanto pagador, que uma hora de trabalho de um médico vale e, depois, sabendo isso, contratar institucionalmente os médicos em função das necessidades", explica.
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Também Luís Filipe Pereira, ex-ministro da Saúde no governo de Durão Barroso, concorda que um acordo entre os médicos e o Governo "não vai resolver o problema do Serviço Nacional de Saúde".
"Se não forem introduzidas profundas reformas no SNS, cada vez mais teremos uma dualidade em Portugal no acesso à saúde. As pessoas que podem pagar seguros de saúde privados ultrapassam as dificuldades do SNS e do setor privado. No caso dos funcionários públicos, através da ADSE, pagam 13,5% dos seus vencimentos e vão ao setor privado, portanto, esta situação revela um problema de fundo que tem de se encarar de uma maneira direta. Este é um problema que subjaz a esta crise. Esta é mais uma das crises do Serviço Nacional de Saúde", sublinha.